Por cadu.bruno

Rio - Uma semana depois da morte de 10 pessoas no Complexo da Maré — e às vésperas da ocupação definitiva do local por forças de segurança —, pelo menos 5.500 manifestantes participaram ontem de ato ecumênico na Avenida Brasil, em memória das vítimas. Eles também protestaram contra operações policiais nas 16 comunidades e exigiram pedido público de desculpas do governador Sérgio Cabral. Os trechos da pista lateral da via na altura da Passarela 9, sentido Zona Oeste, e na entrada da Favela Nova Holanda ficaram fechados por uma hora.

Moradores, universitários, estrangeiros e representantes de ONGs gritavam palavras de ordem, entre elas “Estado que mata, nunca mais!”, e também fizeram momentos de silêncio. Artistas da Maré interpretaram cenas que lembraram as mortes.

“Toda vez que o Bope entra aqui, mata alguém. Desta vez foi meu filho, que deixou órfãos meus seis netos”, lamentou o serralheiro Sérgio Oliveira, 41 anos, pai do vendedor José Everton de Oliveira, 21, uma das vítimas, morto quando saía para trabalhar. Um sargento do Batalhão de Operações Especiais também morreu na operação.

Pessoas deitaram em uma das pistas da via%2C fazendo menção aos mortos em operação policial na Maré Carlo Wrede / Agência O Dia

O diretor da Anistia Internacional no Brasil, Átila Roque, viu o protesto como oportunidade para que o Rio mude sua história em relação a favelas: “O Estado não pode atuar aqui como se fosse terra de ninguém. É preciso que se crie uma cultura de cidadania e direitos humanos”.

“Queremos o Estado como um todo e não só polícia, que trata as comunidades como arenas de guerra”, declarou o diretor do Observatório de Favelas, Jailson de Souza. Presidente da Associação de Moradores da Nova Holanda, Andrea Matos repudiou a falta de investimentos públicos. “Só queremos Unidades de Polícia Pacificadora com ações sociais. Enquanto faltam educação e saúde, a polícia tem entrado e cometido excessos”, desabafou.

Depois de uma hora de protesto pacífico, que contou também com a participação do ator Paulo Betti, representando artistas, a via foi reaberta às 18h, ao som de funk cantado por MCs locais.
Cento e vinte policiais — 20 da Força Nacional — foram mobilizados. “O sucesso se deu graças ao diálogo entre os organizadores e a polícia”, comentou o comandante do 22º BPM (Maré), Rodrigo Sanglard, que defendeu a ação do Bope no dia 24. “Os policiais reagiram a ataques de bandidos feitos contra eles”, argumentou.

PM TIRA ACAMPADOS DE FRENTE DO PRÉDIO DE CABRAL

Quinze manifestantes que estavam acampados em frente ao prédio do governador Sérgio Cabral, no Leblon, foram retirados ontem de madrugada por policiais. Dez jovens foram encaminhados para a 14ª DP (Leblon) para prestar esclarecimentos.

Jair Seixas Rodrigues, de 37 anos, foi preso por dano ao patrimônio público e liberado depois de pagar fiança de R$ 800. Segundo a Polícia Civil, ele teria resistido à ação dos PMs e danificado uma viatura. A mobilização no local começou no dia 21 de junho e durou dez dias.

Carros da polícia na rua onde mora o governador%2C no Leblon%2C depois da retirada dos manifestantes Alessandro Costa / Agência O Dia

Policiais passaram o dia de ontem próximo ao prédio onde Cabral mora. Em nota, o governador argumentou que os jovens estavam atrapalhando o direito de ir e vir de moradores e o trânsito no bairro. Cabral também alegou que tentou o diálogo com os manifestantes para ouvir suas reivindicações, mas não obteve respostas. Segundo ele, um grupo, que não foi reconhecido pelos acampados, se encontrou com ele no Palácio Guanabara.

“Outros se recusaram a manter o diálogo e mantiveram o propósito de ocupar uma rua da cidade”, diz a nota. A Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos informou que ratificou na segunda-feira a disposição do governo em receber as reivindicações do grupo, mas que, até o início da noite, não havia recebido retorno.

Porta-voz do movimento Ocupa Cabral, Vinícius Fragoso, no entanto, afirmou ter garantido ao secretário Zaqueu Teixeira que o grupo se encontraria com Cabral na manhã de ontem e que o secretário teria prometido que os jovens não seriam retirados. “Apesar disso, fomos tirados à força, e policiais quebraram nossas barracas.” O grupo planeja um ato, amanhã, às 18h, no mesmo local.

Na Bahia e no Pará, invasão a edifícios

Em Belém, manifestantes que ocupam o prédio da Câmara Municipal desde segunda-feira tentaram invadir ontem o auditório para impedir a votação do Plano Plurianual. Agentes da Guarda Municipal usaram gás de pimenta para dispersar o grupo. A sessão acabou suspensa. Em Salvador, uma mulher foi presa após arremessar um copo com cerveja em direção ao governador da Bahia, Jaques Wagner. Manifestantes também ocuparam prédios da prefeitura e da Câmara Municipal de Tucuruí, no Pará. No início da noite, deixaram o prédio.

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