Ex-secretário de Niterói anotava propina e guardava papel no bolso, diz delator
 - Luciano Belford/Agência O Dia
Ex-secretário de Niterói anotava propina e guardava papel no bolso, diz delator Luciano Belford/Agência O Dia
Por ESTADÃO CONTEÚDO

Rio -  O empresário Marcelo Traça, delator da Operação Lava Jato do Rio, afirmou em depoimento ao Ministério Público do Estado que o ex-secretário municipal de Obras de Niterói Domício Mascarenhas de Andrade era "muito discreto" ao negociar propina e anotava "valores espúrios" em bilhetes, guardando-os nos bolsos. O ex-secretário foi alvo da Operação Alameda, braço da Lava Jato que prendeu o prefeito da cidade, Rodrigo Neves (PDT), no dia 10 de dezembro.

"Domício era muito discreto nas negociações e tinha por hábito tratar sobre valores espúrios escrevendo-os em bilhetes, que sequer eram rasgados na frente do depoente; que Domício escrevia os valores nos bilhetes, os apresentava ao depoente e imediatamente em seguida o recolhia, colocando-o no bolso para posterior descarte", narrou o delator.

O Ministério Público do Rio acusa Rodrigo Neves, Domício Mascarenhas de Andrade, Marcelo Traça e mais dois empresários do ramo de transporte público rodoviário - João Carlos Felix Teixeira, presidente e sócio administrador do Consórcio Transoceânico, e João dos Anjos Silva Soares, presidente do consórcio Transnit - de integrar uma organização criminosa que praticava corrupção ativa e passiva. Os promotores afirmam que entre os anos de 2014 e 2018, foram desviados aproximadamente R$ 10,9 milhões dos cofres públicos para pagamentos ilegais.

Na denúncia, os investigadores relatam que eram cobrados 20% sobre os valores pagos pela prefeitura às empresas consorciadas a título de reembolso da gratuidade de passagens de alunos da rede pública, pessoas idosas e portadores de deficiência. A acusação formal aponta que a prefeitura controlava a liberação dos recursos pagos aos consórcios pela gratuidade, retardando a liquidação das despesas e o pagamento como forma de pressionar as empresas a repassarem os valores indevidos. Em troca, segundo o Ministério Público do Rio, apoiava projetos de interesse do setor e incrementava as atividades de combate ao transporte clandestino.

Aos investigadores, o delator contou que "havia dificuldade em encontrar Domício quando se estava cobrando o repasse das gratuidades, mas após o referido pagamento pela prefeitura era fácil encontrá-lo para o pagamento da propina". Marcelo Traça declarou que os encontros em que presenciou pagamentos de propina foram realizados no Sindicato das Empresas de Transportes Rodoviários do Estado do Rio de Janeiro (Setrej).

"A sede do Setrej era o local de preferência e foi o local onde certamente ocorreram a maioria dos pagamentos; alguns pagamentos foram feitos na ausência do depoente, mas no gabinete da Presidência do sindicato; o Setrej era o local de preferência, pois não tinha câmera de segurança e nem controle de entrada e saída", afirmou o delator.

Marcelo Traça descreveu os encontros nos quais "eram estipuladas as estratégias para recebimento por parte dos consórcios das gratuidades devidas pela prefeitura e subsequente retorno de vinte por cento em propina sobre os valores recebidos pelos consórcios". O delator contou que "os encontros foram realizados em diversos locais de Niterói".

"Podendo destacar o Setrej, Plaza Shopping, Niterói Shopping, Rio Decor, um café no Supermercado Guanabara, um café próximo da antiga sede da prefeitura, restaurantes Chalé e Ícaro, no bairro Icaraí, em postos de gasolina, como por exemplo, o Posto Shell na descida da Ponte, um posto de gasolina em São Francisco perto do restaurante À Mineira e um posto perto do mercado de peixe, centro de Niterói", disse.

De acordo com o delator, "os diálogos eram realizados por mensagens em aplicativo de Whatsapp e SMS". Marcelo Traça relatou que as conversas eram "breves" e tinham por objetivo a marcação dos encontros pessoais.

"Os locais dos encontros eram propositalmente marcados fora da prefeitura e em localidades diversificadas justamente para manter a sua clandestinidade e evitar que fossem identificados, tendo em vista o objetivo ilícito que os motivaram; os encontros não tinham uma regularidade específica e eram realizados após o depoente ser instado por João Carlos Félix e João dos Anjos, que diziam ao depoente que os pagamentos das gratuidades estavam em atraso e era necessário pedir à Domício e ao prefeito Rodrigo neves a realização dos repasses", contou o empresário.

Defesas

A reportagem está tentando contato com todos os citados. O espaço está aberto para as manifestações.

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