Vacina contra a gripe está sendo oferecida das 8h às 17h nas 233 unidades de Atenção Primária do município - Bruno Campos/Arquivo Secom PMM
Vacina contra a gripe está sendo oferecida das 8h às 17h nas 233 unidades de Atenção Primária do municípioBruno Campos/Arquivo Secom PMM
Por Thiago Gomide
Vez e outra escuto alguém defendendo que a história é cíclica.
Aconteceu, passa um tempo, novas cores surgem e temos, como diria Cazuza, um "museu de grandes novidades". 
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Debater vacinação é um bom exemplo, citariam alguns. 
Em 1904 o Rio de Janeiro, então capital do país, parou por causa da hoje conhecida Revolta da Vacina. 
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O que significa isso?
Vou explicar, mas antes sinta um pouco do clima daquela época:
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A Revolta da Vacina envolve conspiração, desconhecimento de parte da população, fake news, presidente do país ameaçado de golpe, briga entre militares, políticos se aproveitando da instabilidade, capoeirista com pistola e navalha liderando a resistência popular, canhão em barricada na Gamboa, chance da cidade ser bombardeada, cientista famoso sendo debochado e agredido, mortos e um monte de presos enviados para o Acre.
Respirou? 
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O Rio de Janeiro, capital e vitrine do país, era simplesmente conhecido como o túmulo dos estrangeiros. Bateu aqui, morreu. 

Doenças aos montes. Exemplos: febre amarela, peste bubônica e varíola.

A cidade era imunda. O povo sem hábitos de higiene. As moradias eram apertadas. Muitas pessoas sem ventilação, sem tratamento de esgoto. Descaso do poder público. 
"Eu vejo o futuro repetir o passado", berraria novamente Cazuza. 
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Voltando. 

Naquele começo do século XX, o país vivia um período complicado nas finanças. Muito desemprego. Faltava educação. Moradia. Inflação altíssima.

Por ser sinônimo de morte, menos estrangeiros investiam aqui.

O cientista Oswaldo Cruz, que passou um tempão na França, foi convidado pelo presidente Rodrigues Alves  para afastar os problemas de saúde. Era como se fosse o ministro da Saúde da época. 
Fácil, não? 
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Na cabeça de Oswaldo Cruz era preciso atacar tudo. Reforma geral. Doa a quem doer.

O presidente Rodrigues Alves e o prefeito do Rio de Janeiro Pereira Passos deram carta branca. E carta branca era carta branca. 
Oswaldo Cruz apresentou alternativas diferentes para atacar os problemas de saúde.

Contratou caçadores de ratos, entrou nas casas com um exército de matadores de mosquitos e por aí segue.

E para acabar com a varíola, ele bateu na mesa e decidiu promover uma vacinação obrigatória. Não teria chance de dizer não.

Com apoio de diversos políticos, uma lei foi feita.

Se por acaso alguém burlasse, algumas das consequências eram: não poderia se matricular em escolas, não poderia viajar, não poderia casar...
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Ação e reação.
Pense em várias pessoas berrando “Abaixo a Vacina”, “Abaixo a Vacina”, “Abaixo a Vacina”.

A praça Tiradentes virou palco para protestos – e futuramente de conflitos.

Diversos lugares da cidade, a partir do dia 10 de novembro de 1904, começaram a vivenciar cenas e mais cenas de violência.

Porradaria, no melhor português.

Eram pessoas que não queriam a vacinação obrigatória. Outras que achavam que era impuro. Algumas usavam a religião como desculpa. Outras desconheciam os resultados. Muitas pessoas protestaram porque foram induzidas politicamente. Outras porque caiam em fake news...e, claro, havia quem desejava tomar o poder. 

No boca a boca maldoso, induzia-se a ideia de que a vacinação era para infectar e não salvar.

O clima tenso na cidade foi crescendo, crescendo, crescendo...

A casa de Oswaldo Cruz, na Voluntários da Pátria, em Botafogo, foi apedrejada. A família teve que sair do Rio.

Dois lugares ficaram marcados pelos tiros e bombas: a rua da Passagem, também em Botafogo, e o bairro da Gamboa.

Confusão política é uma beleza para oposição.

Com o Rio em chamas, com a capital sendo chacoalhada, nada melhor que tentar um golpe.

Foi o que pensou e articulou o trio formado pelo senador Lauro Sodré, o deputado Alfredo Varella e o general Silvestre Travassos.

