Por bianca.lobianco
Rio - O fim do expediente é o momento mais tenso do dia para a recepcionista Lilian Villela, de 28 anos. Funcionária em um escritório de advocacia na Avenida Rio Branco, quase esquina com a Rua do Ouvidor, no Centro do Rio, ela faz hora para conseguir companhia na caminhada até o Castelo. Um percurso de pouco mais de 500 metros, onde já foi assaltada três vezes este ano. A rotina de roubos na região não tira a tranquilidade apenas da recepcionista. Por três semanas, O DIA acompanhou a ação de grupos de delinquentes, que circulam pela avenida — transformada em um canteiro de obras — atacando pedestres enquanto inalam thinner.
Com uma microcâmera, a reportagem flagrou três assaltos e ao menos outras seis tentativas no trecho da avenida entre o Largo da Carioca e a recém-revitalizada Praça Mauá. Os ataques acontecem com mais frequência em quatro pontos da avenida, que a prefeitura planeja transformar no “boulevard carioca”. Os números do Instituto de Segurança Pública (ISP) comprovam a ação de jovens delinquentes numa das principais vias do Centro do Rio.
Clique na imagem para ver o infográfico completoArte%3A O Dia

O primeiro trecho onde os assaltantes atacam fica em frente à Praça Mauá. Segunda-feira (14), às 17h, a equipe de reportagem flagrou um homem abordando uma mulher que aguardava o sinal fechar para atravessar a rua. Descalço e só de calça jeans, ele segurava uma garrafa plástica com tíner. Alheio ao sol forte e a presença de guardas municipais, segue ao lado da mulher, que se dirige a um veículo. Dele sai um motorista e pergunta ao homem sem camisa o que ele quer. A mulher se senta no banco traseiro, e o motorista fecha a porta, mas o homem, visivelmente transtornado, cola o rosto no vidro. O carro parte e ele segue passando pela equipe.

A situação é pior no trecho da Avenida Rio Branco, entre as ruas do Ouvidor e Rosário. Há um ponto de ônibus em frente a uma lanchonete. “Foi ali, esperando o ônibus, que fui assaltada a primeira vez”, lembra a recepcionista, que teve um cordão arrancado do pescoço por um adolescente. O vaivém de grupos formados por jovens é rotina. Muitos circulam descalços e inalando thinner.

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A aproximação é rápida e geralmente certeira. Mulheres, idosos e estrangeiros são os alvos preferidos dos bandos. Nem quem passa nos coletivos está livre dos ataques. No dia 11, um adolescente tentou pegar o celular de um rapaz, mas acabou frustrado. Em outra ação, na esquina com a Rua da Assembleia, uma mulher teve o cordão arrancado por um jovem, que escapou correndo pela Rio Branco.
Segurança: PM diz estar atenta e que reforço aumentará sensação de segurança
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Procurada pela reportagem, a Polícia Militar informou por meio de nota que o comando do 5° BPM (Praça da Harmonia) está atento à ação dos bandos na localidade e “vem atuando para a redução dos índices de criminalidade na Avenida Rio Branco.”
De acordo com o Comando-Geral da corporação, o reforço no número de policiais nas ruas poderá aumentar a sensação de segurança. Segundo a nota, desde a semana passada houve aumento no efetivo do Regime Adicional de Serviço. Além disso, segundo a PM, foram adotadas as seguintes medidas para tentar conter a ação dos bandos: intensificação das rondas em patrulhas e por duplas de policiais a pé e a cavalo; reforço nas ações do Grupamento de Policiamento Transportado em Ônibus Urbanos (GPTOU), que atua fazendo revistas no interior de coletivos e patrulhando pontos de ônibus para tentar reprimir os grupos que agem na região. 
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Vítimas não denunciam os crimes
Dados do ISP referentes ao mês de novembro mostram que houve aumento no número de registros de roubos a transeuntes nas duas delegacias que atendem a região. Nelas foram computados 218 casos, 14 a mais do que no mesmo período de 2014.
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O mesmo é verificado nos casos de roubo de celular, que passaram de 40 para 43. Já a apreensão de adolescentes infratores subiu de 18, em novembro de 2014, para 30, em novembro passado.
Os números, contudo, reforçam o que já foi constatado em pesquisa. A maior parte das vítimas de pequenos roubos não vai à delegacia registrar a ocorrência. É o que revelou a Pesquisa Nacional de Vitimização, coordenada pelo pesquisador Cláudio Beato, da UFMG.
Segundo Beato, a subnotificação de crimes no Rio está entre as maiores do país. “As pessoas geralmente recorrem à delegacia para registrar roubo de veículos por causa do seguro, que exige a notificação para pagar a apólice.”
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A constatação feita pela pesquisa encomendada pelo Ministério da Justiça, em 2013, parece não ter mudado. Lilian, a recepcionista citada no início da reportagem, apesar de ter sido vítima de três assaltos, não foi à delegacia nenhuma vez.
O mesmo aconteceu com a mulher que teve o cordão arrancado por um adolescente, dia 10 passado. A ação foi filmada pela reportagem. A vítima, que não quis se identificar, correu em vão para tentar pegar o ladrão e disse que não iria perder tempo na delegacia.
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NÚMEROS
218 é o número de registros de roubos a transeuntes contabilizados em novembro passado na 4ª DP e 5 DPª, delegacias que concentram as investigações de crimes ocorridos na localidade.
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30 é o número de crianças e adolescentes apreendidos pela polícia na região cortada pela Avenida Rio Branco, em especial, no trecho entre o Largo da Carioca e a recém revitalizada Praça Mauá.

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