Kathlen Romeu estava grávida de 14 semanas quando foi baleada no Complexo do LinsReprodução Internet

Rio - Familiares da design de interiores Kathlen Oliveira Romeu, de 24 anos, nunca duvidaram que o disparo que matou a ela e seu bebê, no dia 8 de junho deste ano, no Complexo do Lins, na Zona Norte do Rio, partiram da arma de um policial militar. De acordo com o namorado da jovem, Marcelo Ramos, a confirmação da suspeita já havia sido feita à família pela Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), mas um laudo da especializada tornou oficial o que os parentes vinham denunciado há seis meses.
"A gente já tem essa informação oficial de que o tiro que matou a Kathlen partiu da arma de um policial. Isso também nunca foi dúvida para a gente. Agora a gente tem, com o laudo, essa informação oficializada. Eu fico feliz, mas é apenas um pequeno passo em direção à justiça. A gente ainda vai continuar cobrando e muito, para que a justiça seja feita de verdade, para que os policiais sejam punidos, para que o Estado seja responsabilizado", declarou Marcelo, pai do bebê que a jovem esperava e com quem ela fazia planos de se casar.
A mãe de Kathlen, Jaqueline Oliveira, reafirmou que sempre acreditou que a filha havia sido morta por policiais militares, mesmo não tendo presenciado o crime, já que sua mãe, amigos e outros moradores da comunidade viram o momento em que sua filha foi baleada. Uma moradora relatou, à época, que os policiais só pararam de atirar após os gritos da avó da vítima.
"Eu nunca vou duvidar da minha mãe, todos os meus valores foi ela quem me passou. Então, eu vou acreditar na palavra da minha mãe, na palavra dos meus amigos, de quem estava ali, de quem viu. E, num beco daquele onde aconteceu, se tivesse troca de tiros, algum bandido estava baleado, ou algum policial. Todos eles estavam intactos. Não tinha como", ressaltou Jaqueline.
A investigação ainda precisa descobrir quem foi o autor do disparo, já que em depoimento, dois militares afirmam ter atirado no momento em que Kathlen foi atingida. Segundo a Polícia Civil, o inquérito está em fase final de conclusão e as informações quanto ao encerramento do caso serão passadas assim que o mesmo for relatado e enviado ao Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ). A conclusão está prevista para acontecer no início do próximo ano.
Nesta segunda-feira (13), a 2ª Promotoria de Justiça do MPRJ, junto à Auditoria da Justiça Militar, denunciou o capitão da Polícia Militar Jeanderson Corrêa Sodré, o 3° sargento Rafael Chaves de Oliveira e os cabos Rodrigo Correia de Frias, Cláudio da Silva Scanfela e Marcos da Silva Salviano por modificarem a cena no local onde a jovem foi morta. Segundo a denúncia, Chaves, Frias, Scanfela e Salviano retiraram, antes da chegada da perícia, o material que estava no local, acrescentando 12 cartuchos calibre 9mm usados e um carregador de fuzil 556, com dez munições intactas, que foram apresentados na 26ª DP (Todos os Santos).
Ainda de acordo com o documento, Sodré "estando no local dos fatos e podendo agir como superior hierárquico para garantir sua correta preservação, omitiu-se quando tinha por lei o dever de vigilância sobre as ações de seus comandados". Por isso, ele foi denunciado por fraude processual na forma omissiva e os outros quatro por fraudes processuais e por dois crimes de falso testemunho. Agora, a família espera que o MPRJ denuncie os PMs pela morte de Kathlen.
"Vamos continuar cobrando pelo Ministério Público se posicionar em relação ao crime do assassinato da Kathlen. Vamos continuar em cima, nos manifestando e contando com o apoio da mídia para não deixar ser mais um caso, não deixar que o caso seja abafado. Essa pequena vitória está nos dando um fôlego para a gente continuar a lutar e a cobrar mais ainda. O que aconteceu não pode simplesmente ficar impune. A Polícia do Rio de Janeiro costuma fazer o que quer e não pode ser assim", afirmou Marcelo.
"Eles têm que ser punidos, condenados pela área criminal. É o que a família espera, porque eles só foram indiciados na Auditoria Militar. Agora falta o promotor principal, o do homicídio, porque ela foi assassinada, junto com o meu neto, então a punição tem que ser na área do homicídio, pelo promotor Alexandre Murilo Graça. Estou aguardando um posicionamento dele, porque acho que agora não ficou mais dúvida, para quem ainda tinha. A verdade está aí, aliás, a mesma verdade que a gente conta desde o dia 8 de junho, não enxerga quem não quer enxergar, não ouviu quem não quis ouvir", completou a mãe da jovem.
Em nota, a Polícia Militar informou que o Inquérito Policial Militar (IPM) relativo ao caso foi remetido para o Ministério Público da Auditoria Militar e que todos os policiais militares envolvidos na ação continuam afastados do serviço nas ruas. Jaqueline também criticou a atuação do MPRJ no caso e disse que ações só foram tomadas após uma manifestação de amigos e familiares na frente do órgão, na última quinta-feira (9), quando o crime completou seis meses e ainda não tinha respostas.
"Curiosamente, tudo o que a gente vem falando, depois de um ato na porta do Ministério Público, na segunda-feira já teve resposta. Então, eles já tinham todas essas provas, porque de quinta para sexta, eles não iam resolver um caso. Eles já tinham isso em mãos. O Estado não fez nada. Tudo quem fez foi família, amigos, testemunhas anônimas. O Estado não fez nada, só assassinou a minha filha", desabafou ela.
Kathlen Oliveira Romeu estava no Complexo do Lins para visitar parentes, quando foi atingida, segundo a Polícia Militar, durante um confronto entre os policiais e traficantes. A jovem chegou a ser socorrida para o Hospital Municipal Salgado Filho, no Méier, mas não resistiu. O bebê de quatro meses que ela esperava também morreu. Na ocasião, o porta-voz da PM, major Ivan Blaz, disse que PMs foram atacados e não foram os responsáveis pelos disparos que mataram a vítima.
No entanto, os moradores da comunidade Barro Vermelho reafirmam que o tiro de fuzil que matou Kathlen partiu dos militares. Eles usam o termo "cavalo de tróia" para explicar a ação dos policiais. Segundo relatos, os PMs passaram toda a manhã escondidos em uma casa, esperando os criminosos aparecerem. Quando surgiram, eles atiraram de dentro do imóvel, mas acabaram atingindo a jovem. Uma moradora chegou a dizer que não houve confronto e que apenas dois tiros foram disparados.
"Não há o que se comemorar. Existe uma vitória, mas a justiça nunca vai ser feita. Não há justiça, há uma satisfação para a sociedade, para a família, para os amigos, porque eu não perdi sozinha. A gente perde como cidadã de bem, pagadora de impostos, cumpridora dos deveres. Mas, é só um direito nosso, uma justiça à memória da minha filha e para quem ficou. Isso é só uma vitória do nosso esforço, mas a justiça nunca vai ser feita, esse rombo que está no meu peito, ninguém vai tirar. Justiça nenhuma vai devolver a minha filha. Ela não volta", lamentou a mãe de Kathlen.