PM Alessandro Marcelino de Souza, réu pelo homicídio de Johnatha de OliveiraReginaldo Pimenta / Agência O Dia

Rio - O julgamento do policial militar Alessandro Marcelino de Souza, acusado de matar Johnatha de Oliveira Lima, há 10 anos durante operação em Manguinhos, foi retomado nesta quarta-feira (6). As testemunhas de acusação e defesa já foram ouvidas e o interrogatório do réu também já foi realizado. A expectativa é que o resultado saia após os debates entre acusação e defesa.
Antes de começar a segunda sessão, a mãe do jovem, Ana Paula de Oliveira, falou sobre a luta diária que enfrenta há 10 anos. Segundo ela, enquanto respirar, vai lutar para provar a inocência do filho. "Eu luto há dez ano para trazer a verdade e falar quem era o Johnatha. Infelizmente, só os moradores de Manguinhos, eu e a minha família sabemos quem era ele. E a gente juntou forças ao longo desses dez anos para trazer a verdade pra cá. Agora tá nas mãos dos jurados. Meu filho não era um criminoso e espero que hoje a justiça seja feita porque eu não aguento mais. Essa impunidade tem que acabar. Toda vez que a polícia mata nossos filhos eles criminalizam nossos filhos para que não sejam condenados", disse. 
O primeiro dia de julgamento começou na tarde de terça-feira (5) e nove testemunhas foram ouvidas, sendo cinco de acusação e quatro de defesa. Em frente ao Tribunal de Justiça do Rio, amigos e familiares da vítima, além de integrantes de movimento sociais, realizaram um protesto antes do início do júri.
A primeira testemunha a depor foi Glicélia Souza, vizinha e amiga de infância de Johnatha. Ela relatou que o crime aconteceu quando levava o filho para tomar açaí após buscá-lo na escola no final da tarde, disse que ouviu barulho de tiros e correu com a criança para o interior da loja em busca de abrigo. Na correria, não teria visto de onde partiu o disparo que atingiu a vítima, mas, ao sair do local, verificou que o jovem estava desarmado e caído no chão com ferimento, sendo socorrido por moradores da região para a UPA. Segundo ela, os moradores comentavam que os disparos contra a vítima partiram dos policiais.
Fátima dos Santos foi a segunda a depor no plenário. Ela estava na rua com o filho e disse que viu três policiais no momento do crime, mas não testemunhou o disparo. Ela lembra que um deles colocou a mão nas partes íntimas, o outro estava agachado e o terceiro distante do local após escutar uma rajada. "Meu filho disse: 'Johnatha está baleado'", contou e, em seguida, viu pessoas andando na direção dos policiais militares jogando pedras neles.
Já a perita da Polícia Civil, Izabel Solange de Santana disse que, das 12 armas recolhidas para perícia técnica (sendo 9 pistolas e 3 fuzis), uma foi compatível com a que atingiu Johnatha.
Patrícia, tia do rapaz, foi a quarta a ser ouvida. Ela contou que ficou sabendo do crime pelo primo. "Foi tudo muito rápido. Recebemos a informação que ele foi baleado nas costas, fui à UPA e disseram que estava morto, sendo que vi policiais circulando no interior da UPA e não haviam socorrido meu sobrinho. Quando fui na delegacia registrar boletim de ocorrência, descobri que policiais que teriam participado da ação prestavam depoimento e classificaram o caso como auto de resistência".
No depoimento, Patrícia confirmou a informação sobre uma manifestação contra a morte de Johnatha, onde moradores atacaram o contêiner da UPP de Manguinhos. "Eu tive a 'missão' de conseguir testemunhas que concordassem em prestar depoimento em favor do Johnatha. O que aconteceu foi uma covardia. Ele era um jovem bom, sonhava em seguir a carreira do Exército e era apaixonado pela namorada. Se não fosse o braço armado do Estado, ele estava entre nós. Minha irmã criou com muita dificuldade ele e os outros dois filhos. Para uma mulher preta e moradora de favela, é muito difícil tudo. Atualmente, ela lidera o movimento 'Mães de Manguinhos’ que presta auxílio para familiares de vítimas da violência assim como a que Johnatha sofreu", afirmou.
Relembre o caso
Em maio de 2014, o jovem de 19 anos foi morto com um tiro nas costas durante uma operação policial da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) de Manguinhos quando voltava a pé para a casa da avó. Em um primeiro momento, o PM alegou que havia se deparado com criminosos armados, mas não tinha atirado. No entanto, o resultado do exame de balística mostrou que a bala que atingiu Johnatha havia saído da arma de Alessandro. Com isso, ele passou a admitir que havia atirado sete vezes.
Um vídeo em 3D elaborado pela Defensoria Pública do Rio remontou a cena da morte do jovem. O material foi elaborado com com base em informações de imagens de satélites, visita ao local, provas dos autos, demais perícias feitas ao longo do processo, depoimentos de testemunhas, além da versão apresentada pelo réu.
De acordo com a Defensoria Pública, havia um protesto de moradores desarmados contra abordagens violentas da polícia, já que, segundo testemunha, agentes teriam xingado crianças que brincavam em um campinho de futebol. Com isso, Alessandro atirou tanto para o alto quanto em direção à multidão, atingindo a vítima que passava próximo ao local com a namorada.
Um ano antes do assassinato de Johnatha, em 2013, o mesmo policial militar já havia sido acusado de triplo homicídio na Baixada Fluminense. Alessandro Marcelino chegou a ser preso, mas teve seu caso impronunciado e voltou à ativa.