Eu nunca fiz política partidária, mas sempre acompanhei com atenção tudo o que ocorre no Brasil e no mundo. Aprendi que, em regra, o resultado das eleições indica o rumo que os países assumirão e isso influencia, no dia a dia, a vida do cidadão. Uma eleição que confronte grupos distintos, mas com sólidas bases democráticas, nós acompanhamos, nos envolvemos, porém, ganhando ou perdendo, a vida segue o fluxo normal. É até salutar que os países vivam a alternância de propostas diferentes no comando da nação. Por isso, a vitória do Fernando Henrique em 1994 e 1998, que consolidou Lula na oposição, ou a do Lula em 2002 e 2006, que colocou o PSDB na linha de contraponto, em nenhum momento causou abalo democrático.
É evidente que determinada proposta para a condução do país pode dar o tom claro e preciso para os caminhos na economia, na saúde, nas relações de trabalho, nas conquistas sociais, até mesmo nos costumes. E é natural que a oposição se porte com veemência, o que acaba fomentando o bom debate. Exatamente nesse embate que são forjadas e fortalecidas as bases para um estado democrático de direito. E as tensões naturais do debate político só servem para alimentar o espírito plural que deve nortear uma sociedade madura.
Com apreensão e tristeza constato que essa não é a realidade da eleição entre Lula e Bolsonaro. Quando comecei a escrever, há mais de ano, que esta eleição decidiria entre a barbárie e a civilização, confesso que usava um pouco a licença poética permitida aos escritores. Porém, o tempo cuidou de mostrar como o governo Bolsonaro, representado pelo Presidente e seus asseclas, e a grande massa bolsonarista reúnem em si, na essência, todas as hipóteses de dar cabo às conquistas civilizatórias acumuladas em décadas.
Em 4 anos de desgoverno, Bolsonaro implementou quase tudo que se esperava de um governo autoritário e medíocre, à feição deste Chefe de Estado. Desconstruiu as principais áreas para poder fortalecer o seu projeto totalitário. Saqueou o país. Desde a educação, com reiterados cortes de verba e desmonte das universidades, até a saúde, a ciência, tudo, enfim. E implantou a política do ódio, da divisão da sociedade, do culto banal à vulgaridade, à mediocridade, à violência. Conseguiu aflorar em boa parte dos brasileiros um tipo que ainda não tinha sido observado pelos cientistas políticos ou sociólogos: o ignorante autossuficiente. O que se jacta de ser imbecil. O que tem orgulho de ser agressivo e inculto. Um ser escatológico que, certamente, terá que ser estudado para entendermos o Brasil.
Entender que esse projeto de poder bolsonarista passa por esse esgoto, de onde emergem seres teratológicos, é o primeiro passo para enfrentar o obscurantismo. A angústia que deve nos acompanhar na hora do voto no próximo domingo, 30 de outubro, é o que resistirá, em termos humanísticos, a esse projeto de dominação pelo terror, caso o Bolsonaro seja reeleito. O que será do Brasil? Seria imaginar toda uma geração de crianças e adolescentes sendo criada envolta por uma densa nuvem que sufoca e turva a visão, com os valores da mentira como política de afirmação do individualismo vulgar, do moralismo hipócrita, do sadismo ao olhar o outro com total falta de empatia, da violência substituindo a educação e o debate. Pense nisso na hora do voto. Vote por você, mas também pelos nossos filhos e netos. Enfim, dê uma chance ao Brasil. O mundo civilizado agradece.
Lembrando o matuto Manoel de Barros: “A palavra amor anda vazia. Não tem gente dentro dela.”
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.