Caso ganhou repercussão a partir de bandeira na fachada do prédio da Faculdade de Direito da UFF - Arquivo Pessoal
Caso ganhou repercussão a partir de bandeira na fachada do prédio da Faculdade de Direito da UFFArquivo Pessoal
Por *LUIZ FRANCO

Rio - Nesta quinta-feira, foram realizadas operações em faculdades públicas por todo o país, com o intuito de retirar propaganda eleitoral de prédios públicos, o que é vedado pela lei. Os mandados foram emitidos por juízes eleitorais e as ordens foram cumpridas por fiscais da Justiça Eleitoral, acompanhados por agentes da Polícia Federal. Ao todo, 17 universidades em 9 estados foram alvos de ações. No entanto, além de materiais de propaganda política que faziam menção direta a candidatos, também houve a apreensão de materiais contra o fascismo e em defesa da democracia, que não citavam nenhum candidato ou partido político. 

Para Michael Mohallem, professor de Direitos Humanos e coordenador do Centro de Justiça e Sociedade (CJUS) da FGV, as decisões "ferem a liberdade de pensamento e a liberdade de expressão, porque não há menção direta a qualquer campanha. São valores presentes na sociedade e muito comuns no ambiente da universidade". Ele também reforça que se tratam de liberdades protegidas pela Constituição Federal de 1988.

Alguns casos assumiram maior proporção nas redes sociais e no debate público, por demonstrarem isso com mais clareza. Em Niterói, a juíza eleitoral Maria Aparecida da Costa Barros, do TRE-RJ, deu prazo até o fim da noite de ontem para que um cartaz com a frase "Direito UFF AntiFascista" fosse retirado da UFF. Em Campina Grande, na Paraíba, o juiz Horácio Ferreira de Melo Júnior ordenou a apreensão de panfletos intitulados "Manifesto em Defesa da Democracia e da Universidade Pública". Outros casos semelhantes aconteceram, como a determinação da suspensão de aulas públicas sobre o fascismo.

"De fato, a ideia de antifascismo tem sido utilizada por eleitores", lembra Michael. No entanto, "a fiscalização eleitoral não pode entrar no campo da subjetividade. Ela precisa se ater a elementos objetivos: nomes, frases de campanha, slogans, cores, símbolos de partido, etc", completa.

"Se isso for verdade, então quantas coisas podem ser consideradas material de campanha (por serem utilizadas por eleitores)? O PT poderia dizer que mensagens contra a corrupção são material de campanha?", indaga Michael.

Silvana Batini, professora de Direito na FGV, atenta para o fato de que as decisões dos juízes vão contra a jurisprudência do próprio TSE. "A lei eleitoral mudou recentemente, para considerar que só há propaganda eleitoral quando há pedido expresso de voto", ela diz, se referindo à lei 9504, artigo 36a, alterada em 2015. Dessa forma, "a própria jurisprudência do TSE liberou os candidatos a viajar (durante a pré-campanha), sem fazer pedidos expressos de voto". "A bandeira (do prédio de Direito da UFF) não continha nenhuma alusão específica a nenhuma candidatura", conclui ela. 

O presidente em exercício da OAB-RJ, Ronaldo Cramer, diz ainda que "a forma de condução dessas decisões nos causou muita preocupação, porque não foram feitas com mandado por escrito. Eles (os agentes fiscalizadores da Justiça Eleitoral) se diziam portadores de mandados verbais, o que é uma prática contrária ao código de processo e fere a Constituição".

Ele também reitera o entendimento dos especialistas: "As decisões da Justiça Eleitoral estavam determinando a retirada de manifestações políticas que não estavam alinhadas a nenhum partido político ou nenhum candidato. A gente não pode confundir manifestação política com propaganda eleitoral. As manifestações políticas são garantidas pela Constituição". 

Em nota, o TRE-RJ não se pronunciou especificamente sobre o caso da bandeira antifascista retirada do prédio de Direito na UFF, mas afirmou ter determinado "aos juízes eleitorais que procedam com a máxima cautela neste momento, acompanhando, com a proximidade necessária, todos os atos praticados, notadamente aqueles relacionados à apreensão de materiais, conciliando a liberdade de manifestação com a isonomia entre os candidatos". A nota diz ainda que: "A fiscalização da propaganda tem atuado em conformidade com as normas vigentes e de forma democrática, com a prudência e a sensibilidade que as circunstâncias políticas demandam".

A OAB-RJ também se manifestou por meio de nota e classificou as decisões da Justiça Eleitoral como tentativa de censura: "A Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Rio de Janeiro, manifesta o seu repúdio diante de recentes decisões da Justiça Eleitoral que tentam censurar a liberdade de expressão de estudantes e professores das faculdades de Direito, que, como todos os cidadãos, têm o direito constitucional de se manifestar politicamente.

A manifestação livre, não alinhada a candidatos e partidos, não pode ser confundida com propaganda eleitoral".

Na tarde desta sexta-feira, a presidente do TSE, Rosa Weber, disse que "eventuais excessos merecem a devida apuração". A ministra disse também que o tribunal está tomando as medidas cabíveis "para esclarecer as circunstâncias e coibir eventuais excessos no exercício de poder de polícia eleitoral no âmbito das universidades de diversos estados da Federação."

Ronaldo Cramer avalia que, com a fala da presidente do TSE, "esse tipo de medida tende a parar e a gente não vai ter o agravamento da situação". Ele reforçou que a instituição segue atenta "contra eventuais arbitrariedades e abusos em um momento político como esse". 

*Estagiário sob supervisão de Thiago Antunes

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