Waldeck Carneiro, deputado estadual do PT-RJImagem Divulgação

Em tramitação na Câmara Federal, a PEC 32 não é, como propaga o governo Bolsonaro, mera proposta de Reforma Administrativa. Trata-se de profundo desmonte do Estado social instituído pela Constituição de 1988, que as elites econômicas e os defensores do neoliberalismo sempre quiseram destruir. Com efeito, a PEC suprime o conceito de função pública exercida por servidor público concursado, abrindo comportas para a privatização do serviço público, com terceirizações e outras formas de vínculo precário, o que deixaria o servidor vulnerável face à autoridade executiva responsável por sua contratação.
Nesse modelo, em vez de combater a corrupção, como se alardeia, abre-se caminho para que ela flua. Afinal, teria sido possível denunciar o Ministério do Ambiente e o Ibama por exportação ilegal de madeira ou o conluio para aquisição de vacina pelo Ministério da Saúde, se os denunciantes não fossem servidores públicos concursados, estáveis, ocupantes de cargos de provimento efetivo?
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Ademais, a prestação de serviços públicos, gratuitos e universais é dever do Estado, especialmente os serviços essenciais, como Educação, Saúde e Segurança Pública, entre outros. São eles que garantem direitos e isso não ocorre, de maneira duradoura, sem políticas públicas, órgãos públicos e o trabalho cotidiano de servidores públicos. Eis uma das essências do Regime Jurídico Único dos servidores públicos, legado da Constituição Cidadã, que a PEC 32 quer extinguir.
O discurso neoliberal, elaborado em “think tanks” e instituições do capital internacional, como o Banco Mundial, repete à exaustão falsas afirmações, na tentativa de convertê-las em verdades. Mas não resistem ao exame dos dados, que falam por si mesmos. Senão, vejamos. Os algozes do Estado brasileiro anunciam economia de R$ 500 bilhões em dez anos com a promulgação da PEC 32. Mas omitem que, apenas em 2021, o orçamento da União prevê despesas de R$ 2,2 trilhões (o quádruplo) com juros e amortização da dívida pública, jamais auditada, verdadeiro regalo para a burguesia financeira, a grande privilegiada.
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Aliás, fala-se de cortar privilégios com a PEC 32, mas a média salarial do servidor público brasileiro é muito baixa. Quanto às remunerações que superam o teto salarial do STF, que, embora minoritárias, devem ser combatidas, não há elementos na PEC 32 para barrá-las. Sobre o dito “inchaço” do serviço público no Brasil, os números desmentem a tese: de 1991 a 2015, a população brasileira cresceu 35% e o aumento de servidores públicos civis do Poder Executivo, no período, foi de 8%. De 2016 a 2020, a população cresceu 3% e o número de servidores públicos caiu 4%.
Além disso, na proporção empregados no serviço público/população, o Brasil está abaixo da média dos países da OCDE e dos EUA e equiparado aos vizinhos da América Latina, ou seja, nenhum exagero ou distorção.
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Bolsonaro afirmou que queria “desconstruir muita coisa no Brasil”. Não era blefe. Urge contê-lo para reafirmar a defesa da vida, da democracia, da soberania, da ciência, dos direitos sociais e do serviço público, salvando o que ainda resta do Estado de Direito consagrado na Constituição de 1988.

Waldeck Carneiro é professor da UFF e deputado estadual (PT-RJ).