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A mentira, infelizmente, é uma arma poderosa. O Brasil inteiro viu o presidente imitar diversas vezes, de forma sádica e jocosa, uma pessoa com falta de ar durante a pandemia, no momento da crise de oxigênio em Manaus. Por irresponsabilidade do governo Bolsonaro, vários brasileiros morreram sem acesso a oxigênio e o responsável direto por isso ousou debochar da dor e ridicularizar o sofrimento alheio. Talvez tenha sido a mais cruel manifestação desse cidadão que, certamente, não é uma pessoa que possui qualquer resquício de solidariedade, de empatia e de humanidade. Só um monstro, desprovido de caráter, age com tal desfaçatez.

Agora, perguntado no 'Jornal Nacional' o porquê de ter feito tal gesto, ele simplesmente negou. Mentiu descaradamente! E logo adiante ainda acusou o apresentador de estar criando fake news. Ou seja, a realidade não tem nenhuma importância para o mentiroso, pois ele é capaz de criar um mundo paralelo e viver de acordo com suas fantasias. E, o pior, tem uma boa parcela da população que aplaude a inverdade e considera que negar o óbvio é uma estratégia inteligente e deve ser respeitada. Esses são cúmplices de uma farsa que destrói o Brasil e que fez o fascismo ser instalado na sociedade. Um inacreditável número de crápulas encontrou eco para viver de acordo com as mentiras, as fake news e o deboche.

Esse é um desafio que enfrentamos nestas eleições: como debater com quem não tem escrúpulos? Qualquer cidadão, com um pingo de dignidade, teria vergonha se fosse pego numa mentira, ainda mais se o fato fosse desabonador. Mas como agir se o seu interlocutor for alguém completamente desprovido de qualquer preocupação com a verdade? Se for alguém que faça do falso a própria razão de existir? Eu nem estou dizendo da falta de formação intelectual, da falta de inteligência e da completa obtusidade que limitam qualquer diálogo. Questiono-me sobre como é debater com quem não conhece nenhum limite ético e não possui nenhum parâmetro de lealdade com os fatos e a realidade.

Eles nem se sentem ridículos, pois, para chegarem a tanto, teriam que ter, minimamente, a noção do ridículo. Ao contrário, se gabam da ignorância e se jactam de serem espertos nos seus não limites. Esse é um desafio que tem que ser enfrentado. Nas últimas eleições, criaram uma fake news que parecia ridícula de tão absurda: o execrável kit gay. À época, em 2018, pesquisas indicavam que 84% dos eleitores do Bolsonaro acreditavam que ele existia. Ridículo. Absurdo. E espalharam a mentira largamente, sem pudor e sem pejo. Pois não é que agora, quatro anos depois de amplamente desmontada a farsa burlesca, as pesquisas indicam que parte dos bolsonaristas ainda acredita que o kit gay é verdadeiro!

Como enfrentar esses seres repugnantes que vivem em um mundo teratológico? A não verdade é uma opção desse grupo que se reproduz como erva daninha. A mentira alimenta o fascismo que, por sua vez, se fortalece com a ignorância e com o lado obscuro e deformado dos que não têm qualquer compromisso com os valores humanistas. A sarjeta é o ambiente natural desses tipos estranhos e que parecem crescer com a dor alheia. O ódio é o combustível que fortalece esse bando que vive em função de um projeto de poder pessoal.

Não interessa o Brasil, não importam as 33 milhões de pessoas passando fome, os milhões de desempregados, ou mesmo os 500 mil morando nas ruas. São apenas números que não sensibilizam. Se sequer a morte de um semelhante, asfixiado pela falta de ar, conseguiu comover o Presidente da República - que, ao contrário, fez troça com o sofrimento alheio -, o que esperar dos fascistas na campanha para se manterem no poder?

Viveremos um período eleitoral perigoso, violento e sem limites éticos ou morais. A primeira vítima é sempre a verdade e nós devemos nos preparar para um duro embate. O país, que hoje é visto com perplexidade pela comunidade internacional, não suportará mais 4 anos de mediocridade, de falsidades e de engodos. A mentira não pode continuar a governar nosso destino.

Fiando-nos em Clarice Lispector: “Criar sim, mentir não. Criar não é imaginação, é correr o grande risco de se ter a realidade.”

* Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay