Helena Werneck com a filha, Paula Werneck - Arquivo Pessoal
Helena Werneck com a filha, Paula WerneckArquivo Pessoal
Por O Dia
Rio - O prefeito Eduardo Paes anunciou na última semana que a arquiteta e urbanista Helena Werneck ficará à frente da Secretaria da Pessoa com Deficiência, um dos últimos nomes que faltava para o secretariado. Formada na Universidade Federal do Rio, ela iniciou a trajetória na área social em 1987, após o nascimento da filha com T21. Em 2004 fundou o Instituto MetaSocial, que promove a inclusão de pessoas com deficiência através da informação e da conscientização.
Em entrevista a O DIA ela revelou que logo nos primeiros dias como secretária pretende conhecer todos centros de referência, moradias e centros de convivência e ouvir equipes que trabalham na área. Helena disse ainda que pretende trabalhar em conjunto com outras secretarias e que acredita que a cidade do Rio está retomando a mentalidade da inclusão.
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Como surgiu este convite e quais são os planos para a Secretaria da Pessoa com Deficiência no Rio de Janeiro?

Não sou da área da política, sou uma mãe que começou um trabalho a partir das experiências que vivi com minha filha. Foi a Paula (filha mais velha de Helena, que tem síndrome de Down) e presenciar tantas dificuldades relacionadas a isso, que me levou a este engajamento na luta pelos direitos das pessoas com deficiência. E neste caminho eu conheci muitas pessoas e uma delas foi o Romário (ex-jogador de futebol e atualmente senador). Na época que nos conhecemos sua filha, Ivy, que também tem síndrome de Down tinha acabado de nascer, e acho que isso nos aproximou, acho que ele viu em mim alguém que podia ter essa troca de experiência.
Eu já fazia este movimento em prol de pessoas com deficiência, levando informação, buscando conscientização e foi assim...através desse trabalho que o senador me conheceu e agora acabou trazendo meu nome à tona para a secretaria, foi indicação dele e o prefeito, vendo toda minha trajetória, me fez o convite. O senador Romário é uma pessoa muito atuante, preocupado e presente nos assuntos relacionados a causa. Como secretária darei o meu melhor, pautada na legislação, para oferecer tornar cada vez mais eficientes as políticas públicas que atendam às pessoas com deficiência. 
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Quais são as primeiras medidas que você adotará como secretária? O que esperar nas primeira semanas?

Nos primeiros 15 dias meu foco será ouvir as equipes que trabalham nesta área e visitar Centros de Referências, Convivência e casas de moradia. Na verdade eu já até comecei a fazer isso, conversei com alguma pessoas, gente que já trabalha nesses centros de referência e que fazem um trabalho maravilhoso, mesmo em meio a muitas dificuldades. Vou precisar ver tudo de perto para depois ter um diagnóstico da situação.
Todas as minha decisões serão tomadas com base naquilo que ouvir dessas pessoas. Em meu primeiro encontro com o prefeito Eduardo Paes ele foi muito claro e direto. Ele quer que a secretaria seja basicamente técnica, com gente competente, conhecedora da área.
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Como uma arquiteta por formação acabou trabalhando com a causa de pessoas com deficiência?

Há 33 anos, quando a Paula nasceu, não tinha muita informação sobre a síndrome de Down e também não tinha internet, então eu fui atrás de respostas. Procurei especialistas, pesquisei e fui para outros estados, principalmente em São Paulo, que era onde os tratamentos para pessoa com síndrome de Down eram mais avançados na época. Queria saber mais e fui atrás. Senti a necessidade de partilhar isso com outros pais e trazer para o Rio de Janeiro o conhecimento que estava adquirindo em São Paulo.
No começo, o que me motivou foi minha filha, mas depois isso transcendeu e comecei um movimento com outros pais. Acho que o start para este engajamento foi quando notei que sempre que levava a Paula na pracinha perto de casa, morava na Tijuca, os pais das outras crianças afastavam os filhos dela. Ela tinha uns 3 anos. Isso me despertou a lutar e a informar as pessoas para que a minha filha não tivesse que passar por isso no futuro. Me juntei a outros pais com os mesmos questionamentos e Aí mergulhei para conscientizar as pessoas e quebrar este preconceito. E nesse processo me descobri, nasceu uma Helena diferente. 

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Você é presidente do Instituto MetaSocial. Como vai ficar este trabalho agora que você vai assumir a secretaria?

