Rio - O sonho de seguir carreira no vôlei de praia a impulsionava desde cedo. Aos 17 anos, com a família toda reunida para jantar, Juliana comunicou que estava deixando sua casa em Natal para fazer um teste nas areias de Fortaleza. Talentosa e persistente, ela viveu 14 anos na capital cearense, mas não esteve sozinha. Ao seu lado em todos os momentos estava Ana Lucia Lira, um verdadeiro anjo da guarda, que se revezou nos papéis de patrocinadora, parceira, cúmplice e torcedora. Hoje, ela cuida da vida de Juliana no Rio, para onde se mudaram em 2014, e é chamada carinhosamente de babá pela jogadora.
Em Fortaleza, Ana trabalhava na casa de uma amiga de colégio de Juliana, que tinha bolsa de estudos e também jogava vôlei de quadra. Começava ali uma amizade lembrada até hoje com gratidão pela jogadora. “Quando me mudei para uma pousada, a Ana ia lá, arrumava o quarto, lavava as minhas roupas e ficava comigo nos fins de semana. Quando vi, ela estava morando comigo. Não tinha muito dinheiro. A Ana trabalhava e pagava coisas que queria. O dia mais rico era quando tinha Ovomaltine, a gente ficava jogando baralho. Ela foi a minha primeira patrocinadora”, conta Juliana.

Descontraídas, elas se divertem ao lembrar as histórias que viveram juntas. “A Juliana jogou num quarteto, ganhou um dinheiro e guardou numa caixinha de sorvete na prateleira. Eu não sabia, mas encontrei quando limpei o quarto. Falei para ela guardar num lugar mais seguro, mas disse: ‘Agora nós vamos rachar as despesas’ (risos)”, lembra Ana.
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Em Fortaleza, Juliana formou dupla com Larissa, com quem ganhou os principais títulos e conquistou o bronze olímpico em Londres (2012). O trio se mudou para um apartamento e Ana trocou de emprego. “Trabalhava e, com o meu dinheiro, arcava com algumas despesas. O ex-técnico dela ajudava muito a gente. Eu lavava a roupa, arrumava o apartamento, acordava às 4h da manhã, fazia o almoço delas e às 8h pegava no emprego”, conta Ana.
Com a carreira em ascensão, Larissa e Juliana não precisaram mais dividir apartamento em 2005. “Cada uma comprou sua casa e eu fiquei com a Juliana. Sempre me perguntavam como seria quando cada uma fosse morar sozinha. Mas não precisava responder. Quando eu gosto, sou fiel à pessoa”, diz Ana, que considera Juliana uma filha: “Digo que a mãe dela a conhece até os 17 anos. Dos 17 até agora quem a conhece sou eu”.
A DOR DAS LESÕES
Ana estava ao lado de Juliana quando ela rompeu os ligamentos do joelho esquerdo em 2002. E lembra a angústia de quando soube que a jogadora havia sofrido a mesma lesão em 2008, no joelho direito, às vésperas da Olimpíada de Pequim. “Quando ela se machucou numa etapa em Paris, um amigo ligou e falou: ‘Ana, você soube da Juliana?’. Ali me faltou o chão. Ele disse que ela estava voltando para o Brasil, que tinha machucado o joelho e estava fora da Olimpíada. Fiquei muito preocupada”, recorda.
Chamada de babá, Ana se diverte com a função: “Eu era amiga, fui anjo da guarda e agora sou babá (risos). Mas é gostoso de qualquer maneira. Eu a tenho como minha filha também”.

CUMPLICIDADE
O certo é que uma reconhece a importância da outra em sua trajetória. “A minha amizade com a Ana não é em relação a dinheiro, mas à fidelidade. Minha família tem um carinho por ela. Ela sabe tudo da minha vida. A Ana trabalha na minha casa, me ajuda e, quando ela fala alguma coisa, eu pego para mim. Também sou referência na vida dela. Dou segurança para ela não em relação a dinheiro, mas porque comigo ela se sente protegida”, revela Juliana.
Ana, que faz parte do fã-clube da jogadora, não pensou duas vezes quando Juliana se mudou para o Rio no ano passado para treinar com Maria Elisa, de olho nos Jogos de 2016. Com tanta cumplicidade, as duas sabem que a amizade será para sempre. “Quando eu tiver um filho, a Ana vai babar tanto que o menino vai ficar muito mimado”, imagina Juliana, aos risos.