Café e afins em ambiente aconchegante é a proposta da loja dos irmãos Ramon e Cristiano, que investiram tudo o que tinham depois de ficarem desempregados
Café e afins em ambiente aconchegante é a proposta da loja dos irmãos Ramon e Cristiano, que investiram tudo o que tinham depois de ficarem desempregados Divulgação
Por Jupy Junior
ITAGUAÍ – Luciana, Pedro, Ramon e Cristiano não são especialistas formados em universidades no exterior nem proprietários ou herdeiros de uma cadeia de lojas que resolveram investir durante a epidemia. Pelo contrário. Embora com experiências diferentes e em ramos distintos, o que há de comum entre eles que chama a atenção define-se em três palavras: coragem, senso de oportunidade e dedicação. Luciana abriu uma loja de doces. Os irmãos Ramon e Cristiano, uma cafeteria. Pedro decidiu expandir a sua hamburgueria. Eles investiram em um período em que muita gente perdeu o emprego e fechou as portas dos seus estabelecimentos em Itaguaí e no mundo todo. Mas algo dentro deles falou mais alto e eles se lançaram sem olhar para o abismo que parecia estar ali logo adiante. Resultado: lojas indo bem, obrigado.
“CHEIRIN BÃO” DE SUCESSO
Os irmãos Ramon Ribeiro (31 anos) e Cristiano Viana (37) sempre quiseram ser sócios e tiveram a ideia de abrir um negócio pouco antes da pandemia, em março. Mas, com o fechamento do comércio devido aos decretos municipais e estaduais, deram um tempo na ideia, que surgiu durante um café que tomavam na lanchonete da loja Super Lar, em Campo Grande (zona oeste da capital). Na ocasião, trabalhavam como consultores de treinamento de uma rede varejista. Em agosto, receberam a notícia que faz muita gente desabar: foram demitidos. Ao invés de esmorecer e desanimar, retomaram o antigo projeto com força total, uma cafeteria: “Um lugar onde se pudesse sentar, tomar um bom café e conversar. Não tinha isso em Itaguaí. Como adoramos café, a decisão por esse tipo de negócio foi natural, porque nos identificamos com o produto”, contou Cristiano.
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Café e afins em ambiente aconchegante é a proposta da loja dos irmãos Ramon e Cristiano, que investiram tudo o que tinham depois de ficarem desempregados - Divulgação
Café e afins em ambiente aconchegante é a proposta da loja dos irmãos Ramon e Cristiano, que investiram tudo o que tinham depois de ficarem desempregadosDivulgação
Ainda em março, eles haviam notado a franquia “Cheirin Bão” em Campo Grande, uma charmosa cafeteria que oferece um ambiente aconchegante com produtos exclusivos e refinados. Fizeram contato, negociaram e fecharam contrato.
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“Não tínhamos dinheiro guardado. Eu fui demitido depois de 16 anos de empresa e Ramon, 12. Cada um recebeu a sua indenização, vendi um carro Logan 2014 que estava alugado para um Uber, Ramon também ajudou com o fundo de garantia dele e a minha cunhada também. Foi assim que juntamos o montante para investir”, explicou o empresário.
Gastaram tudo reformando a loja, no Calçadão de Itaguaí, e adaptando o espaço para obedecer ao padrão da franquia. Abriram as portas em 25 de novembro sem um real no banco depois da preparação do espaço e da compra das primeiras mercadorias.
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“A gente tinha medo de investir tudo, gastar todas as nossas economias em um negócio sem ter uma ideia de como seria o futuro. O único conhecimento que a gente tinha era de prestar um bom atendimento porque sempre trabalhamos com isso”, disse Cristiano, e complementou: “Ainda estamos aprendendo a ser empreendedores, só que a vontade de mudar o rumo da nossa vida era maior do que o medo da inexperiência”.
Sem conhecimento no ramo, os irmãos estudaram na internet e fizeram um treinamento de barista (profissional do café) recomendado pela franquia, que fornece cardápio, receitas e insumos. A média do contrato com a Cheirin Bão é de R$ 130 mil.
