Ivanir dos SantosDivulgação

Às vésperas do 2º turno das eleições presidenciais no Brasil é possível perceber, mesmo para quem não está pesquisando ou se debruçando para compreender o cenário atual, que o tema sobre os usos das questões religiosas no campo da política dominou e ainda vem dominando os pontos centrais dos debates públicos. Debates esses que também são carregados de ódio, ranços, fundamentalismo, racismo e intolerâncias religiosas.

Cá do meu canto, enquanto professor e sacerdote das religiões de matrizes africanos, busco não só olhar e compreender, com o máximo de cautela, os riscos e os interesses que estão por trás de falas, gestos e ações que corroboram para as supressões dos direitos religiosos que são constitucionalmente garantidos a todos os cidadãos brasileiros.

Enquanto ativista e defensor das liberdades religiosas e da tolerância, a primeira coisa que pontuo é que o Brasil é um Estado laico! Mas, como professor no campo da história das religiões, preciso enfatizar que em tese o Estado brasileiro nunca foi laico e sempre deu mais visibilidade e poder com as experiências religiosas cristãs.

Ora, não se trata aqui, nessa brevíssima reflexão, criar ou fomentar um “revanchismo” analítico para que possamos pontuar se essa ou aquela religião recebeu mais ou menos “apoio” do Estado, mas sim compreender que quando falamos em laicidade do Estado estamos acenando para uma representação religiosa na área social, política, econômica e cultural com base na equidade.

E como bem podemos ver, os temas religiosos que vem sendo exposto nos debates políticos estão no centro das experiências religiosas cristãs. Se um candidato diz que é mais cristão que o seu opositor, este concentra o seu poder para evidenciar que também é cristão, que é a favor das liberdades religiosas e que possibilitou um crescimento desse segmento na sociedade brasileira. Mas, qual dos dois candidatos vai verdadeiramente se comprometer com os grupos religiosos que não têm uma expressão social, política e econômica tal como as religiões cristãs?

Dizer ou acenar para um possível contexto de um Estado teocrático, por mais que o Brasil se apegue aos dados do último censo do IBGE, de 2010, que vai apontar que mais de 80% da população brasileira se diga cristã, é inconstitucional. Dizer que, se eleito, vai promover ações e políticas para o fortalecimento das liberdades religiosas é uma via possível, mas também um aceno no vazio.

Como bem sabemos, a representatividade de grupos religiosos no campo político ainda é ínfimo e as eleições do 1º turno mostram muito bem isso. Por essas, e outras tantas razões, acredito que o compromisso principal possa ser o promoção estabelecimento do Plano Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, que foi proposto pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), no ano de 2010, e até o presente momento colocado ação possível. A liberdade religiosa jamais será uma realidade se o Estado brasileiro, junto com a sociedade civil, busque implementar ações de combate à intolerância religiosa.

Fecho essa reflexão usando uma máxima de Nelson Mandela: “Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, ou por sua origem, ou sua religião, para odiar, as pessoas precisam aprender”.
Ivanir dos Santos - Babalawô Ivanir dos Santos é professor e orientador no Programa de Pós-graduação em História Comparada pela UFRJ (PPGHC/UFRJ)