Rio - A liberdade de expressão manchada de sangue fez a sociedade civil reagir, condenando os atos de vandalismo durante as manifestações populares e exigindo rápida e severa punição para os culpados pelo assassinato do cinegrafista Santiago Andrade — a primeira morte por ataque de manifestantes em protesto no país.
A ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, disse ao DIA que a morte de Andrade é uma marca negativa na história do país. “Representa o quanto nós precisamos enfrentar a violência. Um ato que não pode ser aceito no Estado Democrático de Direito”, ressaltou.
Ontem, o representante para a América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos apelou para que as pessoas se manifestem de forma pacífica. “A violência, de maneira alguma, é o meio para reivindicar direitos”, afirmou Amerigo Incalcaterra.
Pedro Fernandes, secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, disse que a morte do cinegrafista da Band atinge a alma da democracia. “Não existe democracia sem liberdade e não existe liberdade sem o trabalho da imprensa. A violência contra Santiago atingiu a todos nós”, diz.
Entidades de classe também manifestaram repúdio à violência nos protestos. “A morte do Santiago veio de um processo de violência crescente no país e que precisa ser rechaçado de modo veemente”, disse Celso Schröder, presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). Fichel Davit Chargel, presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), manifestou apoio à expressão do povo brasileiro nas ruas. Entretanto, condenou a violência que atinge a categoria em escala exponencial.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) afirmou que os ataques sistemáticos contra profissionais da imprensa constitui atentado à liberdade de expressão. “Toda vez que um profissional de imprensa é impedido de exercer sua função, quem perde é a sociedade brasileira, que deixa de ser informada”, concordou Daniel Slaviero, presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert).
O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Coêlho, disse que “a bomba que atingiu o jornalista agrediu toda a sociedade brasileira.” O presidente da Associação de Repórteres Fotográficos e Cinematográficos (Arfoc), Luiz Hermano, lamentou a morte. “Até quando vamos ter que chorar e enterrar mais um companheiro?”
'A política deve ser exercida com diálogo' - Ramiro Alves, publisher do Grupo Ejesa
“Vivemos momentos históricos para o país, o Rio e o Jornalismo. A capa de ontem do DIA teve grande repercussão nas bancas e redes sociais. A opção em transformá-la em luto e indignação pela morte de Santiago Andrade foi mais do que uma homenagem ao companheiro que tombou na guerra urbana. A democracia brasileira já é suficientemente madura para suportar o episódio trágico da Avenida Presidente Vargas. O que deve ficar, além da dor da família exposta na comovente carta de Vanessa Andrade, é um alerta: nas ruas não se disputa apenas a hegemonia ideológica, mas também a definição do país que queremos. O protesto é legítimo, direito inalienável. No entanto, temos que lembrar todos os dias que, na democracia, a política deve ser exercida com diálogo, argumentos firmes e até enfrentamentos, mas nunca com violência gratuita e sem controle. Venha de onde vier.”
'Quando a violência é usada, deixa de ser manifestação ' - Maria do Rosário, Ministra de Direitos Humanos
“A morte de Santiago é uma marca negativa na História do país, que representa o quanto precisamos enfrentar a violência e sua banalização, estupidamente ceifando vidas. É preciso dar um basta. Quando a violência é usada, deixa de ser protesto. O manifestante está abrindo mão da maior conquista que a democracia instituiu: o direito à fala, tentando calar outras vozes. Em vez de um artefato, poderia levar um cartaz ou um megafone. Não pode ficar impune e ser aceito no Estado Democrático de Direito. Tantas vezes criticamos o uso da força pela polícia, precisamos dizer igualmente quando a violência parte do manifestante.”