Meu foco vai ser todo para este novo desafio que é a Secretaria da Pessoa com Deficiência. A partir de janeiro saio da presidência do MetaSocial e o atual vice-presidente, Fernando Heiderich, vai assumir o posto. Ele está pronto para assumir esta função. No instituto eu sempre pude contar com a ajuda de algumas pessoas, voluntários engajados e competentes. Temos uma equipe capacitada e pronta para seguir sem mim.
Durante os anos à frente do MetaSocial você vivenciou muitas histórias, ajudou muitas pessoas e viveu muitas experiências. Quais momentos mais te marcaram?

Uma das primeira emoções no MetaSocial, foi acompanhar o alcance dos resultados da nossa primeira campanha de TV, em 1996. Conseguimos um canal 0800, literalmente no jargão, sem custo algum do então 'Papatudo'. Com isso, passamos a receber chamadas de pessoas do país todo em busca de informações. Foi lindo e muito emocionante ouvir e conhecer os relatos relacionados a área da deficiência intelectual de um
país inteiro e poder mapear essas demandas.
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Uma segunda emoção, dentre tantas, foi nosso reconhecimento dentro da ONU, em Nova Iorque, quando representamos o Brasil numa convenção junto com outros pais e representantes.

Em setembro deste ano o presidente Jair Bolsonaro lançou uma nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE) que teve pouco tempo de vida. O decreto estabelecia classes especializadas para conduzir a aprendizagem de estudantes com deficiência, mas o STF vetou a medida. Isso acende um alerta de ameaça à educação inclusiva?

Como mãe, eu entendo a necessidade dos pais de querer proteger seus filhos e esta medida pode soar como proteção. Mas, não dá para ser assim. Temos que municiar nossos filhos com ferramentas para que eles estejam preparados para a vida e a inclusão é o meio para isso.
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Em se tratando de Educação, uma separação representa um retrocesso na educação inclusiva, não dá pra voltar atrás. Mas precisamos sempre estar atento e ouvir as demandas das famílias. Elas são o termômetro para avaliar os resultados das ações junto aos seus filhos.

Como você avalia o governo Crivella, principalmente no que se relaciona a políticas públicas voltadas para a pessoa com deficiência?
Não posso responder com relação ao governo Crivella, mas acredito que não foi dado à pasta a devida atenção e respeito merecido. Hoje, estamos percorrendo as unidades de atendimento e estamos encontrando profissionais qualificadíssimos, competentes e muito, mas muito dedicados, a se dar e doar em fazer o melhor no atendimento, mesmo neste período dramático da pandemia.
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Você já foi consultora na novela Páginas da Vida, exibida na Globo em 2006, que abordou a síndrome de Down como tema central, e em outras tramas também. Como foi esta experiência?

Já fui consultora não só nesta novela, mas em outras, além de sempre indicar personagens para programas de televisão e atores para participações em novelas. Em páginas da Vida eu ajudei com a maneira que o tema síndrome de Down poderia ser trabalhado e em como a personagem Clarinha (vivida pela atriz Joana Mocarzel, na época com 6 anos) poderia ser apresentada na trama.
Outra questão recorrente em consultorias são os termos que não cabem ser usados. Tem muita gente que não sabe, por exemplo, que não se usa mais o termo portador de deficiência. Me sinto grata em ver que o trabalho que eu faço se tornou uma referência. 


A cidade do Rio está no caminho para inclusão de pessoas com deficiência ou o caminho a se percorrer ainda é muito longo?

Temos um caminho longo porque estamos sempre em evolução, mas eu vejo que agora o Rio está retomando a mentalidade da inclusão. O Rio de Janeiro precisa ser a cidade da inclusão, que tem acessibilidade no transporte, nas ruas, nas empresas, sejam elas públicas ou privadas.
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Temos que oferecer acessibilidade de informação e é isso que vamos fazer. Vamos trabalhar para conscientizar as pessoas, empresas, a todos...É preciso deixar claro que a realidade mudou e que não é aceitável mais este tipo de postura que exclui.


Existe um planejamento para trabalhar em conjunto com outras secretarias?
O carioca pode esperar este trabalho em conjunto, sim. Não é minha função fazer mudanças físicas em áreas que fogem da minha secretaria, mas é minha função lutar para que o Rio de Janeiro tenha um olhar e uma ação efetiva para as pessoas com deficiência, tenho dever de fazer este trabalho de conscientização, e melhorar e ampliar os atendimentos que já são realizados.
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Por exemplo, o transporte público não é minha responsabilidade, mas eu quero trabalhar juntamente à Secretaria de Transporte para que a acessibilidade nos meios de transportes seja real e funcione. Os espaços públicos pode e deve ser pensado para ter acessibilidade. As ruas, os prédios públicos devem ter total acessibilidade e eu, como secretária, quero atuar para mudar isso.