Por nicolas.satriano

Rio - Representantes de movimentos sociais e igrejas de diversas religiões vão iniciar esta semana em Volta Redonda, no Sul Fluminense, uma série de mobilizações populares com o objetivo de chamar a atenção da Justiça Federal para "a importância da devolução ao poder público da maior parte de 147 áreas de terras, e prédios, que hoje estão em nome da Companhia Siderúrgica Nacional(CSN)".

Como o DIA publicou no domingo com exclusividade, o Ministério Público Federal do município deu parecer favorável a uma ação popular  que já tramita há dez anos, e que pode obrigar a devolução dos terrenos.

Ação tenta devolver terras da CSN para o município de Volta RedondaEstefan Radovicz / Agência O Dia

“A mobilização é uma forma de mostrar como os moradores da região estão unidos por essa causa, que é justa e pacífica. Uma decisão judicial em favor do MPF  é primordial para garantir o futuro de Volta Redonda”, justifica José Maria da Silva, o Zezinho, secretário do Movimento Pela Ética na Política (MEP).

Nesta terça-feira haverá uma reunião com lideranças comunitárias e religiosos para traçar estratégias e um calendário de atividades. Não está descartada uma caravana ao Congresso Nacional.

Os bens hoje vinculados à CSN foram desapropriados em favor da Usina Presidente Vargas (UPV) para a construção da cidade em 1941, e acabaram incorporados à empresa na privatização, em 1993.  

Se a juíza da 3ª Vara da Justiça Federal, Alessandra Belford de Castro, reconhecer os argumentos dos procuradores da República Júlio José Araújo Júnior e Rodrigo Timóteo da Costa e Silva, terão que ser reintegrados à União cerca de 16 quilômetros quadrados de território, equivalente a um quinto da zona urbana, e que daria para construir mais três usinas.

A área em disputa entre a CSN e os moradores, que há dez anos entraram com ação judicial, embasados em 13 mil assinaturas, através do atual deputado federal Deley de Oliveira (PTB) e da líder comunitária Maria da Graça Vigorito, envolve construções importantes como um hospital (arrendado pelo Grupo Vita), quatro clubes e até uma floresta, a Cicuta. A CSN, que este ano pagará R$ 30 nmilhões de IPTU, metade da arrecadação total da prefeitura, informou que não vai comentar o assunto.

No entender do procurador do MPF-VR Júlio Júnior, que passou um anjo estudando o assunto com Rodrigo Timóteo, historiadores, políticos e moradores antigos, “bens não operacionais, que não têm nada a ver com a principal atividade fim da CSN, que é produzir aço, deveriam ter sido revertidos ao poder público antes mesmo da privatização”. “Houve desvio de finalidade pública previsto nos atos de desapropriação”, garante Júlio.

Já o procurador Rodrigo Timóteo da Costa e Silva explica que o parecer não visa a anulação da privatização, mas demonstrar que estes bens não eram titularizados pela CSN por estarem destinados a uma finalidade pública. “Cuja atribuição é do município, estado e União”, alega.

Ação popular reivindica o óbvio

Na ação popular, os requerentes alegam o óbvio: que apenas um quinto do patrimônio imobiliário entregue há 22 anos ao Grupo Vicunha foi destinado à implantação do parque industrial da usina. O empreendimento é do empresário Benjamin Steinbruch, que venceu o leilão de privatização em batalha jurídica. A CSN foi arrematada por R$ 1,2 bilhão.

Ambientes e imóveis antes freqüentado por moradores em Volta Redonda, e fechados com cercas de cadeados há mais de 15 anos pela CSN, que também não os utiliza para nada, revolta a população.

“Essa situação chega a ser um escárnio diante de uma população tão sofrida, com o desemprego provocado pela própria CSN após a privatização, e o impedimento do sagrado direito de ir e vir em seu próprio território”, critica o metalúrgico Sandro Honório, membro da Comissão Ambiental Sul, formadas por representantes da sociedade local, que preza pelos direitos dos moradores e pelo meio ambiente.

O presidente do Sindicato dos Engenheiros, João Thomaz, lembra que em 2004, quando era vereador, enviou sugestão ao BNDES para que o banco recebesse o valor do empréstimo de R$ 1 bilhão que fez ao Grupo Vicunha em 1993, em terras, que seriam devolvidas ao poder público. “Essa proposta ainda vale”, diz

Entenda o caso

O historiador Raphael Lima lembra que, a partir de 1968, a CSN começou a entregar ao município serviços antes oferecidos pela estatal.

“Aos poucos, a empresa foi se dedicando às atividades específicas e muitos patrimônios deixaram de ter qualquer funcionalidade pública. A partir de 1993, ações sociais passaram a ficar de lado. De 2000 em diante, a CSN começa a cercear o acesso dos moradores a áreas comuns antes frequentadas, como a Fazenda Santa Cecília”, lembra.

Nos anos seguintes, Steinbruch ampliou o fechamento, que perdura, com porteiras, arame farpado e seguranças, em campos de futebol, áreas de lazer, a mata da Cicuta e terrenos do Aero Clube. O prefeito Antônio Francisco Neto disse que prefere aguardar o desfecho judicial para se pronunciar.


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