Maurício Santoro: As Consequências da Guerra na Ucrânia para o Brasil
São tempos duros. Enfrentamos a primeira pandemia em cem anos, e a primeira grande guerra na Europa em 30 anos, com tragédias que por vezes lembram os conflitos mundiais do século XX. Precisamos nos preparar para um ano difícil
Os dois maiores países da Europa estão em guerra e embora o confronto entre Rússia e Ucrânia possa parecer muito distante para nós no Brasil, afetará nosso cotidiano de muitos modos negativos, sobretudo pelo impacto na Economia, que já enfrenta momento ruim por causa da pandemia.
A Rússia é um dos maiores produtores mundiais de petróleo, gás natural e de produtos derivados deles, como fertilizantes. Os Estados Unidos e a União Europeia reagiram à invasão russa da Ucrânia aumentando as sanções econômicas contra o governo de Vladimir Putin, tornando mais difícil que a Rússia exporte suas mercadorias. Em consequência, houve aumento no preço do petróleo, que pela 1ª vez em quase dez anos ultrapassou US$100 por barril. O custo dos fertilizantes também deve subir.
O resultado é que veremos o impacto da guerra nas prateleiras dos supermercados e nos postos de gasolina brasileiros, com elevação dos preços dos alimentos e dos combustíveis – dois itens que já pesam muito no bolso da população e que estão no coração do crescimento da inflação desde o início da pandemia. São desdobramentos que agravarão os problemas nacionais em 2022, um ano marcado pelas expectativas de baixo crescimento econômico, aumento dos juros e dificuldades para conter a elevação dos preços.
As consequências para a Economia global podem ser muito piores dependendo das decisões diplomáticas dos próximos dias, sobretudo com a decisão dos Estados Unidos e da União Europeia de terem excluído a Rússia do sistema bancário internacional SWIFT, o que impedirá empresas e pessoas russas de realizar operações financeiras com outros países. Estimativas iniciais apontam que isso levaria a uma queda de 5% na Economia da Rússia, que já sofre os efeitos adversos das sanções e da pandemia.
O próprio cenário de incerteza com relação à guerra agrava a instabilidade dos mercados globais, com oscilações nas bolsas de valores e na cotação do dólar, à medida que os investidores procuram se adaptar às condições em transformação. Já houve cancelamentos expressivos de contratos internacionais de compra e venda de alimentos como trigo, em função das novas conjunturas.
A situação na Ucrânia é particularmente preocupante. A Economia do país passou por três recessões profundas desde a independência em 1991 e a renda nacional hoje é menor do que há 30 anos, e irá cair mais com a destruição da infraestrutura nos combates. É um contraste marcante com nações vizinhas, como a Polônia, cuja Economia triplicou no mesmo período. A combinação de guerra e pobreza levará a uma crise de refugiados, que a ONU avalia que pode chegar a cinco milhões, em uma população total de cerca 45 milhões. A catástrofe humanitária afetará toda a Europa.
São tempos duros. Enfrentamos a primeira pandemia em cem anos, e a primeira grande guerra na Europa em 30 anos, com tragédias que por vezes lembram os conflitos mundiais do século XX. Precisamos nos preparar para um ano difícil.
Maurício Santoro é doutor em Ciência Política pelo Iuperj, professor de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj)
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