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Mas é sofrido constatar que há um amontoado de idiotas que resiste a aceitar o curso normal da democracia. Figuras patéticas que saúdam ideias retrógradas e fascistas bem como insistem em envergonhar o país diante das posturas ridículas e insanas. Em Sergipe, uma multidão de imbecis aclamou e prestou honras militares a um caminhão com as provas do Enem por acharem que lá havia fuzis e armamentos para derrubar o governo eleito. E receberam o veículo com uivos de “aleluia” e “glória ao senhor”. O país virou um manicômio a céu aberto.
E, em nome de uma pretensa paz religiosa, eles pregam a violência, a agressão gratuita e a ofensa banal. Existe um pequeno, mas barulhento, grupelho de pessoas com baixíssima densidade intelectual que resolveu assumir o ridículo como norma de agir. E se lambuza do direito de serem medíocres e vulgares. Relembro Pessoa, no Livro do Desassossego, “Sei que falhei. Gozo a volúpia indeterminada da falência como quem dá um apreço exausto a uma febre que o enclausura.”
É fácil constatar o maniqueísmo barato que os dois neurônios, que presidem esse grupo acéfalo, sustentam. Com um Executivo corrupto, incompetente, inepto e sem nenhum programa de governo e um Legislativo cooptado, em sua grande maioria, pela influência dos orçamentos secretos e dos conluios inescrupulosos, a institucionalidade do Brasil só se manteve pela força constitucional e a coragem cívica do Poder Judiciário.
Por mais que eu, em tempos de normalidade democrática, critique o Poder Judiciário por ser machista, patrimonialista e defensor dos direitos da elite e toda a tradicional ladainha, é necessário reconhecer que é esse Judiciário, especialmente o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, que assegurou a estabilidade democrática. O país deve aos seus ministros a manutenção da nossa institucionalidade. E é exatamente em função da postura democrática de respeito à ordem constitucional que esse bando de celerados se insurge contra os membros do Poder Judiciário.
O país precisa superar esse momento de treva. Já é tempo de enfrentar, com a dureza necessária para a defesa da Constituição, os movimentos afrontosos que se perpetuam nas ruas. A agressão violenta e animalesca aos ministros do Supremo exige uma pronta resposta com a punição dos covardes. A proposta aventada por um ex-chefe do Executivo - de fazer uma pacificação com o grupo fascista, até com o aproveitamento do líder dessa facção que preside o país -, é indecorosa e até injuriosa aos milhões de brasileiros que perderam entes queridos na pandemia pela irresponsabilidade do presidente Bolsonaro e do seu bando. E que acompanharam o cinismo, o deboche e a maldade como método de agir do presidente.
Há uma sugestão, ridícula, desculpe, de fazer um governo de coabitação com esses canalhas e outra de uma anistia tácita para os que saquearam os cofres e a dignidade dos brasileiros. Em qualquer dessas hipóteses, estaremos alimentando e acalentando a volta do fascismo e a falência de uma hipótese civilizatória. Seria o caos. O fim de uma chance de resgatar o Brasil.
O filme “Argentina, 1985” nos mostra, com pungente realidade e que nos leva às lágrimas, a necessidade de punir os torturadores e os assassinos. Enganam-se os que pretendem ter a legitimidade de perdoar os crápulas em nome dos que sofreram a barbárie. A ninguém pode ser delegado o direito de passar uma borracha na história. Não se apagam os abusos e não se escamoteia a verdade. Só sairemos do fosso que o fascismo nos jogou se enfrentarmos com a aplicação exemplar as normas penais e constitucionais contra o saque a que o Brasil foi submetido.
Erramos ao não encarar os fantasmas da ditadura e não podemos repetir o erro. Necessário derrotarmos, até a lona, esses fascistas que se posicionam como donos do Brasil. Qualquer capitulação neste momento será como estimular o germe do fascismo e da não civilidade. Será um acumpliciamento com o grupo que usurpou a legitimidade democrática.
Quem não se opuser estará assumindo um lado; não pode existir a hipótese de passividade diante da esculhambação institucional a que o Brasil foi e está sendo submetido. É hora de darmos um passo à frente e voltarmos a ter um país de volta, até para dar uma chance ao futuro. Sem nos esquecer de Cecília Meireles: “O rumor do mundo vai perdendo a forçam, e os rostos e as falas são falsos e avulsos. O tempo versátil foge por esquinas de vidro, de seda, de abraços difusos.”
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay
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