Maicon foi agredido em jogo de futebol contra alunos da PUC e registrou o caso na DP - Marcio Mercante / Agencia O Dia
Maicon foi agredido em jogo de futebol contra alunos da PUC e registrou o caso na DPMarcio Mercante / Agencia O Dia
Por ADRIANA CRUZ

Rio - Ofendidos por causa da cor, raça, etnia e religião cada vez mais transformam a dor em força motriz em busca por justiça. Quem luta contra esse tipo de violência alerta, no entanto, que o crime de injúria por preconceito, criado em 2003, coloca na penumbra o racismo que tem como ferramenta de combate a Lei Caó, de 1989. Levantamento do Tribunal de Justiça, a pedido do DIA revela que se, em 2013, havia 327 ações, com 29 condenações, por injúria de preconceito, no ano passado foram levados ao Judiciário 1.108 casos (alta de 238%), com 257 punições. Por outro lado, processos relacionados ao crime de racismo alcançaram 25 registros, em 2013, e caíram para 22, em 2017, com apenas seis condenações nos últimos quatro anos.

De início, o delegado é o responsável por enquadrar como injúria ou crime racial, mas o promotor pode mudar isso. A pena para o primeiro varia de um a três anos. Já no segundo, pode chegar até a cinco anos.

"Quando alguém chama o outro de macaco coloca todo mundo naquela categoria, no mesmo barco. O crime de injúria descaracterizou a Lei Caó. Mas tem um projeto em tramitação na Câmara dos Deputados que leva tudo de volta para a Lei Caó", avalia o advogado Rodrigo Mondego. Que vai ainda mais longe: "Imagina quando a Titi, filha do Bruno Gagliasso, foi atacada, todas as crianças com aquelas características também foram. Em tempos de redes sociais, tudo é potencializado."

O presidente da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogado do Brasil do Rio, Breno Melaragno, explica que a abrangência das leis são diferentes. Ele esclarece que a injúria racial ofende a honra de alguém com relação à raça, cor, etnia, religião ou origem. O crime de racismo atinge a coletividade e é inafiançável e imprescritível (sem prazo para o estado punir). "A Lei Caó quis abranger os detalhes", explicou.

A última terça-feira não sai da cabeça da atriz e ativista Dani Ornellas, de 40 anos, vítima de injúria racial e intolerância religiosa. Ela foi interrompida pela proprietária da casa onde mora, em Santa Teresa, quando ouvia cântico de candomblé durante oração para Xangô, com o filho, de sete anos. "Ela disse que era música de preto da macumba", relembrou. Dani registrou na 7ª DP (Santa Teresa), mas desabafou: "Se você não se colocar bem na hora de denunciar, é minado no olhar. Conheço muita gente que não registrou queixa".

'Tem que haver conscientização'
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"Tem que haver conscientização", pregou Maicon Nascimento, de 26 anos, estudante de Direito, da Universidade Católica de Petrópolis. No mês passado, ele foi atingido por uma casca de banana durante os Jogos Jurídicos do Rio de Janeiro em uma partida de futebol contra a equipe da Pontifícia Universidade Católica (Puc-Rio).
"Muitas vezes o próprio negro não sabe que está sendo ofendido. Agora, o discurso racial só aumenta. Espero que haja Justiça", afirmou. O caso foi registrado na 105ª DP (Petrópolis). A PUC foi suspensa pela Liga Jurídica Carioca e está fora da competição no ano que vem.
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Governo quer padronizar atendimento
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União de esforços para auxiliar servidores públicos a atender as vítimas de injúria de preconceito ou racismo. É o que defende a subsecretária de Direitos Humanos, Justiça e Cidadania, Aline Inglez. "Há tendência a se registrar casos de racismo como injúria racial", analisou. No ano passado, a pasta e a Secretaria de Segurança desenvolveram o aplicativo ValoraSeg para padronizar atendimento de policiais às vítimas de crimes associados a criança e adolescente; mulheres; LGBT; idosos, intolerância religiosa e discriminação racial.
Para Fabiano Monteiro, antropólogo e professor da UFF, que acompanha os dados do Instituto de Segurança Pública, o aumento dos casos demonstra maior acesso à justiça. "Mostra que as pessoas estão mais motivadas. Daqui a 50 anos a dinâmica poderá ser outra, como ocorreu na década de 70 com o aumento dos casos de divórcio", explicou. Segundo ele, de 2006 a 2016, foram 14.087 registros em delegacia, dos quais 13.617, por injúria de preconceito e 469 da Lei Caó.
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"O aumento decorre da conscientização quanto à gravidade das condutas. Nos crimes praticados pela internet, há produção de provas", diz o promotor Luís Otávio Figueira, que atua contra as infrações na rede.
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