Equipes do BPChq reforçam o policiamento com auxílio de um veículo blindado, na localidade Chico City, no Gardênia AzulDivulgação / PMERJ

Rio – A guerra entre milícias e facções do tráfico ganhou um novo capítulo em janeiro com a invasão do Comando Vermelho (CV) a áreas da Zona Oeste do Rio dominadas por organizações paramilitares há décadas. Ao todo, o primeiro mês de 2023 teve 12 tiroteios entre os grupos armados. Apenas a Zona Oeste concentrou nove dos tiroteios, com cinco mortos e dois feridos, segundo o relatório mensal do Instituto Fogo Cruzado.

A Gardênia Azul, em Jacarepaguá, tem sido um dos principais locais dos conflitos. A região acumulou nove tiroteios em janeiro, sendo dois deles provocados pela briga por território entre tráfico e milícia, outros três foram em ações e operações policiais e os outros quatro não tiveram a motivação identificada. Moradores da Gardênia Azul relatam que traficantes impuseram o toque de recolher e famílias estão preocupadas com a volta às aulas na rede pública de ensino.

A Cidade de Deus, ao lado da Gardênia Azul, também foi afetada pela invasão. Dominada há anos pelo Comando Vermelho, a comunidade concentrou sete tiroteios em janeiro, um deles em disputas entre grupos armados. A Muzema, escolhida há um ano para receber o programa de segurança pública Cidade Integrada, do governo do estado, acumulou em janeiro deste ano quatro tiroteios, sendo dois deles em disputas. Em Curicica, foram quatro tiroteios, um deles em confronto entre grupos armados.
No feriado municipal de 20 de janeiro, dia de São Sebastião, uma adolescente de 17 anos foi atingida por tiros na barriga e na perna durante um tiroteio na Gardênia Azul. Três dias depois, Luiz Henrique da Silva Gonçalves, de 19 anos, foi morto a tiros na Muzema. Luiz Henrique era entregador de uma farmácia da região e estava trabalhando no momento em que foi assassinado.
"Dados são fundamentais para se construir políticas públicas que de fato sejam eficazes para trazer segurança à população. Falar sobre os grupos armados, sobre os conflitos entre tráfico e milícias, é um obstáculo para o governo do estado, que não divulga dados sobre o assunto. Hoje, o Instituto Fogo Cruzado conta com um Mapa Histórico dos Grupos Armados que ajuda a compreender as diferentes dinâmicas da violência armada no Rio de Janeiro. Com esses dados é possível saber, por exemplo, que a milícia controla 49,9% das áreas dominadas por grupos armados. Esse nosso extenso trabalho, feito em parceria com o Geni, da UFF, pode servir de insumo para que projetos sejam pensados para conter os avanços dos grupos armados na região metropolitana. Sem os dados, que mostram em detalhes o tamanho do problema, qualquer operação policial, como já foi dito uma vez, será para enxugar gelo", afirmou Carlos Nhanga, coordenador regional do Instituto Fogo Cruzado no Rio de Janeiro.
As disputas entre tráfico e milícia fizeram vítimas em todos os lugares. Ao todo, 14 pessoas foram baleadas nos 12 confrontos ocorridos em janeiro na Região Metropolitana do Rio. Entre as vítimas, uma foi morta e outra ficou ferida após serem atingidas por balas perdidas. Outras três pessoas foram vítimas de chacinas.

O mês em dados

Janeiro de 2023 concentrou 294 tiroteios na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Número representa um aumento de 29% em comparação com janeiro de 2022, que concentrou 228 tiroteios.
Entre os 294 tiroteios mapeados, 39% (114) deles ocorreram em ações ou operações policiais. Em janeiro de 2022, dos 228 tiroteios, 31,5% (72) foram nestas ações ou operações.
Ao todo, 164 pessoas foram baleadas na região metropolitana no primeiro mês do ano: delas, 81 morreram e 83 ficaram feridas. Em comparação com janeiro de 2022, que concentrou 122 baleados, foram 64 mortos e 58 feridos. Neste ano, janeiro teve aumento de 27% no número de mortos e de 43% no número de feridos.
Em comparação com dezembro de 2022, que acumulou 247 tiroteios, 66 mortos e 75 feridos, janeiro apresentou aumento de 19% no número de tiroteios, de 23% no número de mortos e de 11% na quantidade de feridos.
Entre as datas mais impactadas pela violência armada no mês, o dia 31 concentrou o maior número de tiroteios, com 22 registros. E o dia 12 concentrou o maior número de mortos e de feridos, foram 11 mortos e oito feridos.

