Rio - Pais de alunos do Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CAp-UFRJ), na Lagoa, Zona Sul do Rio, alegam que têm tido críticas de mais e respostas de menos, por parte da direção da escola, sobre problemas de longa data que afetam a unidade. As adversidades - muitas registradas em fotos e vídeos pelos estudantes - vão de infiltrações a falta de água, passando até por comida estragada no bandejão. A consequência, claro, é um comprometimento na qualidade do ensino.
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"Certamente ocorre um impacto na qualidade do ensino, fora a segurança dos alunos", afirma Marcelo Câmara, pai de uma aluna do 2º ano do Ensino Médio, a O DIA.
Ambiente 'perigoso e insalubre'
O advogado, de 52 anos, diz que seu maior medo é que o prédio tenha que passar por uma interdição da Defesa Civil, devido à péssima infraestrutura do local. Segundo ele, o cenário se agravou neste ano, passando a ser "perigoso e insalubre".
A psicóloga Flávia Roma, 49 anos, mãe de outro aluno do 2º ano do Ensino Médio, corrobora com Marcelo ao exemplificar a falta de condições seguras e saudáveis com a qual os estudantes convivem no dia a dia: "Muro caindo, infiltração na sala, ar condicionado quebrado nesse calor, falta de água...".
Já a técnica em radiologia Danielle Moraes, de 48 anos, mãe de uma aluna também do 2º ano do Ensino Médio, cita uma outra dificuldade que impacta diretamente no aprendizado da menina e dos colegas: "A sala dela está com as janelas quebradas, e a incidência dos raios de sol atrapalha bastante a visibilidade dos alunos, além de causar desconforto em quem senta perto da janela. Minha filha já me pediu para intervir em sua saída mais cedo das aulas por fortes dores de cabeça".
Danielle também faz um relato sobre infiltração: "Na sala de aula também do segundo ano, tem, além de inúmeras goteiras, queda de reboco do teto e forte cheiro de umidade".
Em manifesto, o Grêmio Estudantil CAp-UFRJ descreve, dentre outros obstáculos, a falta de capacidade da unidade para atender à quantidade de matriculados: "O número de salas disponíveis na escola não atende à demanda de aulas à tarde, e muitas turmas ficam sem salas próprias para as aulas. Duas salas do CAp têm sido utilizadas pela educação infantil há dois anos, desde que o prédio deles caiu".
O problema se estende ao bandejão: "A comida é racionada e, muitas vezes, mal distribuída, o que acaba fazendo com que falte para alguns alunos. No dia 24/03, a comida do bandejão chegou estragada. Os alunos relataram que o arroz estava azedo e, de longe, já exalava um cheiro ruim. As aulas da tarde precisaram ser canceladas".
Falta de respostas
Tão incômodo quanto os transtornos gerados pela estrutura precária parece ser a ausência de explicações. Marcelo ressalta a importância do diálogo junto ao Colégio de Aplicação: "A ideia não é jamais nos opor à gestão do CAp, mas, sim, que ela sirva de apoio para auxiliar nas reclamações ou solicitações junto à mantenedora".
Danielle Moraes demonstra compreensão com burocracias, mas destaca que certas questões persistem há um tempo suficiente para que já estivessem resolvidas: "Entendemos que a direção nada pode decidir sozinha, e por se tratar de uma escola federal, essas respostas muitas vezes demoram. Mas ainda assim, a questão do muro e dos aparelhos de ar condicionado já se arrastam desde 2024. Impossível que ninguém olhe para a situação dos nossos jovens".
Flávia Roma desabafa: "Enfrentamos muita burocracia para poder ter qualquer retorno, que, mesmo assim, é ineficaz. Muito difícil".
Nem mesmo uma carta, assinada por 20 pais e mães e enviada na sexta-feira (21), relatando tais inconvenientes e pedindo providências, foi capaz de obter uma justificativa. O documento fala em "lamentável realidade" e "ambiente não salutar" tanto para alunos, quanto para professores.
Diante da falta de respostas da direção, os responsáveis estão organizando uma manifestação para quinta-feira (27), no campus do Fundão, onde fica a reitoria da UFRJ. O ato visa à cobrança de providências para garantir condições mínimas de infraestrutura no colégio.
Falta orçamento
À reportagem, a UFRJ alega recursos abaixo do necessário para manter suas estruturas em condições adequadas. Por nota, a universidade informa que a verba recebida caiu quase pela metade nos últimos 12 anos. Em 2024, o orçamento de R$ 392 milhões foi considerado "insuficiente para garantir o pleno funcionamento da instituição".
Para este ano, a previsão orçamentária é de R$ 423 milhões, um valor "ainda muito abaixo das necessidades da UFRJ". Segundo o setor, somente as despesas com água, energia, limpeza e segurança devem consumir 54% desse total.
A UFRJ acrescenta que o CAP tem se empenhado em solucionar os danos estruturais, e que "não houve qualquer tipo de agravamento dos problemas na última semana".
Sobre alguns dos transtornos mencionados por responsáveis e alunos, a instituição garante que a reconstrução do muro está em viabilização; os climatizadores "são novos e demandam melhorias no atual sistema elétrico, o que está sendo providenciado"; e que "não há ocorrência de goteiras ou falta d'água na unidade.
Como a UFRJ mencionou questões relacionadas a corte de orçamento, a reportagem também procurou o Ministério da Educação, que enfatiza um trabalho para "recompor e/ou mitigar as reduções orçamentárias" de instituições federais de Ensino Superior.
O MEC atribui a deterioração da infraestrutura da UFRJ, e de outras universidades federais, a gestões anteriores, que teriam reduzido "drasticamente os valores para manutenção das instituições federais de ensino superior". O ministério afirma que os cortes começaram em 2016, ou seja, ano do último mandato do PT, com Dilma Roussef, antes do atual, de Luiz Inácio Lula da Silva.
A nota segue lembrando que universidades federais têm liberdade para definir as próprias prioridades a fim de atender a necessidades e diretrizes institucionais.
No caso específico da UFRJ, o ministério frisa que a universidade, por meio de tal autonomia, está em processo de alienação (transferência de propriedade) de imóveis "que não afetam as suas atividades finalísticas de ensino, pesquisa e extensão" com o objetivo de captar e destinar recursos "às demandas de infraestrutura da instituição".
*Reportagem do estagiário Rômulo Aguiar, sob supervisão de Thiago Nunes
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