Rio - Fábio Raposo Barbosa, de 22 anos, que entregou o rojão ao homem que disparou e causou graves ferimentos no cinegrafista Santiago Andrade se apresentou na 16ª DP, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste, por volta das 2h30 deste sábado. Ele estava acompanhado de um advogado, prestou depoimento e foi liberado. O depoimento foi enviado à 17ª DP (São Cristóvão), encarregada de apurar o caso.
Segundo o delegado Maurício Luciano de Almeida, da 17ª DP, ele foi indiciado por tentativa de homicídio qualificado por uso de explosivo e também pelo crime de explosão. "As imagens deixam claro que ele estava junto com o principal suspeito de ter acendido o rojão, os dois estavam agindo em conjunto. Ele disse que não conhece esse homem, mas isso não nos convenceu.", disse, acrescentando que o homem foi liberado por ter se apresentado à delegacia espontaneamente e por não ter havido flagrante. Se condenado, Fábio pode pegar até 35 anos de prisão.
"Estamos tratando o caso com rigor e todas as providências que cabem à Polícia Judiciária serão tomadas", disse o delegado. Esse fim de semana a polícia vai avaliar diversas imagens que chegaram da imprensa, do comando Militar do Leste e da CET-Rio para tentar identificar o rapaz de camisa cinza. Segundo o delegado Maurício Luciano de Almeida, Fábio não mostrou arrependimento e negou que pretendia atingir o cinegrafista.
"A versão dele é dele é de que não conhecia o rapaz que atirou o artefato. Ele disse encontrou o rojão na rua e carregou consigo até que o rapaz de cinza viu o objeto e pediu para lançar. Ele então entregou o objeto", disse o delegado. Maurício Luciano disse que o rapaz que se entregou está sendo tratado como co-autor. Ele tem duas passagens pela polícia em 2013 ocorridas durante manifestações, uma por ameaça e outra por dano ao patrimônio público e associação criminosa.
O pedido de prisão do jovem ainda não foi feito até o momento, mas o delegado pode fazer a solicitação à Justiça em breve. O autor do disparo, que ainda não foi identificado, vai responder pelos mesmos crimes.
Morador do Méier, na Zona Norte, o jovem, concedeu entrevista à Globo News, logo que deixou a delegacida. Fábio afirmou que aparece nas foto da manifestação. "Eu era o de camisa, bermuda e tênis, com as tatuagens. Era eu passando o artefato para o indivíduo, mas ele [o artefato] não era meu", disse.
"Logo que cheguei houve um corre, corre. Fui até lá para ver o que tinha acontecido. Estava rolando um confronto entre manifestantes e polciais. Jogaram uma bomba de gás lacrimogênio próximo a mim. Eu coloquei a minha máscara de gás, que uso para minha proteção porque [a bomba de gás] machuca o peito e arde bastante", detalhou Fábio.
O estudante explicou como o rojão foi parar em suas mãos. "Nesse corre, corre, eu vi que um rapaz que estava correndo deixou uma bomba cair. Não sei exatamente o que era. Era um negócio preto assim. Eu peguei e fiquei com ele na mão", contou.
Fábio afirmou ter passado o rojão para um homem que estava vetido de preto, mas disse não saber quem ele é. "Veio um cara e disse 'Passa aí pra mim que eu vou lá e jogo'. E eu joguei pra ele. Eu não lembro quem era esse cara. Eu até tinha o visto antes, mas não lembro. Ele estava com a encapuzado e com uma roupa preta e chamava a atenção porque ele é alto", afirmou.
Ainda na entrevista o estudante disse que não teve intenção de machucar o cinegrafista. "Em momento algum eu vou nas manifestações pra bater nas pessoas e policiais e quebrar coisas. Eu não tive intenção nenhuma de machucar nenhum repórter. Eu quero o bem do repórter que está em coma. Eu não sei o que falar, mas é isso. Melhoras aí", falou.
O estudante explicou porque procurou a polícia. "Eu só vim aqui mesmo porque minha foto foi divulgada em mídias internacionas e eu recebi ligações de pessoas desconhecidas, não sei se são grupos, falando pra eu dizer que fui eu mesmo", disse.
Internado em estado grave
Ferido na cabeça durante o protesto de quinta-feira contra o aumento das passagens de ônibus, no entorno da Central do Brasil, Santiago , de 49 anos, continua internado em estado grave no Hospital Souza Aguiar. O suspeito de disparar o rojão aparece em imagens feitas por outros cinegrafistas e por um fotógrafo.
Ele está de calça jeans e camisa cinza, e aparece de costas e correndo após, segundo este fotógrafo, colocar o artefato no chão, próximo a Santiago. O relato do profissional — que deverá ser convocado como testemunha — corrobora com a investigação da polícia.
Nesta sexta-feira, o delegado da 17ª DP (São Cristóvão), Maurício Luciano, afirmou que o artefato não foi lançado pela PM. De acordo com as investigações, o explosivo é um fogo de artifício do tipo rojão de vara ou treme-terra. A polícia tem apreendido esses artefatos com manifestantes nos últimos protestos. Santiago sofreu afundamento de crânio e perdeu parte da orelha. Operado, ele está em coma no CTI e respira por aparelhos.
Rojão usado no ataque pode matar, dizem especialistas
Especialistas ouvidos pelo DIA disseram que o rojão que atingiu o cinegrafista alcança até 1.680 metros por segundo de velocidade depois da detonação da pólvora que o compõe (60 gramas), o que pode matar na hora uma pessoa. Rodrigo Muller, instrutor da Muller Consultoria e Treinamento, alerta que o explosivo pirotécnico, com amplos feixes de luz, vem sendo amplamente usado em protestos por manifestantes, que o manipulam para que fique sem direção quando acionado.
“Manifestantes retiram a cabeça pontuda e a vareta que serve para lhe dar estabilidade. Assim, o transformam em algo perigoso e potencialmente mortal e sem trajetória definida”, explicou Muller. Segundo ele, o produto é regulado pela Lei Federal 4.238, de abril de 1942.
Os efeitos causados por esse rojão — semelhante ao que matou Kevin Espada, de 14, ano passado, num jogo do Corinthians na Bolívia — produz som alto, grande deslocamento de ar e rastro alaranjado. “Se atingir um muro, chamusca apenas. Num ser humano, pode matar”, reforçou o tenente da PM do Paraná Ilson de Oliveira Júnior, que tem experiência internacional em cursos de especialização militar em explosivos.
Wanderley Mascarenhas, fundador do Grupo de Ações Táticas Especiais de São Paulo, descartou a hipótese de que o artefato tenha sido confeccionado manualmente. “Pela minha experiência, visualmente, uma bomba caseira não era”.