Titular da Fazenda fluminense, Nelson Rocha ressalta que plano de recuperação não é um projeto unilateralFotos: Luciano Belford

Por PALOMA SAVEDRA
De volta ao comando da Secretaria de Estado de Fazenda do Rio de Janeiro após 19 anos, Nelson Rocha reassume a pasta em um momento delicado das finanças fluminenses. Para elaborar o novo Plano de Recuperação Fiscal, o secretário conta com um trabalho em conjunto de todos os Poderes, além de reuniões constantes com a equipe econômica da União. Sobre a reforma previdenciária, antecipa que o estado poderá adotar duas medidas — o aumento da idade mínima e taxação de inativos — ou apenas optar por uma delas. E ressalta que a escolha não será unilateral do Executivo: terá participação do Legislativo, Judiciário, MP, TCE e Defensoria.
O Estado do Rio já conseguiu aval da União para a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) e agora tem seis meses para entregar o plano. Em que pé está o plano?
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O que foi feito é o aceite para a adesão. Nós temos seis meses para elaborar esse plano, que não é um plano que o estado prepara e entrega. É construído ao longo do tempo. Tem etapas. A primeira etapa é agora, dia 5 de julho. A gente tem que entregar o primeiro passo, que é o diagnóstico da situação fiscal.
No que consistirá esse diagnóstico?
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A gente está finalizando. A rigor é a situação que você encontra em 2020. Nós acabamos de apresentar o relatório do primeiro quadrimestre. Então é o cotidiano, só que num formato já pro regime.
Mas já trará direcionamentos das reformas que o estado fará?
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Não é diagnóstico, só traz o balanço, e o que a gente tem hoje. O plano começa a ser elaborado. Para você ter uma ideia é o esboço do plano, depois você vai discutindo... A gente vai estar entregando no início de outubro. E esse plano será construído com os outros Poderes. A gente tem conceitos que estabeleceremos ao longo do tempo, mas será construído com os demais Poderes (Legislativo e Judiciário) e também com Ministério Público, Tribunal de Contas e Defensoria. A gente está olhando o horizonte, ou seja, é um momento ímpar na história econômica do estado. Em que todos estão emanados, dando as mãos para a gente construir uma solução para o Rio de Janeiro. Não é a solução de um governo. É uma solução para o estado e que vai refletir nas próximas administrações e gerações.
Mas esse esboço que será apresentado em outubro terá direções a partir do que a lei federal determina, como Reforma da Previdência. Em relação à reforma, vocês estão pretendendo fazer só para os futuros servidores ou englobar também os atuais?
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Primeiro que o regime não é só para o Rio, o anterior acabou só tendo o Rio, mas não é um regime para o Rio. Então, o que tem sido feito? A Lei Complementar 178 põe quatro pontos a serem feitos na previdência. Dois deles nós já fizemos (aumento da alíquota para 14% e previdência complementar). E desses quatro, você não precisa fazer todos, pode fazer três, dando a possibilidade de um ficar fora. Então, nós temos dois, e desses dois um deles nós vamos ter que fazer e a gente cumpre a necessidade da aceitação por parte do Tesouro Nacional.
Quais são?
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Ou é a idade mínima obrigatória (elevação) ou a cobrança da Seguridade Social para quem ganha até o salário de referência da previdência — teto do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), hoje de R$ 6.433,57. Na idade mínima, a gente pode elevar, e dependendo do que você eleva isso tem reflexo no próprio resultado fiscal que a gente vai apresentar. Na taxação de inativos, você pode fazer a partir de 1 salário mínimo, de dois, três... Faremos simulações. E nisso é importante entender: Qual é o objetivo do regime? É você ter equilíbrio fiscal. Para quê? Para pagar a dívida. Na realidade eu costumo brincar dizendo que o Tesouro Nacional virou o FMI, porque a preocupação deles é gerar resultado primário adequado para fazer face ao pagamento da dívida. Ponto. Então, dependendo de como você constrói o plano, você pode diminuir pouco, pode diminuir mais, e aí são simulações que serão feitas ao longo do tempo.
Não bateram o martelo se serão os dois itens ou só um?
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Não. Pode ser uma composição dos dois. Por exemplo, se eu adoto idade mínima hoje, de 52 anos, e coloco 60, qual é o impacto disso? Se eu coloco 55 anos, qual o impacto? A idade mínima pode ser menor se você colocar a contribuição, ou não. Existe um entendimento por parte dos Poderes que é melhor aumentar a idade mínima e não tributar os outros. O reflexo, inclusive sob o ponto de vista de redução de custos, é maior. Então são simulações que estão sendo trabalhadas, mas a decisão do que vai entrar no plano, isso é na discussão que a gente vai fazer com os demais Poderes. O que efetivamente a gente (Estado do Rio) não fez nada ainda diz respeito ao teto de gastos. Essa é uma discussão que a gente vai ver ao longo do tempo.
A mudança da idade mínima será só para os atuais ou para os futuros?
