H.S.S, de 3 anos, morreu após mais de uma semana de internação, ao ser baleada pela PRFReginaldo Pimenta / Agencia O Dia

Rio - Familiares e autoridades usaram as redes sociais para lamentar a morte de H.S.S, de 3 anos. A menina foi baleada em uma ação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e estava internada em estado gravíssimo até a manhã deste sábado (16), quando não resistiu. A criança foi atingida quando passava com a família pelo Arco Metropolitano, na altura de Seropédica, na Baixada, quando o carro em que estavam foi atacado a tiros. 
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde de Duque de Caxias, H. morreu às 9h22, após sofrer uma parada cardiorrespiratória irreversível. Ela deu entrada no Hospital Municipalizado Adão Pereira Nunes, em Saracuruna, vítima de perfuração por arma de fogo, com lesão perfurante em couro cabeludo e cervical. A criança estava internada e entubada no Centro de Terapia Intensiva (CTI) e, até o início da manhã de hoje, com quadro hemodinâmicamente instável. Na quinta-feira, ela já havia sofrido uma parada cardiorrespiratória, que foi revertida em seis minutos. 
"Em nome da Prefeitura e de todos os colaboradores da Secretaria Municipal de Saúde, lamentamos profundamente e nos solidarizamos aos familiares e amigos da pequena H.", informou a pasta, em nota. Em uma publicação, uma tia descreveu a menina como a mais forte do mundo. "Você foi a criança mais forte do mundo. A tia te ama para sempre, minha pequena. Me conforta em saber que antes de você vir ao mundo, Deus já te amava, e tenho certeza que ele cuidará muito de você. Acabou o sofrimento, meu amor. Descansa em paz", escreveu.
Em outra publicação, a familiar também agradeceu o apoio que recebeu. "Nossa H. aguentou até onde podia e hoje foi morar com Papai do Céu. Obrigada a todos pela oração". Outra parente também se despediu da vítima em uma publicação. "Descansa em paz, princesa. Você foi forte, lutou até o último momento. Seu brilho, suas fofuras e seu sorriso encantador jamais serão esquecidos. Será sempre amada e lembrada em nosso corações". 
Em seu perfil, a deputada estadual Renata Souza (Psol) e presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher na Assembleia Legislativa do Rio cobrou justiça pela morte da criança. "Tristeza imensa. Inaceitável, revoltante, dilacerante. Mais uma família dilacerada, mais um futuro exterminado. Muita dor! A Lei Ágatha, de minha autoria, que garante a prioridade na investigação em assassinato de crianças e adolescentes precisa ser cumprida. É preciso celeridade e seriedade. Responsabilização, reparação e justiça! Meu abraço sincero de total solidariedade à família", declarou a parlamentar. 
Na sua publicação, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, afirmou que há mais a ser feito do que a responsabilização dos agentes envolvidos e relembrou o caso de Genivaldo Santos, morto pela PRF, no Sergipe. "Ontem, Genivaldo foi asfixiado numa viatura transformada em câmara de gás. Agora, a tragédia do dia recai na menina H.S. Para além da responsabilização penal dos agentes envolvidos, há bem mais a ser feito. Um órgão policial que protagoniza episódios bárbaros como esses - e que, nas horas vagas, envolve-se com tentativas de golpes eleitorais -, merece ter a sua existência repensada. Para violações estruturais, medidas também estruturais", disse.
O Rio de Paz informou que o nome da vítima será incluído no mural que fica na Lagoa, Zona Sul, onde é mantido, desde 2015, um memorial com os nomes de crianças e policias assassinados. A ONG ressaltou que lamenta o caso e se solidariza com a família, estando à disposição para o que precisarem. "Mais uma vez, o que há de mais hediondo na criminalidade do Rio de Janeiro, mostra sua face: a morte de meninos e meninas em tiroteios. Agora, entra para essa estatística obscena, após agonizar dias no hospital, a menina H., de apenas 3 anos, morta por um policial rodoviário federal", disse o presidente, Antonio Carlos Costa, que apontou os fatores que provocam mortes em ações da policiais. 
"O despreparo do policial. A falta de supervisão, quem está acima jamais é responsabilizado pelos crimes de quem está na ponta. Impunidade, raramente esses policiais são punidos. A cultura policial brasileira, que conduz o policial a perseguir e matar o bandido em completa desconsideração pela vida de cidadãos inocentes. O estímulo dado pela própria sociedade, que celebra a guerra e ignora o drama das famílias das vítimas, que vota em candidato que apresenta como promessa de campanha o uso indiscriminado e irracional da força sem a mínima preocupação quanto à observância de protocolos de operações policiais. Portanto, o gatilho da arma usada na morte da menina H. foi apertado não apenas pelo dedo do policial". 
