Por O Dia
Nos 200 anos de sua morte, completados no dia 5 de maio, a discussão sobre seu legado tem provocado enorme polêmica e dividido a França entre os que valorizam seu período e aqueles que o repudiam. Entre esses últimos a maior crítica se deve principalmente ao expansionismo militar e à maneira como Napoleão lidou com as colônias, onde ele restabeleceu a escravidão, que havia sido abolida pela Revolução Francesa em respeito aos preceitos de “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”.
Como não podia deixar de ser nos tempos que correm, a revisão histórica sob a ótica atual chegou a Napoleão. São muitos os que pregam o seu “cancelamento”, para usar a palavra da moda.
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Aqui no Brasil o bicentenário de sua morte passou em branco. Aliás, o mais perto que Napoleão Bonaparte esteve do Brasil, provavelmente, foi durante seus últimos anos de vida, exilado em Santa Helena, uma minúscula ilha isolada no meio do Atlântico, a mais de 3 mil quilômetros de distância de nossa costa.
Mas, mesmo sem nunca ter posto os pés aqui, sua influência na história do país é profunda. A começar que foi por sua causa que a família real portuguesa veio para o Brasil, em 1808, fugindo da invasão do exército francês, que seguia firme na missão de redesenhar os mapas da Europa.
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Aqui chegando, Dom João teve que implantar uma estrutura que reproduzisse a corte e possibilitasse gerir o império português. Fomos, afinal, a única colônia a ser sede de um império. Dom João criou, assim, as primeiras estruturas de estado no Brasil, como a Casa da Moeda e uma imprensa oficial (as prensas eram até então proibidas). Ele também abriu os portos, facilitando o comércio. Com isso foram assentadas as bases políticas, administrativas e sociais para que, com o regresso da corte para Portugal, não fosse mais possível retrocedermos a posição de colônia. Sem o expansionismo napoleônico nossa história teria sido diferente.
No campo do direito e da gestão do estado a influência do imperador francês também foi imensa, como reflexo das mudanças feitas por ele na França. Napoleão modernizou o código tributário, criou o primeiro banco central no mundo, fez uma ampla reforma no sistema educacional, promulgou códigos de Direito Penal, Processual e Comercial.
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Mas sua maior contribuição, admitida por ele mesmo em vida, foi o Código Civil, que ficou conhecido como Código Napoleônico. Essa reforma completa do sistema legal francês, incorporando ideais iluministas e noções de garantias individuais, teve influência direta e profunda no pensamento e na legislação jurídica na França, no Brasil e em diversos países do mundo, principalmente na Europa e nas Américas.
Entre importantes contribuições, o Código Napoleônico aboliu privilégios da nobreza, separou Igreja e Estado, legalizou o divórcio, estabeleceu princípios de propriedade, e de Direito de Família e Sucessão, como herança e transmissão de bens.
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O Código Napoleônico foi revolucionário no conteúdo e na forma. Ele foi escrito com uma preocupação prática, para que fosse acessível, com redação de leis mais claras e precisas.
Incorporou avanços da Revolução Francesa, consolidando a noção de que todos os homens são iguais perante a lei. Suas medidas ampliaram os direitos individuais e estabeleceram as bases do Direito Público, fundamentais para uma democracia. Medidas que, ironicamente, foram implantadas a ferro e fogo, com repressão policial e censura à imprensa e a qualquer crítica. O que não surpreende em um personagem tão complexo, controverso e polêmico.
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Luciano Bandeira é presidente da OABRJ