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É... os futuros já têm. Para os atuais é uma discussão que terá que ser feita. Porque, na realidade, do contrário você não reduz o custo do estado. Se você não faz com os atuais, você não tem o princípio do Regime de Recuperação Fiscal, que é a redução do custo. A postergação desse custo não vai ter impacto nenhum pro regime. Então, como fazer isso é uma discussão. Faremos simulações, e aí você pode modular a idade.
Nelson Rocha lembra que, na previdência, dos quatro pontos exigidos, dois já foram feitos - Luciano Belford/Agência O Dia
Nelson Rocha lembra que, na previdência, dos quatro pontos exigidos, dois já foram feitosLuciano Belford/Agência O Dia
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O sr. mencionou a questão do teto de gastos. Esse é o ponto principal em relação à conversa com os outros Poderes?
Na verdade, eu tenho uma visão diferente do que pensa o Ministério da Economia com relação ao teto de gastos, mas aí é conceitual. Eu acho que o teto de gastos não ajudou em nada no resultado fiscal brasileiro. Eu costumo me definir como um desenvolvimentista com responsabilidade. Entender que para desenvolvimento é preciso também ter responsabilidade fiscal. Só que em alguns momentos os fiscalistas chegam ao extremo disso, e a gente entende que só vai conseguir equilibrar as finanças públicas do Estado do Rio de Janeiro se tivermos desenvolvimento. É preciso construir essa solução.
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Na parte da receita, quais ações são estudadas para aumentar a arrecadação?
Tem várias, por exemplo, qual é o potencial de arrecadação do Estado do Rio? Ninguém sabe. O Rio de Janeiro tem uma estrutura econômica com algumas indústrias, sobretudo a indústria do petróleo, e tem possibilidade de trazer arrecadação... Por exemplo, eu posso medir o tamanho de capacidade de arrecadação do estado, porque não existem estudos efetivos por uma série de razões. A última matriz insumo-produto feita no Rio data de 1996. E como você consegue fazer desenvolvimento sem ter isso como norte para ver o desencadeamento de todo setor produtivo? A ideia é que a gente consiga medir o PIB de cada segmento e a partir dali identificar qual é o potencial de arrecadação. Assim, nós teremos ações proativas para buscar aquela meta, com base científica, daquele potencial de arrecadação. Isso eu estou falando de ações de arrecadação. O regime discute isso? Não. Mas eu posso projetar as receitas de acordo com o que a gente imagina.
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O que mais está em discussão?
Mas eu acho que a grande discussão que vamos colocar no plano é a gente tentar pagar parte da dívida com ativos. Se eu consigo pagar a dívida com ativos consigo gerar resultados positivos, e com esses resultados fazer os investimentos necessários, especialmente em infraestrutura de tal forma que a gente traga investimentos para o estado. E aí eu aumento o volume de faturamento das empresas e, consequentemente, aumento a arrecadação do estado. Essa é a lógica.
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O governador declarou que ainda falta conceder reposição salarial ao funcionalismo. Vai sair do papel? E qual será o modelo?
Nada impede, desde que esteja dentro desses limites. Se perguntar minha opinião pessoal: é possível ficar 10 anos sem reajuste? Eu vou te dizer que não, com inflação, com tudo isso. Os servidores já estão há muito tempo sem reajuste.
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Então é possível?
É possível, desde que esteja no plano, desde que tenha as outras regras do plano resguardadas. Volto a insistir: o grande desafio do plano é você ter e estabelecer resultado fiscal positivo. Não existe impedimento. A Lei Complementar 178 não impede que você possa fazer reposição salarial, que você possa ter concurso. Ela te permite tudo isso. É preciso só ter o cuidado para que isso não impacte o resultado. Insisto, o princípio é o resultado fiscal. Se eu tenho aumento de receita, posso também fazer.
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Será possível já no próximo ano?
Isso é a construção do plano... essa discussão vai estar no plano. Obviamente que dentro de uma lógica possível do ponto de vista financeiro. Porque o governador, obviamente que ele tem toda sensibilidade com essa questão, mas ele também tem toda sensibilidade com a administração dos recursos. Então a gente está construindo isso. O objetivo é a gente trabalhar para poder gerar receita suficiente para não só pagar um salário adequado aos servidores, mas ao mesmo tempo produzir as políticas públicas que o cidadão, que o contribuinte do Estado do Rio espera.
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Sabe-se quando será?
É, a gente vai construir dentro do plano as possibilidades. Não sei se vai ser ano que vem, se vai ser no nono ano. Isso a gente não tem nada pronto ainda. O governador tem uma preocupação não só com o governo dele, mas com o futuro do estado. O que é uma mudança de paradigma, até então, pelo menos do que eu vi até agora por onde eu passei. É importante a gente pensar no estado a longo prazo. E nem sempre ao pensar no estado a longo prazo se é possível tomar determinadas medidas que aparentem, pelo menos no primeiro momento, mais interessantes para os servidores, para a sociedade. Às vezes, pensar no futuro é garantir o direito das próximas gerações.