Paulo Paim
Paulo PaimDivulgação
Por Paulo Paim*
É injusto que a cura da covid-19 fique em poucas mãos. Se o problema é planetário, a solução também precisa ser global, solidária, equilibrada, empática, com apreço pela vida, sem distinção de raças, bandeiras e Estados. A falta de vacinas para atender à demanda mundial esbarra no direito à propriedade industrial. Somente será possível atender à demanda crescente com a licença compulsória, temporária, chamada de quebra de patente. O objetivo é produzir rapidamente a vacina, em grande escala e com custos menores. Países pobres e em desenvolvimento seriam beneficiados.
A Organização Mundial do Comércio (OMC) já adotou esse procedimento em outras oportunidades. A medida conta com o apoio da Organização Mundial de Saúde (OMS), dos Médicos Sem Fronteiras (MSF), igrejas, entre outros. O Brasil teve uma experiência em 2007 com um antiviral no combate ao HIV.
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A iniciativa de suspender as patentes foi apresentada em outubro de 2020 pela Índia e África do Sul. A ideia tem o apoio de cem nações dos 164 países membros da OMC. A interrupção dos direitos da propriedade intelectual, durante a pandemia, permitirá a todos o acesso à produção de genéricos e poderá reduzir o valor de royalties a ser pago para empresas detentoras da tecnologia das vacinas já produzidas.
Personalidades de 30 países lançaram manifesto, apoiando a medida. Entre elas, o vice-presidente do comitê consultivo do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, Jean Zigler, o sociólogo e jornalista espanhol Ignácio Ramoneti e o ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva. É bom lembrar que os parlamentos de vários países estão discutindo essa questão.
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O Acordo Trips (Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights), o mais importante documento para a globalização das leis de propriedade intelectual, permite que a medida seja utilizada pelos países em situações de emergência e extrema urgência. O Brasil está em colapso: mais de 300 mil mortos. São mais de 12 milhões de casos.
Infelizmente, o Brasil tem se posicionado contra. A diretora-geral da OMC, Ngozi Okonjo-Iweala, aponta uma terceira via: ampliar o licenciamento de patentes para outros países sem suspender a propriedade intelectual sobre elas. Em abril, a OMC fará nova reunião. O Brasil não pode continuar errando.
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Os poderes constituídos e a sociedade brasileira precisam se apoderar do assunto, juntar forças pelo bem-comum e lançar luz aos pedidos de socorro da população. A responsabilidade é de todos. Apresentei requerimento para que o assunto seja debatido no Senado. Há vários projetos tramitando que tratam da suspensão temporária de patentes de vacinas, medicamentos e insumos, entre eles o PL 12/2021.
Sérgio Vieira de Melo, um dos mais brilhantes diplomatas brasileiros, dizia que "o ser humano tem o direito de viver com dignidade, igualdade e segurança". Que o mundo e o Brasil tenham altura ética e moral para compreender que a questão se sobrepõe aos interesses econômicos. A questão é humanitária.
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*É senador do PT-RS