Os casamentos eram arranjados. Na maioria das vezes não havia liberdade para escolher o par.
E foi isso que aconteceu com a Chiquinha, que era filha de um militar branco com uma negra, ex-escravizada.
Mesmo não tendo altíssimos recursos, o pai dispôs para Chiquinha aulas particulares, inclusive de música. Estava preparando a menina para um futuro brilhante ao lado de alguém nobre.
Com 16 anos ela foi forçada a casar com Jacinto do Amaral. Ele também era militar, comandante da Marinha mercante.
Chiquinha, inclusive, teve que acompanhá-lo na Guerra do Paraguai, levando pessoas escravizadas, armas e soldados.
Jacinto não aceitava de maneira alguma que a esposa desenvolvesse a habilidade musical. "Ou o casamento ou a música", teria deixado claro.
Eles já tinham três filhos quando ela resolveu meter o pé. Nada iria impedi-la de viver com a música.
Foi um choque para todo mundo. A sociedade não esperava aquilo. Todos julgavam.
A guarda das crianças foi para o... pai.
Com 30 anos, ela casou novamente. João Batista de Carvalho era o nome do rapaz. Durou pouco. Chiquinha foi traída e decidiu abandoná-lo.
Não davam a guarda para uma mulher separada.
Chiquinha dava aulas de piano, mas era duro pagar as contas. Os pais dela não queriam saber. Imagina mulher separada duas vezes, sobrevivendo de música, sem guarda dos filhos.
Joaquim Antônio da Silva Callado, que era um super famoso flautista, ajudou demais Chiquinha a entrar nas rodas artísticas do Rio de Janeiro. Foi um tipo de anjo inesquecível.
Não há como impedir um tufão, escrevem alguns em dicas de autoajuda. Vale para a maestrina.
Depois de "Atraente", foi uma sequência de obras bem realizadas.
Chiquinha musicou peças teatrais, compôs óperas, junto do Callado foi uma das inventoras do choro e até organizou projetos musicais para o povo.
Contra a escravidão, Chiquinha foi um dos mais importantes nomes na luta pela abolição. Ela chegou a vender partituras para arrecadar grana.
Com o dinheiro, Chiquinha ajudou a Confederação Libertadora e comprou a alforria do Zé da Flauta, que era um super músico.
Ela era tão inovadora que a imprensa não sabia nem como chamá-la. Qual é o feminino de maestro? Ela foi a primeira mulher a reger uma Orquestra no Brasil.
Houve quem negasse a autoria das primeiras composições. Houve quem duvidasse que ela era capaz. Mas também houve quem copiasse.
Uma pianista, que era parecidinha, não é que falava que era própria? Conseguiu se apresentar e tudo em cafés pela cidade. Descolou um dinheiro dessa maneira.
Chiquinha morava no Andaraí. Pertinho do carnaval de 1899, ela compôs a marcha rancho “Ó Abre Alas".
Era uma inspiração e uma homenagem ao cordão Rosa de Ouro, vizinho dela. O carnaval era marcado pelos ranchos e pelos cordões.
Foi um estrondo. Até hoje vários bloquinhos tocam. Há quem defenda que o festejo só se inicia quando "Ó Abre Alas" surge.
A música de Chiquinha Gonzaga mexeu com as estruturas de poderosos do império e da república.
No conturbado governo de Floriano Peixoto (de 1891 a 1894), ela fez uma canção criticando o presidente. Resultado: foi presa.
No governo do Hermes da Fonseca, a primeira-dama Nair de Teffé abriu os salões do palácio do Catete para o som popular de Chiquinha. Resultado: protestos no Senado e na Câmara de deputados.
Chiquinha fundou a Sociedade Brasileira de Autores Teatrais, a SBAT, em 1917. Era a semente para a luta pelos direitos autorais.
Ela assinou cerca de 2000 mil composições.
Chiquinha Gonzaga morreu perto do carnaval de 1935. Morreu escondendo um romance secreto. Quando tinha 52 anos, se apaixonou por um jovem de 16. Viveram juntos. Para todos, ela defendia que o rapaz era um filho adotivo.
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Piano da Chiquinha Gonzaga
A maestrina Chiquinha Gonzaga vivia no Theatro Municipal.
O piano dela está exposto lá.