Da esquerda para a direita: Tainá de Paula, Thais Ferreira, Benny Briolly e Maiara Felício - Divulgação
Da esquerda para a direita: Tainá de Paula, Thais Ferreira, Benny Briolly e Maiara FelícioDivulgação
Por RAI AQUINO
Com mais de 1,3 mil favelas em todo o estado, de acordo com o Censo de 2010 do IBGE, o Rio de Janeiro tem mais de 2 milhões de moradores em comunidades. Os negros são a maioria nessas regiões (mais de 1,3 milhão), representando 65% da população das favelas do estado.   
Apesar da maioridade em número, isso não necessariamente representa condições melhores para essa população. No Dia da Consciência Negra, o MEIA HORA ouviu vereadoras eleitas nas eleições deste ano que são crias de comunidades e ativistas para discutir questões envolvendo a igualdade racial nessas regiões.
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Mulher com mais votos e a mais votada do Partido dos Trabalhadores (24.881) na capital fluminense, Tainá de Paula, de 37 anos, vê nas drogas uma das principais desigualdades para a população negra das favelas. 
''O uso de álcool e droga é maior entre os negros e isso se dá pela dificuldade de emprego e de construção de um futuro, à luz da miséria. Não temos muitos futuros possíveis para a nossa juventude negra", destaca a cria da comunidade do Loteamento, na Praça Seca, Zona Oeste.
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Na Câmara dos Vereadores, a arquiteta diz que vai estabelecer um orçamento para o investimento na saúde da juventude negra, principalmente para combater o uso de álcool e droga.
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"É muito importante também que a gente tenha uma legislação racializada sobre o primeiro emprego, principalmente pensada para a juventude de 16 a 29 anos que não trabalha e não tem estudo, os jovens 'sem sem'. Esses jovens não têm estudo nem trabalho porque eles ficam sem essas oportunidades", avalia.
BISNETA DE VÓ LUCÍOLA
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Eleita com 14.284 votos também na capital fluminense, Thais Ferreira (Psol), 32, critica que a ocupação da cidade como um todo fez com que as comunidades fossem afetadas pelo racismo estrutural existente hoje em dia. A vereadora eleita é bisneta de Vó Lucíola, uma das primeiras moradoras do Morro da Mangueira, na Zona Norte.
"Em um espaço onde falta tudo, a gente já tem a experiência da desigualdade desde o nascimento das pessoas. E vemos o acúmulo de experiências não-positivas nesses espaços, como costumes racistas e até doenças associadas a esse ambiente vulnerável", observa a cria do Morro do Sapê, em Vaz Lobo, Zona Norte.
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A especialista em saúde da mulher e políticas para as infâncias quer que a Guarda Municipal, por exemplo, mude o critério de "suspeição", que tem como "suspeito padrão" o pobre e o preto.
"Também quero criar uma estrutura que possa acolher e encaminhar vítimas de violência doméstica, oferecendo apoio para essas pessoas que muitas vezes ficam sem atendimento", avisa.
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NITERÓI
Primeira vereadora travesti eleita de Niterói e a quinta mais votada do município da Região Metropolitana (4.367), Benny Briolly (Psol), 29, lamenta que as comunidades são os lugares onde as políticas públicas não chegam.
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"Aqui em Niterói temos uma das especulações imobiliárias mais caras do país. Temos hoje um índice de IPTU, de aluguel e moradia que é totalmente voltado para a elite da cidade. E as pessoas ainda estão se aquilombando nas favelas", enxerga a cria do Morro da Penha.
Na Câmara de Vereadores, Benny quer fazer com que o orçamento de Niterói seja distribuído pensando nas questões de gênero, raça e classe. Para ela, esses são elementos principais na desconstrução do racismo e das desigualdades nas favelas.
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"A educação deve ser pensada com essas questões também, assim como as politicas socioeconômicas no geral", defende.
FRIBURGO
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Vereadora mais votada em Nova Friburgo (1.870) e a primeira negra eleita na Câmara do município da Região Serrana, Maiara Felício (PT), 26, observa a contradição da cidade que é conhecida como a "Suíça Brasileira" ser uma das que serviu de rota do ouro na época da escravidão.
"É proposital o apagamento da população preta daqui. Não se conta que Friburgo já chegou a ter uma população majoritariamente composta por escravos. Preferem vender essa ideia de uma cidade europeizada", critica a cria da comunidade do Prado.
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A fotógrafa e ex-modelo que criar um espaço para discutir as demandas da população negra da cidade. Ela quer que os vereadores e a próximo prefeito, Johnny Maycon (Republicanos), tenham responsabilidade com essa parcela da população, "falsamente vista como minoria".
"A ideia é ter um centro de acolhida da diversidade. Já há até um Projeto de Lei pronto. Será um prédio onde cada andar terá um setor, voltado para a mulher, a negritude, a juventude e a população LGBTQIA+, para que todos tenham autonomia para discutir suas demandas e façam de fato política afirmativa na cidade", projeta.
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ATIVISTAS QUEREM POLÍTICAS PÚBLICAS
Enquanto as vereadoras eleitas projetam o que fazer para garantir os direitos da população negra assim que tomar posse, ativistas de diversas comunidades destacam a importância da presença do Estado nessas regiões mais vulneráveis também para enfrentar com o racismo.
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Nascido e criado no Morro dos Macacos, na Zona Norte do Rio, Vitor Bernardo, 28, enxerga nos números de homicídios e de encarceramento as maiores evidências no racismo estrutural da nossa sociedade. Dados do Instituto de Segurança Pública do Rio (ISP) revelam que 78% dos mortos em ações policiais no estado em 2019 eram pretos ou pardos.
"A gente precisa de políticas públicas normativas. Nós pecamos muito por disputar a juventude com o crime organizado. Nossos jovens crescem dentro de uma desigualdade muito grande", critica.
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Do Morro do Turano, no Rio Comprido, Evandro Machado, 42, acredita que estejamos passando por um momento delicado sobre os direitos humanos no nosso país. Ele defende que não apenas os brancos sejam responsáveis por escrever nossa história, mas também os negros.
"Para a gente que vive na favela é realmente muito difícil ainda. Com a visibilidade que algumas questões estão tendo, as pessoas estão tomando um pouco mais de cuidado com o racismo, estão tendo um pouco mais de receio de falar sobre os negros", avalia.
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Do Morro do Vidigal, na Zona Sul, Sérgio Henrique, 41, vê o preconceito também partindo da própria comunidade. Ele defende o investimento em projetos culturais para seja a realidade de exclusão comece a mudar.
"Se valorizassem mais nossos projetos e incentivassem cursos, palestras e outra ações, iria nos ajudar a nos unirmos cada vez mais como pessoas. Seria muito válido não só para a gente, mas também para as pessoas do asfalto", visualiza.