Rio - A construção de um segundo bunker para abrigar policiais da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) Nova Brasília, no Complexo do Alemão, já dura um mês. No período, em represália à construção da base no Largo do Samba, ataques de traficantes são diários. Como resultado, cerca de 30 casas agora estão com as fachadas perfuradas de tiros de fuzis e moradores vivem praticamente em uma zona de guerra. “De manhã, assim que obra é retomada, os tiros também. O principal ponto de confronto do Alemão agora é o Largo do Samba”, afirmou um inspetor da 45ªDP (Alemão).
A construção da base no local, que será blindada e deverá abrigar cinco agentes, foi uma escolha do comandante da UPP, major Leonardo Zuma. Uma das justificativas é que o Largo é um ponto que permite o deslocamento de criminosos de forma desimpedida entre três comunidades: Fazendinha, Nova Brasília e Alemão.
Só neste mês foram 16 tiroteios no local, de acordo com a delegacia. Há os que não foram contabilizados, em que não há feridos ou que os policiais não revidam. A tensão é tanta que o Grupo de Intervenção Tática, equipe treinada para atuar em situações de risco em UPPs, se recusa a ir ao local após as 22h, segundo um policial. Desde o início do ano, ele pediu licença para tratamento psicológico. “Jogam a gente para morrer. Eu não aguentei mais. Tenho filhos. Fui chamado de covarde por querer sair”, disse.
A ideia dos bunkers surgiu em 2015, quando a Secretaria de Segurança anunciou uma “reorganização do projeto de pacificação” após uma série de ataques aos policiais das áreas pacificadas. Em um deles, o então comandante da UPP Nova Brasília, Uanderson Silva, foi morto.
Por conta da crise, o único bunker construído até então foi na Praça do Cruzeiro, na Nova Brasília. Nele, há buracos para apoiar fuzis e barricadas feitas com tonéis pelos agentes na entrada.
As construções fortificadas contrastam com a arquitetura das bases idealizadas no início do processo de pacificação. Em 2012, quando a sede da UPP Alemão foi inaugurada, grandes painéis de vidro foram instalados na fachada. A intenção era mostrar proximidade da polícia com os moradores.
Agora, a sensação é de medo. A polícia investiga a morte de Luiz Fernando de Jesus, de 28 anos, baleado na sexta-feira, no Largo do Samba. Ele trabalhava como auxiliar de serviços gerais.
Dez casas invadidas, diz defensoria
De acordo com a Defensoria Pública do Rio, denúncias apontam que para construir a base no Largo do Samba, pelo menos dez casas foram ocupadas por policiais.
As denúncias estão sendo acompanhadas pelo ouvidor-geral da Defensoria, Pedro Strozenberg, que esteve no local. “A instalação de bases na casa das pessoas é uma violação grave. Também impressiona as muitas marcas de tiros de alto calibre por toda a comunidade”, disse. Em uma residência fuzilada há a inscrição “Que Deus proteja esta casa”.
“Todos os dias têm policiais na minha laje, pulando o quintal de madrugada. Já fiz denúncia. Tenho medo que depois alguém se venha fazer maldade, achando que dei ajuda para eles”, contou uma moradora.
De acordo com a assessoria do Comando de Polícia Pacificadora (CPP), “uma casa — já em processo de desapropriação — ocupada pelos policiais servia como ponto de observação de criminosos. Outra residência está vazia e sendo utilizada pelos PMs até a conclusão da construção da base. O CPP está acompanhando o caso e já se reuniu com as autoridades competentes para tratar o assunto.