Rio - Para abastecer o governo do estado, então comandado por Sérgio Cabral, hoje preso, e deputados movidos à base de propinas, a Fetranspor que congrega dez sindicatos e 200 empresas de ônibus responsável pela maioria da frota montou contabilidade paralela que movimentou R$ 348,7 milhões, de 2010 a 2016. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), o dinheiro ficava na transportadora de valores e era entregue em endereços no Centro e até na casa de parlamentares. Cabral recebeu R$ 122,8 milhões. O presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB), identificado como Platina, Grego ou Satélite, teria recebido R$ 58,4 milhões do esquema fomentado desde a década de 90.
Ex-secretário de Governo e de Assitência Social e Direitos Humanos de Luiz Fernando Pezão, Paulo Melo (PMDB), o Pinguim ou Maria Mole, teria abocanhado irregularmente R$ 54,3 milhões. Líder do governo Pezão no parlamento, Edson Albertassi (PMDB), receberia R$ 60 mil, por mês. Na Alerj, o esquema era para impedir leis que afetassem as empresas de transportes, permitir isenções fiscais e transformar as CPI's do setor em pizza. Em e-mail interceptado pelos investigadores consta que a Fetranspor acompanhava 50 Projetos de Lei.
Planilhas dos empresários
A contabilidade paralela foi revelada em delação premiada pelo doleiro Álvaro Novis, que operava com a HoYA Corretora de Valores e Câmbio. Segundo ele, as planilhas foram arquitetadas por José Carlos Lavouras, Lélis Teixeira, Jacob Barata Filho e João Augusto Monteiro, principais proprietários de empresas de ônibus.
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Lavouras está em Portugal e o governo já informou que ele não será extraditado por ser cidadão português. Uma delação bombástica é a de Marcelo Traça, ex-presidente do Sindicato de Empresas de Transportes Rodoviários e vice-presidente do Conselho de Administração da Fetranspor, que detalhou a corrupção e inclui na investigação o deputado Édson Albertassi. Segundo Traça, dinheiro em espécie para pagar propina era entregue a HoYA. Os valores eram recolhidos nas garagens das empresas de ônibus.
Agrobilara envolvida no esquema
Com seis mandatos de deputado no currículo, o cacique do PMDB, Jorge Picciani, tinha como homem forte Jorge Luiz Ribeiro, que recebia dinheiro até na TV Alerj. Era ele que operava a propina mandada por Carlos Lavouras, por meio Transexpert, que usava veículos blindados. Os pagamentos também eram feitos por Álvaro Novis.
Ribeiro é sócio de três empresas em que a Agrobilara Comércio e Participações Ltda que tem como um dos sócios Picciani também é parceira. São elas: Tamoio Mineração Ltda, Villa Toscana Incorporação Imobiliária Ltda e Thejus Empreendimentos e Participações Ltda. No esquema, Ribeiro é auxiliado por Ana Cláudia Jaccoud, apontada como funcionária da Agrobilara.
Segundo delação premiada de Jonas Lopes, ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado, que relatou a corrupção na Corte, em 2014 ele usou R$ 500 mil, em maços de dinheiro, em compra subfaturada de 100 cabeças de gado Agrobilara. Em 2015, mais 260 mil na aquisição abaixo do valor de 70 bovinos da Agropecuária Copacabana Comércio e Participações Ltda. A negociata, segundo Lopes, foi ajustada com Jorge Picciani e Felipe, seu filho, que comanda as empresas do pai.
Jorge Picciani teria esquema de nomeação de aliados em gabinetes e entre as vinte maiores beneficiárias com renúncia fiscal está a Cervejaria Petropólis S/A, que alcançou R$ 283,5 milhões. A empresa tem negócios com Picciani e intermediou doações clandestinas para ele e Paulo Melo. Picciani nega. Mas aumentou, e muito, seu patrimônio em 20 anos.
Nomeação indevida de funcionários
No sétimo mandato, o ex-secretário de Governo e da secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos de Pezão, Paulo Melo é apontado como forte aliado do ex-governador Sérgio Cabral. Melo teria o controle de contratos firmados com o Detran. Por e-mail, ele comandaria a nomeação de funcionários para o órgão feito em conluio com a Facility, responsável pela mão de obra, que recebia pagamentos do governo, a pedido de Melo.
Segundo as investigações, os operadores financeiros de Melo seriam Andreia Cardoso do Nascimento, chefe de gabinete do parlamentar e Fábio, o irmão dela. O dinheiro era entregue num antigo comitê de campanha, no Centro.
Paulo Melo usaria funcionários para integrar sociedade em empresas. Um deles é apontado como Weverson do Carmo Lisboa, que foi secretário Municipal de Meio Ambiente de Saquarema, e Túlio César de Almeida Pereira, em empresas como Mauá Agropecuária Reunidas Ltda e Saquarema Vip Serviços Especiais. Em 2015, Jorge Picciani nomeou Weverson para exercer cargo em comissão junto à presidência da Casa.
Nas declarações de bens apresentadas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por Melo consta empréstimo de R$ 50 mil com a MVC Gestão de Ativos, que tem como sócio Mário Peixoto, administrador da Multiprof Cooperativa Multiprofissional de Serviços, a favor de quem o estado empenhou mais de R$ 131 milhões entre 2002 e 2013, como consta no inquérito civil nº 2013.00670.
Empresas receberam propina
Líder do governo na Alerj, presidente da Comissão de Constituição e Justiça e tesoureiro do PMDB, Édson Alberassi, começou a carreira política como vereador em Volta Redonda, no final da década de 90. É acusado de receber R$ 60 mil, por mês, do esquema de corrupção da Fetranspor.
A indicação para assumir vaga deixada por Jonas Lopes no Tribunal de Contas do Estado foi o estopim para a deflagração da Operação Cadeia Velha. Os investigadores suspeitaram de que a manobra era para conseguir foro privilegiado no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Depois de costurar a renúncia dos auditores do TCE, ontem ele abriu mão de ser chancelado para o cargo.
De acordo com o Ministério Público Federal, a mulher de Albertassi, Alice Brizola Albertassi, é sócia da V. P. D. Empresa de Radiofusão Ltda, Rádio Energia Ltda, Rádio Zé Ltda, Rádio Difusora Boas Novas Ltda, Associação Nova Aliança e Phonomusic Áudio Visual e Serviços de Sonorização. As rádios teriam recebido R$ 644 mil como caixa de propina da Fetranspor.
Em 2015, Adamastor Pereira Barros, que é presidente da Associação, sacou mais de R$ 340 mil em 2015 e R$ 718 mil, em 2016. A entidade recebeu do estado de 2002 até 2017, R$ 27.743.491,11. No período da presidência de Alice, recebeu R$ 10,5 milhões. Consta que André Almeida, que também exerceu a presidência, foi fornecedor e doador da campanha de Albertassi em 2010. O deputado tem 68 cargos na Alerj, com salários que vão de R$ 983 a R$ 30.471 mil.