Rita Cortez: Lei de Segurança Nacional - ditadura nunca mais
Além da supressão das liberdades fundamentais, o AI-5 deu poder de exceção aos militares para, entre outras arbitrariedades, torturar e matar todos que fossem considerados inimigos do regime
Por Rita Cortez*
A invalidação da Lei de Segurança Nacional (LSN), por incompatibilidade com a Constituição Federal de 1988, entrou (e já deveria ter entrado antes) na pauta das matérias que exigem imediata revisão, por ser uma nefasta herança da ditadura militar. O estado democrático de direito é incompatível com um decreto-lei (DL 898/69) baixado em plena vigência do Ato Institucional nº 5 (AI-5), que produziu, em 1968, um elenco de ações extraordinariamente arbitrárias.
Além da supressão das liberdades fundamentais, o AI-5 deu poder de exceção aos militares para, entre outras arbitrariedades, torturar e matar todos que fossem considerados inimigos do regime. Seguindo os objetivos traçados pelo ato que expressou o momento mais duro do regime, o DL 898 definiu quais seriam os crimes contra a segurança nacional, contra a ordem política e social, estabelecendo o seu processamento e julgamento.
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Revisto em parte no final da ditadura, em 1983, transformada na Lei 7.170, teve o seu conteúdo autoritário mantido, como a norma que pune com prisão quem calunia ou difama os presidentes dos Três Poderes (Artigo 26); quem incita a subversão da ordem política ou social, a animosidade entre as Forças Armadas e entre estas e as classes sociais ou instituições civis, entre outras.
Num momento de radicalização das ideologias, que gera ações populistas e autoritárias, não se trata de uma mera radicalização das ideias, mas sim de agir de forma a proibir o debate, evitar o confronto de ideias e calar os opositores. As imprecisões, além das subjetividades no texto, prometem ser uma arma contundente contra a democracia, até porque uma ordem pública democrática não pode impedir que haja respeito aos espaços nos quais tratamos os conflitos.
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O agravamento de situações que caracterizam o uso da lei como expediente de intimidação de adversários políticos e profissionais da imprensa justifica que se coloque a LSN no centro dos debates sobre sua extinção. Fato é que o número de inquéritos instaurados com base na LSN desde a eleição do atual presidente da República cresceu significativamente.
A invalidação total ou parcial da LSN é objeto de três ações judiciais propostas no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo PSB, PTB e PSDB, para que se identifiquem as normas incompatíveis com a Constituição Federal de 1988 por ofenderem preceitos fundamentais. O Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), além de promover o debate sobre a Lei de Segurança Nacional em evento virtual hoje, 31 de março, está ingressando como amicus curiae nas Ações de Descumprimento de Preceito Fundamental no Supremo, ou seja, vamos participar dessas ações junto com outras entidades da advocacia e instituições jurídicas.
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Com 177 anos de existência e uma história que se confunde com a História do Brasil desde o Império, o IAB também não poderia deixar de se manifestar contra medidas que permitam atos de comemoração da ditadura. Acreditamos que, no estado democrático de direito, é imprescindível assegurar a liberdade de manifestação e expressão como um dos valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.
*É advogada trabalhista e presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)
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