OPINA2DEZARTE O DIA

No final do XIX, na cidade do Rio de Janeiro, o Campo do Polé, na Praça Tiradentes, era o local onde os compositores, poetas, violonistas, quituteiras, capoeiristas entre outros viviam construindo suas relações e experiências. Toda essa gente foi removida deste território para a Cidade Nova, onde atualmente é a sede da prefeitura, quando em 1862 foi inaugurada a estátua de D. Pedro I.

Na Cidade Nova, nasce Estácio a escola primeira, logo mais, como um cristo redentor de frente para o sertão carioca, Estação Primeira de Mangueira, a esquerda, Salgueiro e Vila Isabel. A direita, Imperatriz, Cacique de Ramos e Ilha. Continuando a viagem com Caprichosos, que Em Cima da Hora, chega na Portela, digna de um Império Serrano de uma Mocidade feliz que leva até uma Santa Cruz.

Todos estes territórios e grupos sociais, têm sua origem bem traduzida no título do livro de Roberto R. Moura: "No Princípio era a Roda”. É desta maneira que a Roda de Samba foi constituída como uma tecnologia ancestral preta, que a tornou um vetor de desenvolvimento territorial e econômico, que desenhou a sociedade carioca.

Em 2006 sambistas com seus instrumentos em punho, guiados pela ancestralidade, vão a campo para tirar um local símbolo da diáspora negra da marginalidade, a Pedra do Sal. Reunindo uma verdadeira multidão às segundas feiras, na região abandonada pelo poder público, que passou a indicar a Roda como destino cultural da cidade.

É neste cenário que, em 2015, Rogério Família, Paulo Henrique Mocidade, Luciano Bom Cabelo, André Rios, Pipa Vieira, Nego Álvaro, Júlio Morais e Wanderso Luna fundaram a Rede Carioca de Rodas de Samba para propor políticas públicas para as rodas.

O grande desafio para os sambas feitos em locais públicos é a sua sustentabilidade, bem representado pela "Roda de Samba Pede Teresa", que reorganiza a tradição, samba, comida, bebida, artesanato, entre outros, num modelo de negócio que consiste na Roda de Samba como epicentro, circundada pela sua cadeia produtiva: gastronomia, moda, artesanato e afins na Praça Tiradentes e juntamente com as rodas, Festa da Raça, e Balaio Bom aqueceram o comércio local, diminuindo a mancha criminal, antes com arrastões, assaltos e violência.

O modelo logo se espalhou por todos os cantos da cidade, tornando-se política pública, através de resolução municipal sugerida por Júlio Morais, sendo instituído um calendário oficial de Rodas de Samba na cidade. Transformar uma praça num terreiro de Roda de Samba é o fazer de uma tradição que se tornou o maior símbolo cultural de um país no mundo, investir nessa prática é um dever do poder público. A estrutura das Rodas de Samba que ocupam praças públicas, ou seja: banheiros, tendas, grades, palco e som, deveriam integrar à lei de orçamento anual do município.

Em 1922, Getúlio Vargas e Jorginho Guinle fizeram a primeira parceria público/privado em favor do samba ao levar "Os Oito Batutas" para a semana de Paris. Hoje se você estiver na Torre Eiffel, na Torre de Pisa, na estátua da Liberdade, no Taj Mahal, nas pirâmides, até no Big Ben e com a palma da mão fizer o ritmo de um pandeiro e dizer no pé, todos saberão que você é brasileiro, e está falando de samba, a Roda de Samba é um soft power do Rio de Janeiro.

Portanto deve o poder público investir neste vetor de desenvolvimento econômico carioca que por falta de investimento das autoridades, obrigou sambistas enquanto sociedade civil, se organizarem e proporem políticas públicas capazes de viabilizar o sustento desta prática.
 
Wanderso Luna é presidente da Rede Carioca de Rodas de Samba e Formado em Ciências Sociais (UFF)