Aliados ao presidente do Brasil até indicaram que ele deveria se afastar da capital, liderar a resistência de um navio. Rodrigues Alves disse que não sairia do Palácio do Catete.

Sob liderança de Travassos, na noite do dia 14 de novembro, cerca de 300 cadetes saíram da praia vermelha, da Escola Militar, na Urca, e foram marchando até o Palácio do Catete.

Quando o grupo estava passando pela rua da Passagem, em Botafogo, uma surpresinha apareceu.
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Ação e reação, lembra? O Governo preparou uma contraofensiva.

O general Antônio Carlos de Piragibe organizou piquetes. A força Pública entrou em choque com os revoltosos.

Vários feridos. Dos dois lados.

Lauro Sodré e Travassos, que morreu dias mais tarde, foram atingidos.

Naquela mesma noite, lanchas e até um encouraçado ameaçaram destruir as instalações militares na Urca. Um bairro do Rio seria torpedeado. 

Na Gamboa, civis organizaram um levante para impedir que a vacinação fosse feita.

Gamboa era um bairro com muitas pessoas vindas da Bahia, muitas pessoas do candomblé...

A vacinação era também uma forma de agressão religiosa.

Soma-se isso, esse detalhe, a tudo que já disse.

Na querida Gamboa o bicho pegou feio.

Na liderança um capoeirista chamado Prata Preta. Andava com revólver, navalha...

Eram centenas de pessoas. Centenas de homens e mulheres dizendo não à vacina. 

A barricada ganhou o nome de Porto Arthur.

Há vertentes históricas que defendem que havia até canhão.

Outras vertentes vão defender que havia um objeto que imitava o som de canhão.

De qualquer maneira, na dúvida, corria-se. 

Nos conflitos com a polícia, com militares do Exército, Prata Preta chegou a matar um militar.

Foi muito complicado quebrar aquela barreira. Parecia impossível.

Só depois de dias de conflitos, de vários feridos e ameaças de bombardeios por parte do exército, da marinha...que o clima foi amenizando.
A Revolta da Vacina durou principalmente do dia 10 ao dia 16 de novembro, com fatos ainda acontecendo até o dia 18 de novembro.

Saldo: 30 pessoas morreram, mais de 100 feridos e mais de 900 foram em cana.

Centenas de presos, inclusive Prata Preta, foram enviados ao Acre, conhecido na época como Sibéria Tropical.

Ninguém sabe o fim do capoeirista.

Entre 1896 e o fim da década de 1970, mais de 300 milhões de pessoas morreram de varíola.

Por causa da vacinação, a varíola, ainda bem, foi erradicada em 1980.

A atuação de Oswaldo Cruz foi fundamental para que houvesse melhoras na saúde do Rio de Janeiro e do resto do país.
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Segundo a Organização Mundial da Saúde, mais de dois milhões de pessoas morrem anualmente por doenças que poderiam ser evitadas por vacinas.

Aqui no Brasil, está havendo queda na busca por vacinas contra Sarampo, por exemplo.

A FioCruz, Fundação Oswaldo Cruz, e a própria OMS defendem que a não vacinação é um dos maiores problemas atuais quando pensamos em saúde pública.

Parece que estamos em 1904...
Daqui a pouco voltam com as barricadas.
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O tempo não para. 
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Quer saber mais sobre Prata Preta?
Fiz um vídeo contando detalhes do capoeirista. 
 
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Vacina no Brasil 
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A vacina chegou ao Brasil em 1804, trazida pelo Marquês de Barbacena.
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Varíola e vacinação 
A varíola foi a primeira grande epidemia enfrentada pela vacina. Isso na Inglaterra em 1798.

Mais de 100 anos depois e nós no Brasil estávamos sofrendo.
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Mais de 200 anos depois e nós ainda debatendo a eficácia da vacinação. 
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Vacina americana, russa, chinesa, brasileira, extraterrestre 
Os trâmites científicos são elaborados e, por consequência, levam tempo. 
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A vacina para se tornar realidade atravessa várias etapas. 
A imprensa costuma publicar que há três fases.
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Dentro dessas fases há outras diversas fases. 
As validações também encontram os olhares criteriosos das comunidades cientificas de muitos países. 
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Quando não há base, sobram críticas. Afundam-se "pesquisas". 
É assim há mais de 200 anos.  
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Bom deixar isso claro. 
E que venha logo uma vacina testada e com aprovação dos órgãos competentes para que a gente se livre desse mal.