Fuzis apreendidos - Cléber Mendes/ 18.07.2019
Fuzis apreendidosCléber Mendes/ 18.07.2019
Por Waleska Borges
Rio - As apreensões de fuzis no Estado do Rio podem bater um recorde em 2019. O Secretário de Estado da Polícia Militar, coronel Rogério Figueredo, estima que até o fim do ano a PM irá retirar das mãos de criminosos 500 armas deste tipo — de 1º janeiro até 18 de julho, a corporação já apreendeu 305; em todo o ano passado, foram 330. Se a expectativa de Figueredo se confirmar, o resultado vai superar em 30% o número de 2017, quando 382 fuzis foram apreendidos pela PM, o que é, até agora, o maior índice da série histórica, iniciada em 2008. O total de apreensão de armas pela Polícia Militar no ano, até 18 de julho, chegou a 4.795, além de 1.072 simulacros (sem poder de fogo).
"Esse é um assunto em que os parlamentares devem se debruçar e nos ajudar, porque traz insegurança não só para o Rio, mas para todo o Brasil", afirmou o coronel Figueredo durante uma coletiva de imprensa para apresentação de 30 fuzis apreendidos no último dia 18, no Complexo da Maré.
O titular da Delegacia Especializada em Armas, Munições e Explosivos (Desarme), Marcus Vinicius Amim, explicou que muitos fuzis apreendidos no Rio não são originais. Eles são montados, principalmente, no Paraguai, mas também em território nacional. O armamento entra no Brasil pelas vias terrestre, marítima e aérea.
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"São armas de guerra usadas para disputa de território entre facções criminosas e a milícia", disse Amim.
Segundo o delegado, o armamento apreendido também chega ao país vindo dos Estados Unidos, de países do Leste europeu e da China. De acordo com ele, um fuzil custa entre R$ 35 mil e R$ 50 mil no mercado ilegal. "O objetivo da Desarme não é apreender fuzil, mas chegar até quem vende essas armas para os traficantes. Esses moram em mansão e usam jatinhos", disse Amim, que não fala sobre investigações, mas adianta que há empresários envolvidos no tráfico de armas no estado.
O fuzil AR-15/M16 é o modelo mais apreendido pela PM no ano. Segundo o especialista em armas e diretor da Associação Brasileira de Profissionais de Segurança no Rio, Vinicius Cavalcante, este armamento é do fim dos anos 50 e início dos anos 60, e sua patente (registro que garante ao titular a exclusividade de explorar comercialmente a sua criação) já caiu.
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"Há um monte de gente, inclusive no Brasil, produzindo versões do AR-15/M16. Essas armas têm o mesmo poder das originais. São idênticas. Hoje, você encontra na internet projetos dimensionados para fabricar esses fuzis. Se você tiver um torno especial, de comando numérico, ou seja, aquela ferramenta conectada ao computador, pode produzir isso numa garagem", alertou Cavalcante.
De acordo com o especialista, há diversas procedências deste modelo, desde os fabricados em máquinas de comando numérico, normalmente no exterior, até os que são excedentes de guerra: "Aqui se teve muita arma proveniente da Argentina e da Bolívia, mas há também o armamento que vem novo de fábrica de outros lugares. Nem todos esses fuzis que estamos vendo são fabricados de peças. Há os comprados nos Estados Unidos por empresas de fachada, de importação e exportação, cada caso é um caso."
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Cavalcante atribui o aumento das apreensões ao trabalho das polícias Civil e Militar. Ele disse que a extinção da Delegacia de Repressão a Armas e Explosivos (Drae), em dezembro de 2011, favoreceu a atuação dos marginais. Com a implantação da Desarme, em abril de 2017, a inteligência do setor voltou a atuar: "Houve um hiato. Nele, os caras (traficantes) não dormiram. A polícia dormiu, mas os caras não. Nós não paramos de perseguir fuzis, apenas paramos de atuar de forma inteligente contra essa modalidade de tráfico".
O AK-47, o segundo modelo mais apreendido pela PM no Rio este ano, é o fuzil mais vendido no mundo, de acordo com Cavalcante — estima-se que haja 65 milhões de unidades da arma, criada na década de 1940: "Hoje, essas apreensões feitas pela PM não refletem a preferência e nem as quantidades que entram no Rio.
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O AR-15/M16 foi o mais apreendido, mas, não necessariamente, é o mais numeroso na mão da criminalidade."
'Única forma de impedir é através de investigações'
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Um dos fenômenos marcantes da criminalidade no Rio, segundo a cientista social Silvia Ramos, coordenadora do Observatório da Segurança da Universidade Candido Mendes, é a presença de fuzis carregados por criminosos abertamente em bairros e favelas do estado.
"Isso só acontece no Rio. Não há em nenhum outro estado do Brasil. Em raríssimas cidades do mundo ocorreu apenas por algum tempo, como em Cali e Bogotá (na Colômbia)", compara Silvia.
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De acordo com ela, nos últimos dois anos foi verificada a expansão de fuzis não só para grandes áreas da Baixada Fluminense e de São Gonçalo, mas também para o interior, como Campos, Angra dos Reis e, mais recentemente, Volta Redonda e Barra Mansa.
"Esse é um cenário gravíssimo, porque a presença de pessoas portanto fuzis nas ruas oprime as populações locais e aumenta o risco de tiroteios e mortes. A única forma de impedir o fenômeno é através de investigações policiais que dependem de investimento em inteligência", afirmou Silvia, que critica a política de confronto, avaliando que o pior que pode ocorrer para os moradores é "a tentativa de combater fuzil com fuzil".