Martha Rocha é cria da Penha, no subúrbio carioca. Advogada, formada pela Faculdade Nacional de Direito (UFRJ), trabalhou como professora primária e inspetora de polícia. De 2011 a 2014, foi a primeira mulher a comandar a Polícia Civil do Estado, onde construiu a Cidade da Polícia, intensificou a prevenção à violência contra a mulher e ampliou o registro de ocorrência on-line. Deputada estadual pelo PDT, está no terceiro mandato consecutivo. Em janeiro, assumirá a Secretaria Municipal de Assistência Social.
SIDNEY: A situação na Segurança Pública no Estado se agravou e a população está assustada. O que fazer para frear esta escalada?
MARTHA ROCHA: A crise na Segurança Pública está escancarada. A população do Rio vive refém da brutal violência e a cada dia temos um capítulo diferente. São tiroteios, inocentes mortos ou feridos, roubos de carros a qualquer hora e em qualquer lugar, assaltos a pedestre... um descontrole absoluto do governo do Estado. Enquanto isso, não há nenhuma ação para mudar o cenário. O que é de competência do Legislativo, eu contribuo. Pedi urgência na votação do projeto de lei 3969/18, de minha autoria, que estabelece a Política Estadual de Segurança Pública e Defesa Social. A proposta está em análise há quase um ano na Comissão de Segurança Pública da Alerj. O PL possibilita um planejamento de estratégias e políticas públicas de enfrentamento à criminalidade, prevenção à violência e integração entre várias instituições. É um desdobramento do Sistema Único de Segurança Pública, do governo federal, que já está valendo.
Há um crescimento descontrolado das milícias. Como o município do Rio pode ajudar no combate a esse tipo de crime?
Já tem alguns anos que a milícia mudou de cara. Ela continua roubando, matando, torturando, mas também se tornou empreendedora. A expansão e exploração imobiliária são hoje um dos principais braços financeiros dessas organizações, que ainda atuam no comércio e até em farmácias. São nesses pontos que a Prefeitura pode colaborar, por exemplo, fiscalizando e derrubando as construções irregulares, monitorando licenças e documentações. Lembrando que o papel principal de garantir a Segurança Pública é do Estado.
Por que a senhora tem dito que o efetivo das polícias Civil e Militar é um dos grandes problemas da Segurança?
Porque simplesmente não há agentes o suficiente para dar conta da criminalidade. Quando eu assumi o comando da Polícia Civil, em 2011, havia cerca de 8 mil agentes. Fiz o maior concurso público da história da instituição e quando eu saí, no início de 2014, eram 11 mil policiais. Hoje, a Polícia Civil tem aproximadamente 6 mil, efetivo menor do que o da Guarda Municipal, que trabalha só no município. Na PM, a situação também é difícil. Dos 42 mil PMs da ativa, apenas 52% estão no policiamento ostensivo. O déficit é de mais de 17 mil policiais. Ou seja, a conta da Segurança Pública não fecha! E esse problema pode ser resolvido. Basta o governo convocar os concursados das Forças de Segurança que aguardam chamamento.
A saúde das finanças do Estado tem merecido atenção dos deputados estaduais. Por que o remanejamento de R$ 2,7 bi do RioPrevidência para cobrir gastos com pagamento de dívida do estado com a União a preocupa?
É um completo absurdo. Compromete a saúde financeira do RioPrevidência e coloca em risco o salário de aposentados e pensionistas. A transferência desses recursos para o pagamento de dívidas gerais configura desvio de finalidade. Pedi ao Ministério Público a instauração de um inquérito civil para investigar o decreto do governador Cláudio Castro. Também acionei o Tribunal de Contas do Estado entrando com uma denúncia de irregularidade contra Castro. Pedi a imediata suspensão ou bloqueio dos valores transferidos para resguardar a integridade financeira do fundo e evitar que aposentados e pensionistas fiquem sem pagamento.
A senhora presidiu a CPI da Violência Cibernética contra as Mulheres. Em março, foi apresentado o relatório final com 6 propostas de leis e 60 sugestões de medidas para combater esse crime. O que mais chama sua atenção neste processo?
Foi a primeira vez que uma casa legislativa debateu a violência contra mulheres no âmbito digital. O crime virtual engloba vários tipos de comportamentos abusivos, como assédio on-line, divulgação sem autorização de imagens íntimas (pornografia de vingança), stalking digital (perseguição), ameaças, difamação e chantagem. Situações mais comuns do que imaginamos no dia a dia de muitas mulheres. Infelizmente, há uma cultura de que essas ações não são crimes. É preciso trabalhar na conscientização da sociedade. O relatório final da CPI sugere projetos que vão desde a criação de espaços específicos em delegacias para atender vítimas a campanhas permanentes de divulgação. Também propomos a criação de um subtítulo na Polícia Civil, com a denominação ‘violência cibernética’, para registrar as ocorrências. Só assim será possível fazer estatísticas desse tipo de crime.
A senhora preside a Frente Parlamentar de Combate à Tuberculose da Alerj. O Rio é um dos estados com maior taxa de mortalidade pela doença. Como enfrentar o problema?
Os desafios para a eliminação da doença ainda são inúmeros. Fatores como falta de acesso a cuidados de saúde adequados, pobreza e resistência aos medicamentos contribuem para a persistência da doença, além da demora no diagnóstico. No Estado, os números de casos aumentaram quase 6% de 2022 para 2023. Chama a atenção também dados relacionados ao crescimento de casos novos na população de rua, um salto de mais de 17%, e, na população carcerária, pouco mais de 8%. Sou autora da lei que instituiu a Política Estadual de Controle e Eliminação da Tuberculose, um avanço na tentativa de frear a doença, que deveria estar controlada.
A senhora vai ocupar a Secretaria Municipal de Assistência Social. Quais os seus projetos para a área?
Implementar uma política que ressignifique a vida das famílias atendidas é o principal projeto. A tarefa não será fácil, mas nunca tive medo de encarar desafios. Entendo a área como uma pasta multidisciplinar em que a participação de outras Secretarias do município, do governo federal, dos demais poderes e da sociedade civil é fundamental. Vamos iniciar o "diálogo solidário" e buscar medidas de sucesso para cuidar de quem precisa. Queremos acolher para emancipar.