Gildete Amorim ressalta ser fundamental que a tradução fique com profissionais qualificados  - ARQUIVO PESSOAL
Gildete Amorim ressalta ser fundamental que a tradução fique com profissionais qualificados ARQUIVO PESSOAL
Por Fernando Faria

Uma janelinha na TV que abre um enorme leque de possibilidades, descortina um mundo para pessoas ávidas por informação e inclusão e que ajuda muito na hora de decidir o destino político do seu município. Quem tem a missão de apresentar esse universo, deixando as propostas claras para a comunidade surda são os intérpretes de Libras, a língua brasileira de sinais, fundamentais para que milhares de cidadãos tenham condições de fazer a melhor opção nas urnas.

Gildete Amorim atua como intérprete e tradutora de Libras há 25 anos. Ela se especializou na Federação Nacional de Educação de Surdos e possui certificação do MEC. Na atual campanha, trabalha para o candidato Luiz Lima (PSL) e em outros vários municípios - só candidatos a prefeitos são dez. Gildete destaca que a janela que se abre no horário eleitoral na TV é um importante instrumento de inclusão: "Propicia acessibilidade e dá condições para que conheçamos propostas dos candidatos, os prós e os contras. O partido que coloca a janela de Libras está respeitando a língua nativa do surdo como um direito linguístico do cidadão". 

Leila Ramos, certificada no curso de Tradutor e Intérprete de Língua de Sinais, está no 6° período de Serviço Social e aparece na telinha nos programas de Benedita da Silva (PT). Ela lembra que a certificação é de extrema importância, pois não se trata apenas de conhecer sinais: "A informação é um direito de todos. Libras é uma língua como qualquer outra, tem suas particularidades, deve ser estudada e traduzida com responsabilidade, clareza e coerência". Gildete menciona também a importância do convívio com a comunidade surda para se adquirir boa fluência e ter segurança na tradução. 

Segundo ela, a repercussão do trabalho entre os surdos é muito boa: "Eles acabam tendo a inclinação de votar naqueles que têm maior preocupação em fazer com que a comunidade tenha acesso e conhecimento de suas propostas. Quando o trabalho do intérprete é bem feito, o resultado é muito satisfatório para os surdos". Para Leila, o candidato precisa mostrar respeito por todos os que vão às urnas: "Os surdos são eleitores, entender as propostas do candidato sem dúvida é fundamental. Por muito tempo, os surdos só tinham acesso às legendas, hoje têm acesso à informação, podem exercer o seu direito ao voto plenamente". 

Leila Ramos diz que a língua de sinais precisa ser traduzida com responsabilidade - fotos ARQUIVO PESSOAL
Leila Ramos diz que a língua de sinais precisa ser traduzida com responsabilidadefotos ARQUIVO PESSOAL

Uma das preocupações dos intérpretes, além de toda a preparação profissional, é fazer a tradução de forma discreta. Gildete diz que não se pode influenciar na fala do candidato, mas é necessário mais: "É preciso saber usar as expressões faciais, as mãos, ter facilidade e fluência na interpretação". Leila concorda: "A escolha dos sinais que se encaixam no contexto proposto, a expressão corporal, são essenciais, fazem toda a diferença para a comunidade surda. O feedback tem sido positivo e muito gratificante". 

Gildete também elogia a iniciativa de vários partidos que estão se preocupando com a qualidade visual da interpretação, mas lamenta que outros não tenham a mesma atitude. "Apenas colocam o intérprete por medo de pagar algum tipo de multa. Não estão preocupados com a qualificação, empenho ou fidelidade do que está traduzido. Dá vergonha ver os tamanho das janelas, a qualidade da iluminação. Muitos surdos reclamam que têm dificuldade para enxergar as mãos do intérprete", alerta. "Isso não deveria ser tratado como algum tipo de esmola, uma vez que acessibilidade é direito linguístico de todos", conclui.

Tradução é fundamental em todos os passos do processo eleitoral
Boaretto, tradutor e professor de Libras:
Boaretto, tradutor e professor de Libras: "Eu me sinto valorizado"ARQUIVO PESSOAL
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Professor de Libras, pós-graduado em Tradução e Interpretação pela UFRJ e tradutor de Língua Internacional de Sinais, Ricardo Boaretto, de 37 anos, é um dos surdos que estão muito atentos ao horário eleitoral. Segundo ele, o intérprete de Libras é fundamental também nos debates e nas entrevistas dos candidatos para que o surdo tenha condições de saber o que cada um está propondo: "Eu me sinto valorizado como cidadão e também por respeitarem a minha língua". 
Ricardo acrescenta que a presença do intérprete mostra a preocupação dos candidatos com a inclusão: "Quando existe o intérprete, nós sabemos que existimos também para aquele candidato. Por isso, é importante contar com o intérprete em todos os passos do processo eleitoral". Ele, no entanto, adverte que não basta somente ter um tradutor: "É preciso que tenham qualidade e que a janela para a tradução seja apresentada em bom tamanho para que todos possamos ter o direito de ver uma sinalização adequada".
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