Por cadu.bruno

Rio - A confusa matemática da eleição proporcional para as casas legislativas, como as Câmaras Municipais, ganhou um componente que promete trazer ainda mais emoções e dúvidas na apuração: a cláusula de barreira individual. O palavrão, aplicado pela primeira vez este ano, impõe uma espécie de ‘nota de corte’ para todos os candidatos. Quem não somar esse mínimo de votos não toma posse — nem que fique faltando apenas um. É uma mexida que tira bastante peso do voto de legenda.

A medida, na teoria, visa a reduzir os efeitos dos ‘puxadores de legenda’ — personalidades que, com votação excessiva, acabam elegendo companheiros de partido ou de coligação menos lembrados. Enéas, em 2002, conquistou a confiança de 1,5 milhão de paulistas, o que fez a alegria do Prona.

Câmara Municipal da capital fluminense tem 51 vagas, o que deve gerar quociente de 60 mil votos. Logo, a nota de corte será seis mil votosArte O Dia

Para saber como a cláusula individual funciona, basta entender o que é quociente eleitoral. Trata-se da divisão do total de votos válidos pelo número de cadeiras em disputa. Esse número varia de eleição para eleição, mas se mantém num patamar. “Agora, só podem participar da distribuição das vagas partidos que tenham candidatos com 10% do quociente eleitoral”, resume Felipe Borba, cientista político e professor da Unirio.

No Município do Rio, a ‘nota de corte’ deve exigir dos aspirantes seis mil votos, com base no resultado de 2012. Confira na tabela ao lado quanto cada candidato deverá somar nos 92 municípios para se credenciar a uma das vagas.

Não é uma mudança apenas matemática. Quem tinha o hábito de votar na legenda deverá mudar de opinião. “Ela tornou a personalização do voto maior. É melhor para o eleitor agora votar num nome”, ressalta Borba. “Aumenta o desperdício de voto”, completa o professor Guilherme Reis, também da Unirio, especialista em sistemas eleitorais.

O enfraquecimento do voto de legenda se explica pelo fato de que, como o próprio nome diz, o eleitor não escolhe um nome em específico. A ‘cédula’ vai para o bolo do partido ou da coligação, e o desempenho individual de cada um determinará quem entra. “Agora, você pode ter mais votos ‘jogados no lixo’. De nada adianta ter 100 mil votos na legenda se o candidato não somar, sozinho, os 10% do quociente”, diz Reis.

Mudança gera muitas críticas

Polêmica, a medida tem colecionado críticas. “A cláusula de barreira individual fez parte da minirreforma conduzida pelo que de pior já se viu no Parlamento brasileiro e visou a enfraquecer partidos pequenos ou em formação. Privilegiou a plutocracia e a cleptocracia e desfavoreceu os partidos como associação política”, afirma João Batista Damasceno, que já foi juiz eleitoral da Baixada.

A professora de Direito Silvana Batini, da Fundação Getúlio Vargas, faz coro. “Criaram a cláusula de barreira individual para evitar que candidatos com baixíssima representatividade acabassem eleitos. Porém, não houve divulgação adequada. Muita gente nem sabe que, se votar na legenda, corre o risco de perder seu voto. E isso não impede de todo que candidatos com pouca votação consigam se eleger”, pondera. E Silvana atenta para a questão da sobra de vagas dos partidos.

“Foi mal disciplinada nas regras e é alvo de ação no Supremo, que ainda precisará julgar liminar a respeito. Ainda há uma insegurança jurídica.”

Guilherme Reis complementa: “Está na Constituição que nosso sistema eleitoral tem que ser proporcional. Deram um passo na direção do majoritário. Essa cláusula acaba com a ideia de que o percentual que um partido tem é o percentual de cadeiras que ele tem. É uma aberração.”

Você pode gostar