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Se valeu a pena? Ele respondeu: “Todos os dias superam o dia anterior e já temos que contratar mais uma funcionária, como sempre, de Itaguaí, para valorizar a empregabilidade local”, relatou o dono da cafeteria, que tem 10 mesas, 31 cadeiras e todos os cuidados sanitários em tempos de Covid.
Café coado no balcão, comidinhas, ambiente acolhedor e bom atendimento são os ingredientes que enchem de esperança os dois irmãos que apostaram alto – e tudo – para não sucumbir a uma crise sem precedentes.

O DOCE SABOR DA REALIZAÇÃO
Há cerca de um mês Luciana Maia, de 47 anos, moradora do Centro, vive com imensa alegria o sonho de ter uma loja de doces para chamar de sua. Tem sorvete, minichurros, açaí, petit gateau, banana frita com sorvete, chocolate quente com frutas etc. É para adiar ou esquecer a dieta e se deliciar. Fica bem ao lado da churrascaria Nova Bréscia, na rua Coronel Macedo Soares, 17, loja 2. A pandemia mudou radicalmente a vida dela, que já tinha um foodtruck em Mangaratiba com doces e açaí, mas, por causa da queda no movimento, Luciana resolveu se mexer: decidiu fazer um curso online de como fazer bolos profissionais em casa. Foi assim que passou a acordar às 6h da manhã para assar os bolos e vendê-los pelas vizinhanças. Fez clientes.
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Luciana Maia dentro da sua loja de doces, a Ohana: um sonho realizado graças à ajuda da família e de um cartão de crédito que comprou até os freezers para os sorvetes - Divulgação
Luciana Maia dentro da sua loja de doces, a Ohana: um sonho realizado graças à ajuda da família e de um cartão de crédito que comprou até os freezers para os sorvetesDivulgação
Um dia, André, o marido, que trabalha com o irmão em uma mercearia, recebeu uma proposta tentadora de um conhecido: que tal alugar uma lojinha? Era o tal sonho se apresentando para Luciana, cujo destino estava mesmo ligado ao açúcar. Só que para virar realidade, foi necessária uma boa dose de coragem. Aluguéis eram muito caros, quantias inalcançáveis. Mas Luciana abriu a Ohana (que significa “família” na cultura havaiana) tendo que pagar R$ 3 mil mensais. Ela disse que, no Centro, onde fica a loja, a média dos aluguéis é de R$ 7 mil.
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“Abrimos com a cara e a coragem, compramos as coisas com cartão de crédito. Todos da família ajudaram. Não está ideal, mas estou muito gratificada. Não temos dinheiro ainda para colocar o ar-condicionado, mas, aos poucos, estamos arrumando do nosso jeitinho. Queremos algo aconchegante agradável para os nossos clientes”, conta a empresária.
A família fez de tudo um pouco para conseguir abrir as portas da loja: venderam um pequeno trator, compraram freezers para os sorvetes a perder de vista. Mas já garantiram o aluguel do mês e ainda conseguiram comprar uma máquina de café. Gastaram mais de R$ 30 mil na reforma do espaço, ainda estão devendo muita coisa, mas têm conseguido honrar os compromissos. Luciana confessa: “No fundo, não sei quanto gastamos, tenho até medo de ver”. Mas, em seguida, comemora: “O movimento vem aumentando dia a dia e sabemos que dentro de algum tempo vamos ter de volta o que investimos. Estou muito grata por conseguir realizar esse sonho”.
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Um sonho que é tão colorido quanto os bolos e tortas que ela exibe com orgulho no balcão refrigerado ladeado por paredes cor-de-rosa chiclete.

SUCULÊNCIA E OUSADIA
Parece realmente incrível dizer que, para Pedro Henrique Oliveira (31 anos), a pandemia deu um clique que melhorou o seu negócio. Mas foi exatamente o que aconteceu. Dono da hamburgueria Magnífico, nascido e criado no bairro do Engenho, ele viu seu negócio prosperar em 2019 graças ao seu conceito de misturar (ou harmonizar, na gastronomia), o tradicionalíssimo hambúrguer artesanal com receitas originais de molhos como a inesquecível maionese e a refinada geleia de pimenta. No caso, o nome vem bem a calhar, porque a experiência é realmente magnífica. Tanto é assim que gente vem de longe para provar.
