Por gabriela.mattos
Rio - A ex-manicure Adriana Ferreira Almeida, a 'Víuva da Mega-Sena', voltou ao banco dos réus nesta terça-feira. Ela é acusada de mandar matar o marido, René Senna em janeiro de 2007, para ficar com a fortuna que ele havia ganho na Mega-Sena. O Conselho de Sentença de Rio Bonito está reúnido desde 10h55. Além da liberdade de Adriana, está em jogo uma fortuna de R$ 120 milhões, que está retida e é reivindicada pela filha de René, Renata Senna. O dinheiro está rendendo juros e correção monetária, em uma conta de investimentos da Caixa Econômica Federal.
Adriana Ferreira Almeida%2C viúva de René Sena%2C é julgada no Fórum de Rio BonitoSeverino Silva / Agência O Dia

O julgamento está sendo presidido pelo juiz Pedro Amorim Gotlib Pilderwasser, no fórum de Rio Bonito. O conselho é formado por cinco mulheres e dois homens. Duas testemunhas de defesa foram ouvidas com antecedência. Três testemunhas de acusação já foram ouvidas. A principal delas, a filha da vítima, disse que se queixava com o pai da atitude de Adriana.

Adriana tem permanecido calada durante o julgamento, de cabeça baixa e sem esboçar reação durante os depoimentos.

Maior prêmio pago

Senna acertou sozinho as seis dezenas da Mega Sena, em julho de 2005, e faturou R$52 milhões, até então o maior prêmio pago pela loteria. Além do resultado das aplicações, aos milhões em dinheiro que Senna mantinha no banco, somaram-se os valores arrecadados com a venda de parte de seu patrimônio, como cabeças de gado e fazendas, que estavam se deteriorando, ironicamente por falta de dinheiro para a manutenção dos bens.

A feroz disputa pela herança de Senna ocasionou a geração de outros processos, mas na área cível. A família do milionário assassinado, especialmente sua única filha, Renata, moveu ações tanto para anular o testamento que deixava metade de todo o patrimônio para Adriana, feito pelo pai três meses antes do crime; quanto para que Adriana seja declarada indigna, e, consequentemente, perca o direito à herança, bem como a todas as doações feitas pela vítima, ainda em vida. Por outro lado, Adriana questionou na Justiça a paternidade de Renata, que foi obrigada a se submeter a exame de DNA. O resultado foi favorável à Renata.

Tanto Adriana, quanto Renata, tentaram ao longo de todos estes anos botar a mão na grana. Cerca de 20 dias após a morte de René, Adriana transferiu R$ 1,9 milhão da conta conjunta que tinha com o milionário, para outra, particular. Renata fez vários pedidos de liberação da sua parte da herança. Chegou a solicitar R$ 11 milhões, alegando que corria risco de vida e pretendia se ausentar do país. Mas todos os pedidos foram negados pela Justiça, que condiciona a liberação de qualquer centavo da herança ao resultado do processo criminal.

O julgamento começou às 10 horas, mas a previsão é que dure, pelo menos, três dias. Sete jurados, pessoas do povo, moradoras de Rio Bonito, é que vão colocar um ponto final nessa história, que começou com uma jogada de sorte: um lavrador doente, que teve as duas pernas amputadas por conta dos problemas com a diabetes e morava de favor na casa de parentes, da noite para o dia, transformou-se em milionário. Mas teve um desfecho trágico, que chocou o país.
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Pistoleiros foram condenados. Adriana, suposta mandante, foi absolvida
René Senna foi assassinado com tiros na cabeça, quando tomava cerveja com amigos no bar do Penco, uma birosquinha da área rural de Rio Bonito, às 11 horas de 7 de janeiro de 2007. O crime foi praticado por dois pistoleiros que chegaram em uma moto, renderam as pessoas, tomaram a pochete que Senna carregava, onde havia uma arma e dinheiro, e dispararam na cabeça da vítima, que estava sentada em seu quadriciclo. Ambos usavam capacete, o que dificultou a identificação. O nome de Adriana surgiu logo na cena do crime.
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É que dois dias antes, Senna havia anunciado a intenção de excluí-la do testamento, após descobrir que ela mantinha um caso amoroso com Robson de Andrade Oliveira. Inclusive, no réveillon de 2006 para 2007, Adriana e Oliveira passaram a noite juntos, em uma cobertura na Prainha, em Arraial do Cabo, comprada por Adriana (R$300 mil), com o dinheiro de Senna, sem ele saber. Segundo a denúncia, Adriana ofereceu R$ 800 mil aos matadores e mais R$5 milhões, quando colocasse a mão na herança. Os pistoleiros foram identificados como Anderson Silva de Souza e Ednei Gonçalves Pereira, ex-seguranças da fazenda de Senna. Ambos foram condenados pelo crime a 18 anos de prisão, em julho de 2009.
O júri de Adriana e de outros três acusados foi desmembrado. Eles foram julgados em dezembro de 2011 e, após cinco dias de julgamento, o resultado foi surpreendente: Adriana foi considerada inocente e saiu livre do tribunal. Derrotado, o Ministério Público recorreu da decisão e, em 2014, o Tribunal de Justiça determinou novo julgamento. Este será o definitivo. “Não cabe novo júri. Recurso só para rever cálculo da pena, no caso de condenação”, explica o criminalista Breno Melaragno.
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A herança de René Senna
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Mega-sena
Em 2005, René Senna ganhou prêmio de R$ 52 milhões. Ele acertou sozinho as dezenas 03 - 21 - 25 - 37 - 54 - 58.
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Fazendas
Com o dinheiro do prêmio, René Senna adquiriu três propriedades rurais, à época, por R$ 9 milhões. Em 2014, uma avaliação da Justiça reajustou o valor dos imóveis para R$ 13,5 milhões. A Fazenda Nossa Senhora da Conceição, com casa sede em estilo colonial de dois andares e cinco residências para empregados, além de estábulo, hoje vale R$ 5,5 milhões. Fazenda da Posse, imóvel de 110 mil hectares (5,3 milhões de metros quadrados) avaliado em R$ 7,7 milhões. Sítio BR 101, com 2,2 alqueires (131 mil metros quadrados) foi avaliado em R$ 190 mil.
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Casa no Recreio dos Bandeirantes
Uma das primeira aquisições de René Senna custou cerca de R$ 500 mil. Logo que ganhou o prêmio, René foi morar na residência.
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Cobertura em Arraial do Cabo
Comprada por Adriana por R$ 300 mil, dias antes do crime, sem o consentimento de René Senna. Adriana vive lá até hoje.
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‘Indignidade’ ameaça Adriana
Caso seja condenada pelo Tribunal do Júri de Rio Bonito, Adriana Almeida perde a liberdade e o direito à herança de René Senna. No caso de absolvição, entretanto, a ‘Viúva da Mega-Sena’ ainda vai ter que continuar brigando na Justiça para herdar o dinheiro. Isso porque corre contra ela uma Ação de Indignidade, na área Cível. Segundo o advogado Luiz Octávio Rocha Miranda, se ocorrer a absolvição a ação de Indignidade perde força.
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“O conjunto probatório do cível é independente do criminal, mas pode pegar prova emprestada”. Isso porque a decisão dos jurados não é técnica, mas baseada no convencimento de cada um. No caso da ação cível, um juiz é que vai decidir e terá que fundamentar sua decisão com argumentos técnicos. “Em caso de absolvição tem que ver o motivo, se cabe recurso e uma série de coisas que pode auxiliar na prova da cível”, explica Rocha Miranda.