José Luís Cardoso Zamith é secretário de Planejamento e Gestão do Estado do Rio de JaneiroDivulgação

Por José Luís Cardoso Zamith*
Em “Origem das Espécies”, Darwin nos ensinou: não são os mais fortes que sobrevivem, mas os mais aptos e adaptáveis que perpetuam a espécie. A aprovação da Lei Complementar 178, que dita as regras do novo Regime de Recuperação Fiscal, foi apresentada como ‘o caminho’ para estados em situação de desequilíbrio financeiro.
Entrega à União a fiscalização e permite a suspensão do pagamento de dívidas, desde que diversas medidas sejam adotadas, entre elas, um teto de gastos que limitará as despesas primárias. Quem quiser receber os benefícios, que corte e imponha limites – “só os mais fortes sobreviverão”.
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Imagine uma dona de casa que nunca planejou o orçamento - comprava em excesso e gastava com supérfluos. Quando o cano da pia furava, tinha que abrir a parede, porque não dava bola a pequenos vazamentos. A escola das crianças nunca foi prioridade. Doenças jamais foram relevantes, sempre se resolveram na farmácia.
No fim, o perfil de despesa da casa se pautava em resolver a emergência da hora e com todos vivendo aos trancos e barrancos - e no cheque especial. Congele essa situação e qual será a chance de esta família evoluir financeiramente ou não depender de assistência?
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O mesmo conceito se aplica aos estados. Politicamente, serão resolvidos os problemas no curto prazo. Mas, cedo ou tarde, descumprir o compulsório teto de gastos não será questão de "se" e sim de "quando". Se houvesse um perfil de despesas com pessoal e custeio ajustados e equilíbrio fiscal, existiria sobra para focar em investimentos não atendidos pelas vinculações obrigatórias. Mas se a base é frágil, fundamentada numa série histórica também ruim, este limite de despesas para "salvar" o estado só piorará as finanças locais.
Na verdade, o atual pacto federativo empurra para os estados algo que eles são incapazes de fazer com os recursos disponíveis e, acrescido da obrigatoriedade do teto de gastos, passará a limitar ainda mais suas ferramentas para sair da crise. Acredito que a Lei 178 poderia ser um mecanismo de transição para soluções estruturantes que, necessariamente, perpassem pela revisão do federalismo fiscal.
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Não seria melhor para a União garantir que, em três ou quatro anos, estados não apareçam pedindo socorro? Por que não obrigar um percentual do superávit em investimentos, que ela mesma aponte como caminho de desenvolvimento e, com isso, criar um antídoto à política de incentivos? O que está sendo proposto aos estados é um torniquete, que asfixia. É apenas uma visão de Tesouro em vez de uma visão de país.
Aqui no Rio, os últimos governos foram irresponsáveis, perdulários e alimentaram uma cultura de permissividade. O passado já mostrou que, quando se tenta resolver pensando só no curto prazo, cria-se uma bomba relógio para o médio e o longo prazos. Precisamos de estímulo para criar círculo virtuoso e não congelamento de ciclo vicioso. Sou defensor de um estado facilitador e austero, mas a pandemia deixou claro que não há substitutos para manutenção da sociedade. Engessar é um erro.
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*É secretário estadual de Planejamento e Gestão