De acordo com o Rio de Paz, com a morte da vítima, sobe para 11 o número de crianças mortas a tiros só este ano no estado do Rio, a maioria delas por bala perdida. O número já é quase quatro vezes maior que de todo ano passado, que registrou quatro casos. A organização social acompanha desde 2007 os casos de crianças mortas por armas de fogo em operações policiais, nas favelas do estado. Desde então, houve 102 vítimas, de 0 a 14 anos, grande parte delas negras e pobres.
Ainda segundo a ONG, entre 2022 e 2023, 15 crianças foram mortas por balas perdidas no Rio de Janeiro, sendo seis em operações policiais. No ano passado, outra ação da Polícia Rodiviária Federal deixou um adolescente morto. Em 28 de outubro de 2022, L.P., de 14 anos, foi morto durante operação da PM com a PRF, no Complexo do Chapadão, na Zona Norte do Rio. A ação aconteceu após um agente ser assassinado em um assalto na região. À época, a família acusou a polícia de homicídio e afirmou que o menino era inocente, diferento da instituição, que disse que a vítima tinha envolvimento com o tráfico.
Em nota, a Polícia Rodoviára Federal informou que se "solidariza com os familiares neste momento de dor e expressa as mais sinceras condolências pela perda". A instituição disse ainda que, através da Comissão de Direitos Humanos, segue acompanhando a família para acolhimento e apoio psicológico.
Relembre o caso
H.S.S. foi baleada quando a família voltava da casa dos avós, em Itaguaí, na Região Metropolitana, por volta das 20h, e passaram por uma viatura parada em um cruzamento na entrada de Seropédica, na Baixada Fluminense. Segundo William Silva, não houve ordem de parada, mas os agentes passaram a seguir e a ficar muito próximos ao veículo deles. Ele então decidiu dar seta para encostar o carro e, quando já estava no acostamento, quase parando, o automóvel foi alvo de mais de quatro disparos.
Em depoimento, o policial relatou que começou uma perseguição junto com outros dois colegas após constatar que o carro era produto de um roubo e admitiu ter atirado três vezes com um fuzil calibre 556. Ele disse que atirou porque ouviu tiros vindos da direção do veículo. Entretanto, uma testemunha que estava no Arco Metropolitano quando a ação aconteceu, disse que o carro onde estava a vítima não tentou fugir da abordagem e não mencionou nenhum tiro antes da criança ser atingida.
O pai da menina esclareceu que adquiriu o veículo há dois meses e que os documentos ainda estão no nome do antigo proprietário. Em sua defesa, William ainda afirmou que o vendedor apresentou o recibo de compra e venda do veículo (CRV) durante a negociação e mostrou uma consulta da placa no sistema do Detran. Os três agentes que estavam na viatura foram afastados das funções operacionas e arma do que realizou os disparos foi apreendida. O caso é investigado pela Polícia Federal.
O Ministério Público Federal (MPF) investiga a entrada de um agente da PRF à paisana e sem autorização da segurança no hospital onde a vítima estava. O órgão quer entender o que exatamente o policial fazia no CTI e, dependendo das conclusões, poderá denunciá-lo à Justiça Federal por abuso de autoridade. Ele foi identificado como Newton Agripino de Oliveira Filho e ficou afastado da instituição por 11 anos por conta de um processo disciplinar, além de ser acusado de injúria e ameaça por um corretor de imóveis.
Neste sábado, o MPF pediu à Justiça a prisão dos três policias rodoviários federais acusados de envolvimento na morte da criança. Procurado, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro não informou quando deve atender à solicitação. 
Caso Genivaldo
Em 25 de maio de 2022, Genivaldo de Jesus dos Santos, de 38 anos, foi morto pela Polícia Rodoviária Federal, em Umbaúba, Sergipe, após ser trancado por cerca de 11 minutos no porta-malas de uma viatura, onde agentes jogaram gás tóxico. Imagens veiculadas nas redes sociais flagraram a ação, que aconteceu porque a vítima estava trafegando de motocicleta sem capacete. O vídeo mostra o homem se debatendo com as pernas para fora, enquanto um policial mantem a tampa abaixada, impedindo-o de sair ou respirar. À época, a instituição afirmou que a conduta da equipe foi um ato isolado e que a corporação se compromete em aperfeiçoar os padrões de abordagem.
Segundo o IML de estado, o homem morreu de insuficiência aguda secundária a asfixia. Os três policiais envolvidos foram afastados das atividades, presos e respondem pelos crimes de tortura e homicídio triplamente qualificado. Um ano após a morte, a PRF anunciou o Projeto Estratégico Bodycams, que prevê o uso de câmeras corporais nos uniformes, a partir de abril de 2024, com cerca de 6 mil agentes usando os equipamentos. Os testes práticos começam em novembro de 2023. Em 14 de agosto deste ano, o ministro Flávio Dino demitiu os acusados.