opinião 19 janeiro 2019 - arte o dia
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Por João Batista Damasceno Doutor em Ciência Política e juiz de Direito

Rio - Já se disse que não se deve acreditar em quem nos trata bem, mas trata mal um morador de rua, pois nos trataria mal se estivéssemos em situação de vulnerabilidade. O mesmo podemos dizer de quem trata mal quem - perseguido em seu país de origem - pede refúgio no nosso. O caso Battisti é emblemático. Os que defenderam a extradição de Battisti por crimes políticos praticados quando jovem aplaudem os que, no Brasil, transformaram quartéis em centros de tortura.

A fuga de Cesare Battisti para a Bolívia, depois que foi autorizada a reabertura de seu processo de extradição, demonstra o quanto se gasta com determinados órgãos sem que sejam capazes de produzir os efeitos desejados. Battisti saiu do Brasil sem que os órgãos de 'inteligência' lhe acompanhassem os rastros.

Preso na Bolívia o governo brasileiro fez o papelão de pretender que fosse trazido ao Brasil para daqui ser extraditado para a Itália. Ao que parece tanto o general que deu a idéia, o presidente da República e o ministro das relações exteriores - que chegaram a se reunir para tanto e mandaram um avião à Bolívia para buscar Battisti - desconsideram que a Bolívia é um país soberano que trataria da questão diretamente com a Itália.

Preso em 1979 e condenado a 12 anos de prisão por crimes eminentemente políticos, quais sejam, participação em organização subversiva e autoria de ações subversivas, em 1981 Battisti se refugiou no México e depois na França, onde conseguiu abrigo político.

Em 1982, com Battisti fora do alcance do sistema penal italiano, um dos seus companheiros fez delação premiada e o acusou de ter praticado quatro homicídios, incluindo de um açougueiro e de um joalheiro, militantes nos anos 1970 numa organização de extrema direita e autores de homicídios de militantes de esquerda. Os crimes de homicídios imputados pelo delator jamais foram comprovados. E, tendo sido cometidos ao mesmo tempo em lugares diferentes foi imputado a Battisti ter executado um deles e ordenado o outro. E assim foi condenado a prisão perpétua.

Em 2007, Battisti pediu refúgio no Brasil depois que um governo de direita na França o transformou em troféu a ser entregue à Itália de Berlusconi. O STF julgando o pedido de extradição teve a votação empatada em 5 a 5. Coube ao então presidente, abandonando o princípio de que na dúvida se decide a favor do réu, proferir o voto de minerva e autorizar a extradição. Sabendo o que é um julgamento político, na Itália ou no Brasil, o presidente Lula em seu último ato de mandato deferiu o asilo a Battisti.

Desde que fugiu para a Bolívia não mais cabia ao Brasil qualquer participação na extradição. A atuação das autoridades brasileiras demonstrou incompreensão do papel que lhes cabe na ordem internacional.

O governo brasileiro queria entregar Battisti como um troféu ao governo italiano, quando já não mais tinha o que entregar.

João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política e juiz de Direito

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