Aí chegou a pandemia e Pedro se viu obrigado, para não sucumbir, a investir em algo que até então ele não tinha dado atenção: as entregas em domicílio. “Como a loja estava sempre muito cheia, não investi nisso, não tive tempo e não parecia necessário. Com a pandemia, não tinha outro jeito de continuar vendendo, porque as pessoas ficaram com medo de sair de casa, com toda razão”, explica ele, que incrementou ainda mais a personalização das embalagens, contratou motoboys e caprichou no sistema para agilizar as entregas, além de simplificar o cardápio para o próprio cliente escolher seu lanche com rapidez.
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Deu certo. Com a loja fechada, ele continuou vendendo e até conquistou mais clientes, que não conheciam a suculência do seu hambúrguer porque nunca tinham ido na loja.
A hamburgueria Magnífico depois da reforma: aluguel da loja ao lado para criar mais espaço e duas cozinhas ao invés de uma  - Divulgação
A hamburgueria Magnífico depois da reforma: aluguel da loja ao lado para criar mais espaço e duas cozinhas ao invés de uma Divulgação
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O Magnífico Burger abriu suas portas em dezembro de 2018. Ocupava uma das duas lojas na Avenida Itaguaí, número 4. A loja B foi o começo. Em seguida, Pedro alugou um espaço atrás que fez de estoque. Mas logo tudo ficou pequeno. A loja C esteve alugada para outra pessoa por muito tempo, mas com um pouco de sorte Pedro conseguiu alugá-la em plena pandemia. Fez obras. O que era hamburgueria inteira na loja B virou uma cozinha. E, veja só, a hamburgueria agora tem uma cozinha para clientes na loja e outra para atender os pedidos delivery. Nada mal para quem teve que fechar a loja em março por causa do decreto da prefeitura.
Reinaugurada no dia 18 de novembro, a hamburgueria é espaçosa, confortável, estilosa, e fruto de um investimento de R$ 120 mil, obtidos em parte com os rendimentos das entregas durante a pandemia e em parte com investimentos do pai de Pedro.
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Ainda não acabou: quem quiser comer burger do Magnífico no Recreio, é só pedir, porque lá tem uma filial, mas só para entregas, por enquanto.
“O que me deixa emocionado é gente de Seropédica que faz o pedido e vai até o limite da nossa entrega, que é o DPO da Reta de Piranema, buscar o lanche. Gente de Itacuruçá faz o mesmo, pega com o nosso motoboy em Coroa Grande”, relata o empresário.
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Mas não se trata só de qualidade, como ele explica: “Fizemos muitas manobras para poder atender as pessoas, muita coisa foi estratégica. Por exemplo: não cobramos taxa de entrega das 18h às 20h durante a pandemia. Foi um estímulo para as pessoas consumirem, muita gente ficou sem dinheiro”.
Uma curiosidade: o empreendedor não pensava muito em hambúrguer, não tinha hábito de apreciar esse tipo de lanche. Mas ele conta que, em meados de 2018, recém-saído de mais uma experiência profissional sem muitas consequências, achou que era hora de ter o seu negócio. Pensou em gastronomia porque ele já tinha trabalhado com o famoso chef Claude Troigros.“Começamos bem simples, com uma chapa de ferro na boca do fogão convencional, sem coifa. Aos poucos a loja foi enchendo, tive que contratar mais gente, teve propaganda boca a boca. Com a pandemia, aprendi que o delivery veio para ficar, é uma realidade sem volta. Foi graças a essa mudança que o negócio se manteve e expandiu”, analisa Pedro.
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Parece que, para ele, crise é uma coisa que a gente coloca no meio do pão e devora com uma bela maionese especial por cima (feita na casa, diga-se de passagem).