Rio - Ele não se lembra quando o pavor começou, mas até hoje Arílson, ex-ponta-esquerda do Flamengo, é tão impressionado com a morte que tenta driblar o sono com medo de não acordar. Em junho de 2013, o temor virou obsessão com a descoberta de um câncer na garganta, consequência da vida de fumante, que quase o matou. Mas a dor mais lancinante, o golpe que quase o derrubou foi desferido três meses antes. Após dedicar 27 anos da sua vida ao Flamengo, foi demitido do clube sem qualquer explicação.
“Hoje não tenho mais história com o Flamengo. Sou rubro-negro, mas já não é mais como antes. Não me deram valor. Joguei nove anos, trabalhei 18 e me mandaram embora sem falar comigo. Nem um telefonema me deram e até hoje não pagaram o restante do meu FGTS. Merecia mais respeito”, disse, em tom de desabafo, sem esconder a mágoa com os dirigentes atuais, que o demitiram junto com os amigos Liminha, que morreu oito meses depois, e Dionísio, falecido na última quarta-feira.
Se os cartolas de hoje esqueceram a sua história, os torcedores mais velhos se lembram muito bem o que Arílson fez com a camisa rubro-negra. Ponta-esquerda endiabrado, fazia cruzamentos perfeitos e ainda marcava gols decisivos. Foi assim desde que despontou nos campinhos de terra batida do Bairro Itacolomi, na Ilha do Governador, e foi levado para a Portuguesa. ‘Roubado’ pelo Flamengo, que dobrou seu salário, Arílson chegou à Gávea, em 1965, para fazer história. Foram 222 jogos, 37 gols marcados e dois títulos expressivos: os Cariocas de 1972 e de 1974. O ex-ponta ainda jogou no Corinthians, em 1975, Americano e Volta Redonda, onde encerrou a carreira, em 1977, após duas operações mal-sucedidas no joelho esquerdo. “Não dava mais, forcei até um pouco a barra. Jogava e meu joelho ficava enorme”, relembra.
Após se aposentar do futebol, Arílson abriu um bar no Grajaú, onde bateu ponto por 15 anos. “Era o Arílson Bar, foi a pior coisa que fiz. Era uma vida de cão, não tinha tempo para nada. Deixei o negócio na mão de empregados e desandou, perdi dois apartamentos”, lamenta o ex-jogador, de 65 anos, que agora mora de aluguel em uma casa de vila, no Campinho.
Convidado pelo Flamengo, voltou para trabalhar na base e garimpar talentos. Foram 15 anos, os últimos na função de olheiro, quando descobriu talentos. “O Adriano ia ser mandado embora do juvenil, pois era um lateral-esquerdo muito lento. Mas quando o coloquei de atacante deslanchou”, diz, orgulhoso, o ex-jogador, que também revelou Fellype Gabriel, Andrezinho e Felipe