Cesário Melantonio Neto
Cesário Melantonio NetoDivulgação
Por Cesário Melantonio Neto
O governo que aumentou o desmatamento na Amazônia em 54% em dois anos e destruiu, no mesmo período, um terço do Pantanal, recebeu agora, na Cúpula dos Líderes sobre Clima, o desprezo e a desforra globais. Por ter-se recusado a sediar a Conferência do Clima, por ter mandado Angela Merkel "reflorestar a Alemanha", por negar a existência de queimadas a atual administração alienou o Brasil das grandes decisões internacionais sobre a agenda ambiental.
A tentativa de vender uma narrativa falsa na Cúpula não convenceu nem gregos, nem troianos. Um palavrório vazio de conteúdo e recheado de inverdades e falsidades não convenceu nenhum líder mundial. As palavras não correspondem aos fatos.
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A meta de desmatamento que o país tinha inscrita em lei para 2020 - 3.925 km² - foi perdida em 180% por Bolsonaro, que terá de responder no Supremo Tribunal Federal (STF) por esse descalabro. O acordo de Paris convidou todos os signatários a apresentar uma estratégia de longo prazo de descarbonização no meio do século, mas o Brasil nunca elaborou nenhuma estratégia.
A promessa de "duplicar os recursos" para a fiscalização ambiental parece estranha para um Ministério do Meio Ambiente que paralisou o Ibama e o ICM-Bio, apesar de ter meios financeiros disponíveis para as operações de controle. As multas ambientais por crimes contra a natureza diminuíram em 2020 a seu menor nível desde 2003. Quanto ao desmatamento, teve o maior crescimento desde 2003.
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A comunidade internacional já pôs o Brasil para escanteio e dificilmente vai aceitar um discurso vazio, inverídico e negativo sobre a preservação ambiental se persistirmos em ir na contramão da História. O fato de o Brasil ter discursado depois da Argentina, Indonésia, Bangladesh, e Ilhas Marshall não foi por acaso na Cúpula dos Líderes para o Clima. O presidente norte-americano se ausentou no momento da fala de Bolsonaro sinalizando a marginalização brasileira. A desconfiança com relação ao nosso país não se reduziu após a participação brasileira.
O apagão na política ambiental do Brasil nos últimos dois anos e quatro meses não vai desaparecer sem uma mudança radical nas políticas do Ministério do Meio Ambiente. Mas, essa correção de rumos mais se assemelha a promessas vazias que ficam no papel.
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As cobranças internacionais por ações a curto prazo, 2021 e 2022, vão se intensificar contra Brasília, que está na defensiva no xadrez ambiental e destoa da nova ordem global. O discurso contra o globalismo - característico desta administração no Planalto - terá de ser revisto sob pena de eventuais sanções futuras pela destruição proposital da Amazônia e do Pantanal.
A questão fundamental para o Itamaraty é a reinserção global para reocupar o espaço perdido de respeito, credibilidade e responsabilidade que tivemos por décadas de atividade diplomática. Para recuperar o papel relevante que tivemos na agenda ambiental global, a proteção concedida a madeireiros, garimpeiros e fazendeiros que atuam ilegalmente na Amazônia e no Pantanal, tem de terminar no menor prazo possível.
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A geopolítica verde será fator fundamental para uma melhor inserção internacional e a questão climática vai adquirir cada vez maior importância. A atual visão de Brasília dificulta o papel do país nessa nova geopolítica verde e nos faz perder espaço nessa luta por protagonismo na diplomacia ambiental.
Caso contrário, nos arriscamos a ficar fora da nova ordem global. O posicionamento brasileiro na cúpula não convenceu ninguém e agravou a insatisfação com a falta de mudança na narrativa por Brasília. Afinal, o Brasil sempre foi líder na agenda ambiental, mas perdeu essa posição nos últimos 28 meses. Em apenas um ano o país aumentou o corte de árvores em 216%. As promessas de Bolsonaro não sensibilizaram a opinião pública internacional porque as palavras não correspondem aos fatos.
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A recuperação da confiabilidade vai levar tempo para reparar o desastre ecológico na Amazônia e Pantanal e retirar o país da lista de canalha ambiental. O Brasil saiu da Cúpula em descrédito pois cortou R$ 240 milhões do Ministério do Meio Ambiente. Até a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), em novembro, na Escócia, cada ação do governo, no tocante ao meio ambiente brasileiro, será seguida pelos participantes da Cúpula que são bem informados sobre a distância entre o que disse o Planalto e a realidade ambiental no Brasil.
Para dar início a um processo de reversão de expectativas sobre a política ambiental brasileira poderíamos, por exemplo, usar os quase R$ 3 bilhões paralisados no Fundo da Amazônia, porque o governo não quer investir em ações que reduzam o desmatamento, para demarcar terras indígenas, controlar grileiros e apoiar a atividade de desenvolvimento sustentável.
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