Raul VellosoReprodução

O ano se encerra com dados locais favoráveis sobre a reação à pandemia do coronavírus, a menos do que pode vir de ruim com a vertente Ômicron. Pandemia à parte, o mundo vive sob uma onda inflacionária que é nova e reverbera por aqui, dando origem, na falta de medidas suficientemente fortes na área fiscal, a ameaças de subidas de taxas básicas de juros pelos bancos centrais, interrompendo um longo período de águas calmas nesse setor.
Por aqui, o nosso BC resolveu retomar as subidas da Selic em maio último, tendo passado gradualmente de 2,65% a.a. para 9,15% a.a. este mês, esperando-se novos aumentos na sequência, podendo fechar, segundo os mercados financeiros, em 11,5% a.a. médios ano que vem. Juntando tudo isso com o processo eleitoral, o quadro à frente pode ficar confuso e preocupante.

Quanto à situação fiscal brasileira – calcanhar de Aquiles para a maioria dos analistas – o ano se encerra com muita discussão sobre o que fazer para lidar com as novas e expressivas pressões de gastos que surgiram ultimamente (novos precatórios e Auxílio Brasil a R$ 400/mês por pessoa, entre outras), e com a perspectiva de o teto de gastos, peça-chave do arsenal oficial, ir definitivamente por terra. Dado o diagnóstico amplamente aceito por aqui de que o crescimento dos gastos (e, portanto, da dívida pública) está na raiz da nossa inflação, os sinais oriundos do BC são de que só lhe resta subir os juros básicos com tudo de ruim que isso acarreta.

Um subproduto altamente indesejável disso tudo é o viés ante investimento público (especialmente em infraestrutura), e, portanto, ante crescimento econômico, decorrente, como é, do forte crescimento dos chamados gastos obrigatórios (ou gastos correntes com imposição prevista em algum instrumento legal difícil de deixar de cumprir), ainda que o nosso visionário ministro da Economia viva repetindo que virão bilhões e bilhões de reais em inversões privadas novas do exterior para expandir nossa infraestrutura e ajudar o Brasil a voltar a crescer...
Nesse contexto, a imposição de um teto global de gastos, igual à inflação anual decorrida, na União, serviu apenas para acentuar a derrocada dos investimentos. Tanto assim que, segundo estimativas do Congresso Nacional, os investimentos públicos federais, que em 2022 eram da ordem de R$ 200 bilhões, vêm declinando sistematicamente desde então, sendo agora projetados em R$ 44 bilhões para 2022, durante os debates do Orçamento do ano que vem.

Identifico, nada obstante, duas razões para algum otimismo na linha de frente econômica nos anos que se seguem. Primeiro, é na Previdência Pública, onde os gastos mais cresceram nos últimos anos. Ali, falta ainda dar curso, na grande maioria dos estados e municípios, à importante reforma das regras previdenciárias aprovada no final de 2019, e aportar ativos aos fundos previdenciários em volume suficiente para completar o processo de ajuste e incrementar os investimentos locais.
Mas o passo-a-passo para fazer o certo existe e pode ser iniciado. A outra razão é a mudança liderada pelos principais macroeconomistas norte-americanos no sentido de adotar uma visão menos radical sobre ajuste fiscal, tema para a próxima coluna.
Raul Velloso é consultor econômico