Por adriano.araujo, adriano.araujo
Rio - Que a vista em cima da Ponte Rio-Niterói é deslumbrante, todo mundo sabe. O que poucos imaginam é que, dentro do vão central e dos dois mais próximos a ele, existe um mundo à parte, habitado por homens e máquinas. Eles trabalham nas alturas, confinados, para garantir a segurança dos 150 mil veículos que passam por lá todos os dias. Os engenheiros dizem até que, se esse imenso caixão metálico de 848 metros tivesse sido melhor projetado, poderia ter servido para implantar o metrô entre as cidades.
Há 18 anos, o metalúrgico Fábio Duarte, 42, passa oito horas por dia no ‘caixão de aço’. A missão dos dez funcionários que trabalham na inspeção da estrutura é caçar e corrigir trincas causadas pela corrosão. Para se adaptar à rotina, Fábio precisou de coragem a fim de encarar o isolamento a 72 metros acima do mar na caverna escura.
A vista do topo do ‘caixão de aço e metal’ que fica no vão central da Ponte é a solução para funcionários escaparem da solidão e do isolamento durante as oito horasFabio Gonçalves / Agência O Dia

“Sem contar que antigamente era cheio de obstáculos aqui dentro. Até para a chegar na parte de cima da chapa era difícil, porque não tínhamos esses carrinhos”, conta, apontando para uma das engenhocas elétrico-hidráulicas criadas pela concessionária CCR, que dão a mobilidade para a inspeção de qualquer ponto. A empresa administra a Ponte desde 1995 e, até maio do ano que vem, haverá outra licitação para novo período de concessão.

É também dentro do vão central onde ficam, desde 2004, os Atenuadores Dinâmicos Sincronizados (ADS) da Ponte. Composto por 32 caixas de aço, de duas toneladas cada, e 192 molas, o sistema funciona como um contrapeso que ameniza as oscilações na pista. “Antes, a ponte tinha de ser interditada quanto ventava muito, porque a pista balançava. Hoje, esse movimento é quase imperceptível”, explica o gestor de Obras e Conservação, Nilton Velihovetchi.

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Engenheiro de Obras e Conservação há 19 anos, Ariel Couto Maciel lembra que a substituição do asfalto do vão central por concreto, no ano 2000, foi um divisor de águas para as manutenções interna e externa. Como o asfalto não aderia bem ao aço, a pista esburacava quando chovia. “De lá para cá, zeramos o banco de dados de defeitos. Nesses 14 anos, não precisamos praticamente fazer solda de grande porte. Eles passam 90% do tempo fazendo inspeção e pequenos reparos”, diz.
Operário manobra uma das máquinas hidráulicas para manutenção da caixa de molas sob a pista%2C que minimiza a degradação do asfaltoFabio Gonçalves / Agência O Dia

É de Maciel também a teoria de que teria sido possível colocar a linha de metrô no interior da Ponte, que tem 14 quilômetros, caso ele não tivesse sido projetado cheio de bloqueios. “Melhoramos alguma coisa, mas não deu para muito. Seria como tentar enfiar rolha de champanhe dentro da garrafa”, brinca.

Rotina dura inclui roupas especiais
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?Não é moleza a rotina das equipes de manutenção do ‘caixão’. Cedo, eles são levados em uma van até uma das portinholas na lateral da Ponte que dão acesso ao vão central. Conforme o dia passa e o calor aumenta, transpirar é inevitável.
Por causa das condições árduas, os funcionários trabalham com macacão, capacete, luvas, máscaras de proteção e protetores auriculares, já que o eco dos motores produz um ruído ensurdecedor.
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E como eles fazem para almoçar, beber água e fazer as necessidades? O eletricista José Carlos Duarte Carvalho, 47, que trabalha na Ponte há 17 anos, revela: “Temos dois banheiros elétricos nos pilares 100 e 101, que ligam uma pista a outra. Uma van vem trazer as quentinhas na hora do almoço. E também temos um lugar com bebedouro e mesa onde a gente faz as refeições.”
Por mais incômodo que seja o barulho, os funcionários admitem que dá até para tirar uma soneca depois do almoço. Já quem quiser bater papo nas redes sociais precisa esperar o fim do expediente: o celular não funciona no ‘caixão — apenas os rádios.
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