Economista Raul VellosoDivulgação/Inae

De repente, pareceres de técnicos da burocracia fazendária federal ganharam as manchetes das colunas de economia, porque, pela lei do RRF – Regime de Recuperação Fiscal, se eles forem contrários à manutenção de um determinado estado (no caso, o Rio) sob o manto protetor desses acordos, então o estado terá de devolver os recursos antes em tese recebidos da União para quitar suas dívidas com ela.
Sem ter autoridades superiores para onde formalmente recorrer, só restaria ao Rio mandar seus burocratas novamente a Brasília, a fim de tentar um acordo com a burocracia federal sobre um novo (e mais duro que o oferecido anteriormente) programa de ajuste, a ser obtido no prazo máximo de cinco dias.

Chamam a atenção, nesse caso, duas coisas: uma, a força (obviamente insustentável) atribuída à burocracia nesse tipo de assunto, e a outra, o bom senso do STF que, passando por cima desse processo equivocado, vem autorizando um grande número de entes (nele incluído o Rio) a suspender o pagamento de suas dívidas com a União enquanto esse tipo de acordo não é obtido, dando, portanto, na prática, muito mais tempo para o assunto poder evoluir favoravelmente. Caso contrário, teríamos o caos financeiro.
Daí o enfrentamento do assunto ter voltado ao lugar onde deveria ter ficado desde o início, ou seja, na mesa de audiências do ministro da Economia, tendo em sua frente a autoridade eleita pelo povo do Rio para acertar a pendência, seu próprio governador. Este saiu da reunião realizada há pouco, dizendo que os dois haviam se dado mais 15 dias para aparar as arestas.
Claro que, além de criticar o ritual burro, deve-se defender o máximo de austeridade no trato das questões financeiras do setor público. O que não dá para aceitar é assistir à discussão ser travada em torno de miudezas periféricas (como os tais “triênios”, ou adicionais por tempo de serviço, no caso em pauta), e não direto ao âmago da questão. Refiro-me ao “x” de tudo, que venho tratando “até cansar” na mídia, que é a constatação de que a única saída de verdade para o estrangulamento financeiro dos entes públicos brasileiros é o equacionamento dos seus gigantescos déficits previdenciários.
Sem seguir a determinação (hoje constitucional) de fazer tal equacionamento e o passo-a-passo disponível, em breve não sobrará qualquer espaço orçamentário para quitar as prestações das dívidas subnacionais, nem para investir o mínimo indispensável e permitir que estados e municípios cumpram suas obrigações relevantes, já que seu acesso a crédito é praticamente nulo.

(O que é lamentável mesmo é que as autoridades federais, no seu papel cômodo de juízes das ações subnacionais nessa área, e de quem pode ter acesso praticamente ilimitado a recursos, continuem descumprindo a Constituição ao não promover o mesmo equacionamento em seu próprio quintal, exemplo que deveria ser dado aos demais).
Raul Velloso é consultor econômico