Mapa da violência armada
A capital concentrou 66% dos tiroteios mapeados na Região Metropolitana do Rio em janeiro, Entre os municípios que fazem parte da área, os cinco mais afetados pela violência armada foram:

Rio de Janeiro: 194 tiroteios, 39 mortos e 43 feridos

Duque de Caxias: 23 tiroteios, 7 mortos e 4 feridos

Niterói: 14 tiroteios, 7 mortos e 10 feridos

São Gonçalo: 13 tiroteios, 6 mortos e 8 feridos

Nova Iguaçu: 10 tiroteios, 3 mortos e 3 feridos

Entre os bairros do Grande Rio, os cinco mais afetados foram:

Vicente de Carvalho: 11 tiroteios e 4 mortos

Praça Seca: 11 tiroteios e 1 ferido

Vila Kennedy: 10 tiroteios, 2 mortos e 2 feridos

Gardênia Azul: 9 tiroteios, 2 mortos e 3 feridos

Anchieta: 8 tiroteios e 1 morto

Em janeiro, 16 tiroteios ocorreram em áreas de Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Ao todo, sete pessoas foram baleadas: duas morreram e cinco ficaram feridas. As unidades afetadas pelos tiroteios foram:

Complexo de Manguinhos: 5 tiroteios e 2 feridos

Andaraí: 2 tiroteios

Jacarezinho: 2 tiroteios

Borel: 1 tiroteio, 1 morto e 3 feridos

Rocinha: 1 tiroteio e 1 morto

Complexo da Penha, Macacos, Mangueira, São João e Vidigal concentraram um tiroteio cada.

A distribuição da violência armada entre as seis regiões que compõem o Grande Rio ficou da seguinte forma:

Zona Norte (capital): 104 tiroteios, 20 mortos e 20 feridos

Zona Oeste (capital): 75 tiroteios, 15 mortos e 19 feridos

Baixada Fluminense: 66 tiroteios, 24 mortos e 18 feridos

Leste Metropolitano: 34 tiroteios, 18 mortos e 22 feridos

Centro (capital): 8 tiroteios, 3 mortos e 2 feridos

Zona Sul (capital): 7 tiroteios, 1 morto e 2 feridos

O perfil das vítimas

Ao todo, 10 pessoas foram baleadas em casos de roubos ou tentativas de roubo que terminaram em tiros no Grande Rio: seis morreram e quatro ficaram feridas. Em janeiro de 2022, houve 42 baleados no total (12 mortos e 30 feridos).
Nove agentes de segurança foram baleados na Região Metropolitana do Rio em janeiro: três morreram (um em serviço e dois fora de serviço) e seis ficaram feridos (cinco em serviço e um era aposentado/exonerado). Em janeiro de 2022 foram sete agentes de segurança baleados: cinco morreram (dois em serviço, um fora de serviço e dois eram aposentados/exonerados) e dois ficaram feridos (um em serviço e um fora de serviço).

14 pessoas foram vítimas de balas perdidas no Grande Rio em janeiro: três morreram e 11 ficaram feridas. Entre as 14 vítimas, oito foram baleadas durante ações ou operações policiais (uma morreu e sete ficaram feridas). Em janeiro de 2022, foram nove vítimas de balas perdidas: duas morreram e sete ficaram feridas. Entre as nove vítimas, oito foram atingidas durante ações ou operações policiais: duas morreram e seis ficaram feridas.
Houve quatro chacinas na Região Metropolitana do Rio que deixaram 16 mortos no total. Três delas ocorreram durante ações ou operações policiais. Em janeiro de 2022, houve cinco chacinas que deixaram 16 mortos no total. Quatro delas ocorreram durante ação ou operação policial.
Em janeiro de 2023, duas crianças, dois adolescentes e um idoso foram baleados no Grande Rio, dos quais as duas crianças e o idoso morreram. Em janeiro de 2022, duas crianças, sete adolescentes e três idosos foram baleados, dos quais uma criança, dois adolescentes e um idoso morreram, e uma criança, cinco adolescentes e um idoso ficaram feridos.