Podemos, sem exagero, falar na ascensão de um novo irracionalismo no Brasil. Em todas as trincheiras e em todas as frentes, a razão está na defensiva.
Hoje, no Brasil, a razão está encurralada por um estranho exército composto em sua maioria de pessoas que se consideram de direita.
Seja como for, esse irracionalismo existe, difunde-se e precisa ser analisado. Ele foi em parte moldado por influências externas como os grupos trumpistas dos EUA. Em sua variedade teórica, é preciso reconhecer que ele está sem sintonia com algumas tendências do pensamento europeu de direita.
Enfim, em sua variedade política, sabe-se que a desconfiança contra intelectuais molda a atuação desses grupos no Brasil e no exterior.
Mas as raízes internas são igualmente inegáveis como as tentativas de instrumentalização da religião em um Estado laico, a exemplo do que se passou em Aparecida em 12 de outubro.
Sem nenhuma dúvida, o irracionalismo brasileiro não é “uma ideia fora do lugar”.
Talvez a política educacional do regime autoritário seja uma das explicações para esse irracionalismo brasileiro.
Durante 20 anos, ela extirpou metodicamente dos nossos currículos tudo o que tivesse a ver com ideias gerais e com valores humanísticos.
Foi criada uma “incultura” engendrada politicamente pela direita.
Os egressos desse tipo de sistema educacional deficitário transformam, simplesmente, seu não saber em norma de vida e em modelo de uma nova forma de organização das relações humanas.
Não podemos falar em “clima” irracionalista sem falar em atores que o defendam ou em suportes que o sustentem. Nelas, os estereótipos de uma formação livresca são contrapontos à imagem da educação pela própria vida. Incluem também alguns intelectuais, que não hesitam em desqualificar a razão, de modo quase sempre indireto, sob influência de certos modismos.
O irracionalismo tem por base a violência, no caso político, o ódio, a raiva e a exploração dos aspectos mais sombrios do ser humano.
O irracional tenta galvanizar esses sentimentos em causa própria e com razões políticas para fins eleitorais. Essa luta da civilização contra a barbárie é recorrente e marca a história de vários países como o Brasil.
Para combatermos o irracionalismo autoritário, devemos usar o antiautoritarismo. É uma das atitudes mais fundamentais ao processo democrático, não somente no âmbito da política clássica, em que significa a oposição aos regimes ditatoriais, mas também no âmbito dos chamados movimentos sociais em que representa a oposição à opressão sexista ou racial.
Chesterton dizia que, ao tirarem a mitra do bispo, arrancaram junto sua cabeça, sua razão. O ocupante do planalto, ao atirar contra a nossa razão, feriu também o nosso coração, o nosso núcleo afetivo mais íntimo.
Que os corações voltem a ser livres. É tempo de educar as crianças, de dar de comer a quem tem fome, de reconstruir a racionalidade.
É hora de escolher entre a civilização e a barbárie.
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