Rio - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa, nesta segunda-feira, de uma megamanifestação contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff, na Lapa, no Centro do Rio. Sob os gritos de "Fora Cunha" e "não vai ter golpe", diversos artistas, intelectuais e ex-ministros lotaram a Fundição Progresso para a leitura do manifesto a favor da democracia, como os cantores Chico Buarque e Beth Carvalho, e o ator Gregório Duvivier.
Depois, eles seguiram até os Arcos da Lapa. No local, o ex-presidente contou que Dilma já tinha o convidado para retornar ao governo, em agosto do ano passado. Na ocasião, ele não quis aceitar, mas agora ele voltaria como ministro-chefe da Casa Civil.
"Agora, ela disse: 'Lula, preciso de você para recuperar este país'. Nós vamos recuperar o Brasil. O país aprendeu a se respeitar. Esse povo aprendeu a gostar de si mesmo, quando a gente cunhou aquela frase famosa 'Eu sou brasileiro e não desisto nunca'. Aprendeu a não ficar subordinado aos norte-americanos. Aprendemos que somos cidadãos igual a qualquer outro do planeta", destacou Lula, ovacionado pelo público, que cantava "Lula, guerreiro, do povo brasileiro".
O ex-presidente afirmou ainda que Dilma "aprendeu uma lição", já que "fez uma proposta de ajuste [econômico] que ninguém gostou, porque foi para atender o mercado". "O mercado foi o banqueiro, mas o povo é o trabalhador, o consumidor, o cara que vai comprar a carne, que vai ao supermercado", lembrou.
Para Lula, a oposição não deixou a presidente governar o país e comparou: "É como se em uma casa a mãe fizesse a comida e os filhos jogassem fora". De acordo com o ex-presidente, os opositores querem apenas "truncar a democracia". "Aprendam com o Lula, saibam esperar. Lula esperou 12 anos para chegar e chegou pra provar que é possível governar esse país com mais competência", ironizou o ex-presidente.
Lula destacou ainda que a elite brasileira "nunca se preocupou que o pobre estudasse, o pobre nasceu para ser faxineiro, pedreiro, e nós mudamos essa lógica". "O pobre da periferia, negros e índios, que jamais poderiam entrar nas universidades, disputar vagas nas melhores faculdades desse país, estão provando que é possível", disse.
O cantor Tico Santa Cruz, que costuma fazer publicações sobre política no seu Facebook, afirmou que muitas pessoas se aproveitam desse momento de crise do país para "tomar medidas que são preocupantes". "Acho que a gente tem que se movimentar para evitar que essas medidas sejam tomadas sem o aval da população. O ato é importante para colocar todo mundo a par disso", explicou.
Outro artista que está presente no ato é o ator Antônio Pitanga. Ele disse que os brasileiros, mesmo que não tenham passado pela ditadura militar, e que tenham "o mínimo de consciência da história", participam do protesto a favor da democracia.
"Eu vivi esse movimento com Getúlio Vargas, com Jango. Hoje não tem cadáver, não tem crime jurídico. É um movimento orquestrado pelos meios de comunicação, pelos institutos de pesquisa, pelos empresários que ganharam muito dinheiro com o governo Lula e agora estão nos enfiando uma faca nas costas", afirmou o ator.
Assim como Pitanga, a atriz Tassia Camargo reforçou que o impeachment não é legal e, portanto, "não vai ter golpe". "É assustador, porque têm pessoas que viram amigos sendo torturados e estão agora a favor do impeachment. Não sabem que se Dilma e Michel Temer saírem, quem entra é Eduardo Cunha. Até ter outra votação, terá intervenção militar. Isso é muito grave", ressaltou.
“Nunca votei em Dilma Rousseff. Votei em Marina Silva, mas estou aqui porque 52 milhões de brasileiros votaram, e eles têm que ser respeitados. Sem ódio, vamos mostrar que os artistas brasileiros não aceitam o golpe”, analisou o ator Wagner Moura.
“Queremos que a Dilma fique, mas também que ela melhore. Que o governo melhore e que ela governe para a esquerda, em nome do projeto para o qual foi eleita”, emendou Gregório Duvivier, fundador do Porta dos Fundos, canal do Youtube. “Impeachment capitaneado pelo (presidente da Câmara) Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é como um pênalti marcado pelo Eurico Miranda a favor do Vasco”, completou.
“Além de combater o golpe, é preciso restabelecer a maturidade política do Brasil. Para isso, a classe artística está unida aqui”, agradeceu o ministro da Cultura, Juca Ferreira. “A democracia tem a natureza da flor, ela é frágil, mas tem a força de sua beleza”, comparou o teólogo Leonardo Boff.
Um dos organizadores do evento, o compositor Chico Buarque só falou no fim da primeira parte do ato, na Fundição Progresso — a outra começou depois das 20h, nos Arcos da Lapa.
“Eu não ia falar, mas cheguei aqui e fiquei todo besta quando vocês começaram a gritar ‘Chico, eu te amo’. Daí eu descobri que vocês amam todo mundo que está aqui”, brincou Chico, dando as mãos à estrela da festa, o ex-presidente Lula. “Vamos recuperar o Brasil”, prometeu.
Além de artistas e intelectuais, representantes do PT e de sindicatos também estiveram presentes no ato. Líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos pediu que a movimentação popular permaneça. Ele destacou que é por meio da pressão da população que pode permitir "um novo caminho para o país".
"Quem está nas ruas e se vencer o golpismo no domingo (quando será a votação do impeachment na Câmara dos Deputados), não vai sair das ruas para encontrar uma saída pela esquerda. Eles acreditavam que quem estava nas ruas era um setor mais elitista, que defendia o impeachment, Cunha e Temer, e que deu um show de agressão e intolerância. Houve reação da sociedade", acrescentou.
Furacão 2000 defende Dilma
A Furacão 2000 vai pela primeira vez à orla de Copacabana. E não se trata de um simples baile funk, mas de um ato contrário ao impeachment da presidente Dilma Rousseff. Dois carros de som serão os responsáveis por mobilizar o povo contra o que a organização chama de “golpe”.
Rômulo Costa, fundador da Furacão 2000 e idealizador da manifestação, explica que a expectativa é colocar mais de 100 mil pessoas na orla. Para isso, conta com a presença maciça dos moradores de comunidades próximas, como Rocinha, Vidigal, Pavão Pavãozinho e Cantagalo.
A fim de convocar os residentes de regiões mais afastadas da Orla, Costa tem uma ideia ambiciosa: negociar a liberação, durante um certo período de tempo, das catracas da Supervia e do Metrô Rio. Não há, porém, nada confirmado nesse sentido, assim como no que diz respeito aos MC’s que estarão no ato.
“Teremos uma reunião amanhã (hoje) à noite para definir e liberar o nome deles”, esclarece.
Fã do ex-presidente Lula, Costa rechaça as críticas ao petista, principalmente a preocupação alheia com os bens do político. “Ele tinha que morar em um prédio de dez andares na Vieira Souto, por tudo o que já fez pelo país”, opinou.
O principal alvo do funkeiro é o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha. “Temos um presidente ilegítimo para comandar o processo. O paraíso fiscal do Cunha, no Rio, é a Assembleia de Deus”, acusa Costa, que, apesar de evangélico e frequentador da Igreja Universal, tece fortes críticas ao modo como as igrejas são conduzidas, com isenção de impostos. “E os evangélicos de Brasília não me representam”, concluiu.
Com reportagem dos estagiários Rafael Nascimento e Caio Sartori