Luís Pimentel, colunista do DIADivulgação

A semana entre o final de abril e começo de maio sempre nos faz lembrar de Beth Carvalho. O período evoca sua memória e carreira: Elizabeth Santos Leal Carvalho teria feito aniversário no último dia 5 de maio (1946) e morreu no dia 30 de abril (em 2019).
A impressão que se tinha ouvindo Beth Carvalho cantar era de que sempre se ouviu aquela voz. Parecia e é familiar, passando por momentos de nossas vidas que vêm desde que o seu timbre afinado e gostoso remou contra a maré tropicalista, em 1968, com “Andanças”, de Danilo Caymmi, Paulinho Tapajós e Edmundo Souto, no Festival da Canção em que tirou o terceiro lugar. Beth nem tinha LP gravado, só o fez no ano seguinte.
Ainda bailava entre a bossa nova e o samba, desde o compacto simples inicial de 1965, com a delicada “Por quem morrer de amor”, de Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli. Mas logo no comecinho da década de 1970 arrepiava corações e cuícas com a gravação de “Rio Grande do Sul na Festa do Preto Forro”, samba enredo da Unidos do São Carlos. Para a alegria de muitos, o samba venceu.
Ao abraçar o samba, Beth acertou em cheio na escolha, para alegria de todos os que curtem o popular ritmo brasileiro e que adoravam ouvi-la cantar. Beth é carioca nascida no caldeirão situado entre a Saúde e a Gamboa – onde o batuque também ganhou vida e garante a sobrevida do Largo da Prainha, com a Casa Porto, o samba da Mauá, entre o doce do ritmo e a Pedra do Sal.
É que sua voz vem de longe mesmo. “Desde que a gente começa a falar, a gente começa a cantar”, ela disse. Canta e cantou todo mundo que conta na MPB. Abriu os olhos do público e da indústria fonográfica para nomes como Nelson Cavaquinho e Cartola, e até o fim dos seus dias se dedicou ao ofício de revelar compositores iniciantes.
Marquinhos de Oswaldo Cruz e Wanderley Monteiro estão aí, entre tantos outros, para confirmar a informação. Almir Guineto, Arlindo Cruz, Sombrinha e Noca da Portela sabem do que estou falando. Criadores já consagrados, como Zeca Pagodinho e Moacyr Luz ainda se referem a ela com a “madrinha”. Luiz Carlos da Vila também lhe destinava o mesmo tratamento. É que Beth esteve sempre ao lado deles, em seus batismos de fogo.
Beth Carvalho foi diva do samba, como foram Dona Ivone Lara, Clementina de Jesus e Clara Nunes. Ela trilhou o caminho acidentado e glorioso das grandes intérpretes. Começou nos programas de auditório – como começaram, cada uma em sua época, Dalva de Oliveira, Aracy de Almeida, Dolores Duran, Elizeth Cardoso –, na fase áurea do rádio brasileiro. Brilhou com a música romântica, agradou com a bossa nova, flertou com a canção de protesto e caiu nos braços do samba, aplaudida por todos.
Merece todos os aplausos e a mais sincera saudade. Hoje e sempre.
Luís Pimentel é jornalista e escritor