Rio - O sol ainda não tinha despontado quando o cabo dos bombeiros, Altamir Cruz, 31, saiu andando de sua residência, na Ilha do Governador, Zona Norte do Rio, às 5h30 de ontem. Três horas depois, fardado e com um boné, andava sobre o asfalto quente da Linha Vermelha. O andarilho pretendia ir a pé até o quartel de Charitas, em Niterói, um caminho de 32 km, para participar de um curso. O motivo: a falta de auxílio transporte.
No dia anterior, o bombeiro que atua como técnico em enfermagem já havia dito ao seu comando que não tinha dinheiro para a passagem de ônibus. Escutou que se não fosse ao treinamento seria punido. Sua esposa e filha de 4 anos dependem da sua renda como militar. Para evitar a prisão acatou a ordem, seguindo a pé. Na entrada da Ponte Rio-Niterói, foi levado por uma viatura dos bombeiros até o quartel.
PMs ‘TROCAM’ BATALHÃO
Ações similares já ocorrem há pelo menos um mês e refletem a crise no Estado do Rio. No mês de março, pelo menos quatro policiais militares se apresentaram em batalhões de seus bairros pois não tinham dinheiro para pagar o deslocamento até os locais onde estão lotados. Em anotações de livros de controle de dois batalhões, aos quais O DIA teve acesso, há descrições das apresentações em 9 de março.
No batalhão de Mesquita,Baixada Fluminense, um policial da UPP Macacos se apresentou na unidade, mesmo escalado para o patrulhamento na comunidade da Zona Norte do Rio. No mesmo dia, outro agente, lotado no Batalhão de Turismo, se apresentou para trabalhar no quartel de Olaria, também na Zona Norte. Os dois alegaram falta de dinheiro para o transporte.
Sem revelar o nome, um policial disse à reportagem que não é somente por falta de dinheiro que isso ocorre. “Se todos os policiais que trabalham na Zona Sul forem para o batalhão onde está a sua residência, usando a justificativa da recusa a pagar transporte sem ter salário, os índices de criminalidade vão aumentar e isso vai chamar a atenção do governo”, disse o agente.
A assessoria dos bombeiros disse que a corporação não entendeu como protesto a atitude do cabo Cruz. A PM não quis comentar os casos citados na reportagem.
Atendimento ao público é afetado no Detran e em unidades de saúde
As sucessivas mudanças nas datas de pagamento de 468.577 servidores fizeram com que 33 categorias entrassem em greve e a população passasse a sofrer com a falta de atendimento.
No Detran, motoristas, que comparecem às vistorias agendadas saem dos postos sem a documentação. Por falta de peritos, que avaliam motores e chassis dos veículos, condutores terão que retornar com os carros, no prazo de 30 dias. Ontem à tarde, no posto Haddock Lobo, na Tijuca, só um servidor trabalhava com terceirizados.
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O porteiro Antônio Firmino, de 59 anos, contou que terá que se ausentar, mais uma vez do trabalho para buscar o documento no Detran. “Melhor que fosse tudo resolvido hoje”.
No Hospital Universitário Pedro Ernesto, em Vila Isabel, os próximos passos da paralisação devem ser decididos na próxima terça-feira.
O presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, determinou à noite que os servidores do Departamento Geral de Ações Sócio-Educativas (Degase) voltem ao trabalho em 24 horas. Em caso de descumprimento, o sindicato da categoria pagará multa diária de R$ 300 mil.
Policiais civis começam paralisação de 48h
O Sindicato dos Policiais Civis anunciou que começa hoje paralisação de 48h. A previsão é que 30% trabalhem nos registros e só crimes graves terão atendimentos priorizados. Ontem, algumas unidades, como a Delegacia de Atendimento ao Turista (Deat), trabalharam com menos atendentes.
A crise também atinge servidores terceirizados do Hemorio.“Essa semana não trabalhamos três dias, em protesto. A captação de sangue reduziu pela metade esta semana”, disse um servidor da unidade, que irá participar de um protesto hoje.