"Um corpo livre é um corpo feliz" - Imagem Assessoria
"Um corpo livre é um corpo feliz"Imagem Assessoria
Por Luciana Guimarães
Niterói - Basta uma rápida busca no Instagram, plataforma mais usada pelas mulheres que buscam mostrar um novo olhar sobre a padronização da beleza, para percebermos o tamanho e magnificência do movimento de autoaceitação.
As hashtags #beautiful, #corpos reais, #amomeucorpo  - umas das mais utilizadas e que escancaram discursos sobre gordofobia e outras mobilizações sociais relacionadas à estética padrão na sociedade - foram aos poucos constituindo o seu espaço. Diversidade e pluralidade também estão entre as palavras mais buscadas.
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Esse movimento visa atentar para o fato de que a particularidade deu lugar à monótona e cinza uniformização. Nessa linha de pensamento, um corpo real não deve ser exibido e os incontáveis filtros de edição mascaram dor e frustração de quem se vê oprimido pelo conceito de 'corpo perfeito'. Aceitar o próprio reflexo diante do espelho é, para muitas pessoas gordas, um processo difícil e cheio de desafios.
Mas o que é um corpo perfeito? Não deveria ser, necessariamente, um que seja real? Para aquelas que tentam mudar esse paradigma, nada mais é que um em que se viva feliz. Ao dizer que algo é ou foi padronizado esteticamente, fala-se de uma ‘’imposição’’ social e midiática sobre uma estética perfeita, e na maioria das vezes, inalcançável.
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Aos 22 anos, e uma carreira que desponta rapidamente, a modelo niteroiense plus size Angélica Oliveira sabe bem como combater o preconceito que envolve as pessoas gordas. Pelas ruas do Centro, onde mora, ou em seus perfis nas redes sociais, muitas fotos de biquini, lingerie, e a imagem de quem se enxerga livre. Por meios das postagens que são acompanhadas por mais de 350 mil seguidores, um acalento na alma.  Angélica busca libertação e mostrar que essas mulheres não estão sozinhas:
"Eu vejo como um grande revolução e sou muito grata em ter o poder de inspirar mulheres a se amar do jeito que são, claro que priorizando sempre a saúde. Gostaria que todas tivessem a mesma visão do que eu porque eu não consigo achar a aparência física mais importante que o interior. Se você é uma boa pessoa, eu tenho certeza que terá coisas muito mais legais para apresentar as pessoas do que somente o físico. Vamos ser livres! Estamos nesse mundo e não sabemos até quando!", ela diz, categórica.
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Praticante de crossfit, posta vídeos de seus treinos e contraria gordofóbicos sobre o estereótipo de que gordos não podem praticar atividades físicas. Numa linha bem "a vida como ela é", um conteúdo informativo e sem ludibriação. Em um dos últimos vídeos publicados, a diferença de uma foto posada e uma "fabricada" para agradar. Foram milhares de comentários de identificação e apoio. 
No Brasil, país onde o público feminino é mais curvilíneo por natureza, roupas que só vestem basicamente um tipo de corpo - que lembra um pouco o da Barbie - são outro problema. O padrão, além de inatingível, não condiz com as curvas que vemos pelas ruas. É uma maratona encontrar vestuário que combine com seu estilo e tipo de corpo, o que só deixa as mulheres ainda mais desalentadas. Estar fora do padrão e simultaneamente, e contraditoriamente, dentro de opções limitadíssimas, fizeram a modelo perceber que o movimento tinha que ser de dentro pra fora. O estigma irrealista não faz parte da vida de Angélica:
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"Eu uso o que eu quero, e sustento a roupa. Não o contrário. No meu guarda-roupa tem listras horizontais, roupa branca, barriga de fora e tudo mais que eu quiser.", afirma a modelo.
Internacionalmente, a cantora norte-americana Lizzo, eleita artista do ano pela revista Time, quebrou todos os estereótipos estéticos que uma estrela do pop possui com performances e letras aclamadas. Gorda e negra, ela começou construir a sua identidade aos poucos, eliminando os próprios preconceitos e desenvolvendo uma autoestima que é a marca das suas músicas. A cantora, de 30 anos, posou para a edição de primavera da publicação Playboy e colocou seu corpo para jogo ao vestir lingerie e adereços que remetiam aos anos 70 em Hollywood.
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Dados de uma pesquisa encomendada pela Skol Diálogos e realizada pelo Ibope, indicaram que a gordofobia é um fator presente na rotina de 92% dos brasileiros. Mas, mais revelador é constatar que, apesar disso, apenas 10% daqueles que manifestaram algum tipo de preconceito contra obesos assumem o que são. Outros 8% também reconheceram possuir algum tipo de dificuldade em aceitar aspectos que fogem do padrão social.
O estigma social de não se adequar em um biotipo, frequentemente alimenta nessas mulheres o ódio pelo próprio corpo. A errônea crença de que algo precisa ser 'reparado, consertado' atormenta e espezinha a autoestima. A consequência? Insatisfação, muito choro e em algumas vezes, um caminho tortuoso como a utilização de pílulas tarja preta que inibem o apetite e provocam desde variações de humor até paradas cardíacas. Isso gera preconceito, transtornos alimentares e mentais, e a imposição de que só há um padrão estético que pode ser aceito na sociedade.
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Desassociar a palavra gorda de um xingamento é um dos pontos principais desse empoderamento. Reivindicar o respeito e o pleno direito de liberdade de ser uma mulher que é muito mais do que o tamanho que veste.
Outro nome bastante conhecido na pela maneira como aborda o tema é a influencer Letticia Muniz. Para Letticia, o estímulo para mulheres assumirem seus corpos reais — por meio de suas publicações na internet — serve para superarmos, juntas, a ideia de que só há felicidade quando se está/é magra. "A gente precisa normalizar os corpos, as pessoas têm tipos físicos diferentes. Só que a gente passa a vida em busca de ser magra", disse ela, que acumula mais de 700 mil seguidores, em entrevista recente para o site Universa.
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No livro "O mito da beleza", a aclamada escritora norte-americana Naomi Wolf disse, em 1991, que a fixação cultural da magreza feminina não é uma obsessão sobre a beleza das mulheres, mas, sim, uma obsessão com a obediência feminina à sociedade. A dieta, o culto ao corpo e a ditadura da magreza, segundo Wolf, tornaram-se preocupações das mulheres ocidentais desde os anos 1920. Ou seja, são décadas presas numa ideia massacrante e autoritária. Mas a consciência, de lá pra cá e ainda que a passos lentos, está crescendo e tomando forma.
Para a psicóloga Thaís Ventura, é preciso desconstruir, e é importante ouvir, ter empatia e respeitar o lugar de fala: " A gordofobia, e outros tipos de preconceito, não acontecem conscientemente muitas vezes. A sociedade é gordofóbica. Cresce-se impelido a achar o corpo gordo feio e indesejável, para olhar uma gorda na capa de uma revista de moda e achar um absurdo, justamente porque somos criados não vendo uma gorda sendo feliz e aplaudida pela mídia. Mulheres como Angélica quebram uma corrente de aprisionamento."
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