A irmã de Gabriel Estevão, que também tem deficiência intelectual, passou mal em frente ao Instituto Médico Legal (IML), em Niterói - Estefan Radovicz
A irmã de Gabriel Estevão, que também tem deficiência intelectual, passou mal em frente ao Instituto Médico Legal (IML), em NiteróiEstefan Radovicz
Por YURI EIRAS / ANDERSON JUSTINO
Rio - Familiares de Jefferson Bispo da Silva, de 15 anos, e Gabriel Machado Estevão, 19, pedem justiça após a morte dos jovens na comunidade Santo Cristo, Niterói, na última terça-feira, durante uma operação da Polícia Militar. Nesta quarta-feira, familiares estiveram no Instituto Médico Legal (IML) da cidade para conseguirem a liberação dos corpos. Eles serão enterrados na tarde desta quarta-feira, no Cemitério do Maruí, em Niterói.
Para parentes e moradores da comunidade, a morte dos jovens é um enredo que se repete quase diariamente, mas que não há perspectiva de melhora. Jaqueline Teresa Machado diz que o irmão Gabriel, conhecido na comunidade como Zulu, tinha deficiências intelectuais e catava latinhas de alumínio no momento do tiroteio. Ela afirma que ouviu de um policial militar que o irmão morreu porque estava no 'local errado, na hora errada'.

"Sempre que acontecia um tiroteio na comunidade eu ia atrás do meu irmão. Como nossa mãe já faleceu, eu exercia esse papel na vida dele. Quando não conseguia ir buscá-lo, ele pedia para entrar na casa dos vizinhos que o conhecia. O policial falou que, infelizmente, ele estava no local errado, na hora errada. Nada justifica o que aconteceu. O que a gente mais quer é justiça”, desabafou. Uma outra irmã de Gabriel, que também é portadora de deficiência intelectual, chegou a desmaiar na porta do IML de Niterói.
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Familiares dos jovens mortos em comunidade de Niterói pedem por justiça - Estefan Radovicz
Familiares dos jovens mortos em comunidade de Niterói pedem por justiçaEstefan Radovicz


A aposentada Maria Luiza Coelho, avó de Jefferson Bispo, de 15 anos, tratava o neto como filho. Apesar da pouca idade, Jefferson, com pais separados, já havia vivido com muitos familiares diferentes, e por isso a avó decidiu pegar a guarda oficial do jovem. A idosa de 62 anos disse ter sentido um aperto no peito ao escutar os tiros. Ela estava na paróquia da comunidade, onde faz trabalhos sociais.

"Eu ouvi os tiros e senti um aperto muito forte no coração. Olhei para o padre e disse: 'Padre, o Jefferson'. Sabia que tinha acontecido alguma coisa. É tudo muito difícil, eu não estou aguentando mais. Esse garoto era tudo pra mim", disse, emocionada. "Não sei o que vai ser de mim. Era eu e ele só. Eu queria ver se fosse os filhos deles (policiais). Está muito difícil".
Familiares dos jovens mortos em comunidade de Niterói pedem por justiça - Estefan Radovicz
Familiares dos jovens mortos em comunidade de Niterói pedem por justiçaEstefan Radovicz


PMs afirmaram em depoimento que foram recebidos a tiros na comunidade 

De acordo com a Polícia Militar, uma viatura do 12º BPM (Niterói) patrulhava a região e foi atacada por homens armados. Houve o confronto e duas pessoas foram encontradas baleadas. A PM apreendeu uma pistola glock com kit rajada, uma granada e drogas. Maria Luiza Coelho, avó de Jefferson, afirma que ouviu de moradores que foram os policiais quem forjaram as armas e as drogas no local do crime.
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A ocorrência foi encaminhada para a Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí (DH/NSGI). O delegado Mario Lamblet, que investiga o caso, disse que os dois fuzis de calibre 7.62 usados pelos policiais militares na ação foram apreendidos. A Polícia Civil está analisando os depoimentos de todas as testemunhas. Familiares dos familiares já foram ouvidos.
"Os policiais alegaram que chegaram na comunidade quando houve confronto com cerca de quatro elementos. Após o confronto, encontraram os dois jovens caídos. Próximo aos jovens, material com drogas, e também uma arma e uma granada. As armas dos policiais e a pistola foram apreendidas e irão passar por perícia", afirmou o delegado. "Um policial disse que efetuou seis disparos, o outro disse que não se recorda. Vamos apurar e analisar o que foi colhido no local", completou o titular da DH de Niterói.

Ainda segundo a Polícia Civil, os jovens não tinham anotações na polícia. Há apenas um registro de Jeferson, quando tinha apenas dez anos, por um furto num supermercado. O caso não é registrado oficialmente pela polícia como passagem porque o autor da infração é menor de 12 anos. "O Jefferson quando criança teve uma ocorrência na delegacia de Alcântara (72ª DP). Na época, a própria mãe fez a ocorrência lá. O outro rapaz, o Gabriel, não teve ocorrência".
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Na tarde de terça-feira, moradores desceram até a Alameda São Boaventura, no Fonseca, para protestar contra a morte de Jefferson e Gabriel.